O globo, n. 31051, 12/08/2018. País, p. 10

 

O RIO NA ERA PÓS-UPP

Carolina Heringer

12/08/2018

 

 

Candidatos ao governo rechaçam programa como principal política

O que vai fazer com o programa das UPPs? Manter, reduzir, acabar ou expandir?

Eduardo Paes (DEM)

> As UPPs têm um papel importante, mas não podem ser consideradas uma política de segurança pública, e sim apenas uma das faces dela.

> Até porque as unidades são restritas a algumas áreas e não abrangem sequer toda a cidade do Rio. Em alguns lugares elas tiveram melhores resultados do que em outros. O custo de operação das unidades é significativo. Então, as UPPs precisam ser repensadas.

> Para se ter uma ideia, um batalhão de uma grande região do estado, como a Região dos Lagos, chega a ter efetivo menor do que o de algumas UPPs da cidade, o que não é razoável. É preciso pensar em uma política de segurança pública que olhe para o estado como um todo.

Romário (Podemos)

> A nossa ideia é reduzir ao máximo as UPPs para que possamos aumentar o policiamento nas ruas. A gente entende que isso vai diminuir muito os roubos.

Anthony Garotinho (PRP)

> Será feita uma avaliação caso a caso. Mas uma coisa é certa: é preciso substituir aqueles latões móveis por uma construção fixa que dê condições de trabalho aos policiais.

> Não será a volta do DPO (Destacamento de Policiamento Ostensivo). Falo de um conceito de polícia de proximidade que existirá conjuntamente com a presença de programas sociais e a geração de renda nas comunidades.

Indio da Costa (PSD)

> Rever, porque defendo o conceito. É preciso devolver os territórios ocupados pelo crime à população de bem. As UPPs são um nome novo para programas antigos, como DPO, PPC e GPAE. A todos faltou um fator essencial quando se lida com o crime: investigação. Sem ela nenhum policiamento ostensivo, em todas as áreas na cidade, dará resultado. Mas os governos não investem em investigação nem obras de infraestrutura porque não são visíveis de imediato.

> Colocar policiais aos olhos da população passa a ideia de governos que combatem o crime, enquanto mortes e assaltos ficam nas estatísticas. É preciso investir na investigação. Aí, sim, a decisão de retomar os territórios será positiva para a população.

Tarcísio Motta (PSOL)

> Defendemos o policiamento comunitário. Mas o programa das UPPs nunca foi um projeto de policiamento comunitário, apesar de a propaganda oficial da turma do Cabral tentar vender essa imagem para enganar o povo.

> As UPPs sempre fizeram parte dessa falida política de segurança que trata a favela como território inimigo e mata pobre todo o dia. É preciso mudar o modelo como um todo.

> Vamos modernizar a gestão, integrar os diferentes órgãos de segurança, reformar a polícia e priorizar o combate ao tráfico de armas. Nosso objetivo será reduzir os índices de violência, em especial homicídios e estupros, e construir uma rede pública de apoio, acolhimento e denúncia para familiares e vítimas.

Márcia Tiburi (PT)

> As UPPs serão transformadas em verdadeiros centros de defesa dos direitos da população. Um espaço pensado a partir do que aprendemos com os erros e acertos tanto das UPPs quanto dos Centros de Defesa da Cidadania que funcionaram nos anos 1980.

> Serão locais destinados a servir de base para uma efetiva polícia de aproximação da coletividade, capaz de assegurar a paz social, mas também voltados à solução dos problemas e conflitos, desde a necessidade de tirar um documento até o recurso à mediação, círculos restaurativos ou tratamentos psicológicos.

> Saem a ocupação militarizada de territórios e as posturas ineficazes, entram ações que reduzem os conflitos e tornam o morador corresponsável pela segurança.

Marcelo Trindade(Novo)

> Vejo duas fases. Até o fim do atual governo, é preciso seguir executando o planejamento do Gabinete da Intervenção Federal.

> Entendo que ele prevê a requalificação dos policiais; a manutenção, com reestruturação, das UPPs com resultados satisfatórios; e o encerramento das atividades das unidades consideradas ineficientes.

> Já no próximo governo, as UPPs devem estar integradas ao amplo processo de reestruturação da segurança pública, servindo como porta de entrada para os outros serviços públicos.

Pedro Fernandes (PDT)

> A implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) gerou, num breve momento, um falso resultado satisfatório, até que sua fragilidade foi exposta e houve reflexos na expansão e reorganização das organizações criminosas pelo estado.

> Fui um dos primeiros a apontar as falhas e problemas nas UPPs quando ninguém falava nisso ainda, mostrando a migração da criminalidade e a desproporção entre o número de policiais nas UPPs e nos outros locais.

> Mediante esse panorama, acredito que o melhor a fazer é fortalecer os batalhões, trazendo os contingentes das UPPs para seus quadros, de forma que o policiamento ostensivo seja realizado nas ruas de maneira organizada e inteligente.

Wilson Witzel(PSC)

> O programa das UPPs se mostrou absolutamente ineficiente na redução dos índices de criminalidade no Rio de Janeiro. Eu fui juiz federal por 17 anos, julguei diversos casos envolvendo o crime organizado e sei que só há uma maneira de combater isso: com inteligência.

> Aúnica saída para solucionar o problema da segurança pública do Estado do Rio de Janeiro é investir em investigação, em um processo liderado pela Polícia Civil.

> A minha proposta é que as UPPs sejam integradas aos batalhões da PM responsáveis pelas respectivas áreas onde essas unidades se encontram para que elas possam contar com a estrutura logística e com o apoio dos comandos policiais.

Dayse Oliveira (PSTU)

> Vamos acabar com as UPPs. Nós sempre estivemos contra essa política, e elas fracassaram pelos motivos que apontamos lá atrás, que se baseavam na lógica da ocupação militar de um território (no caso, as comunidades e favelas). A violência no Rio de Janeiro e no Brasil é fundamentalmente fruto das desigualdades sociais. Não vai ser com operações policiais que vamos resolver este problema.

> A verdade é que as UPPs foram pensadas como uma política não de segurança, mas de repressão à população. É a lógica da criminalização da pobreza, especialmente da juventude negra e pobre, que, ao mesmo tempo que invade as favelas e comunidades, protege todos os ricos e poderosos.

É a favor da intervenção federal no Rio? Se eleito, pediria sua prorrogação ou não?

Eduardo Paes (DEM)

> Não pedirei a prorrogação da intervenção federal. Vivíamos uma falta de comando no Rio e a intervenção foi necessária. Mas ela tem prazo para terminar: dezembro de 2018. Sou candidato a governador para cuidar da segurança pública, e ela será minha responsabilidade.

> Vamos trabalhar em parceria com as Forças Armadas. Até pelo papel que elas representam, com sua inteligência e seriedade, são muito importantes na segurança pública. Quero que elas sejam aliadas do governo do estado no combate à corrupção, na reestruturação das polícias e do sistema penitenciário. As Forças Armadas serão importantíssimas na ação enérgica contra o crime organizado.

Romário (Podemos)

Fui a favor da intervenção porque achei que era e não deixa de ser importante, necessária. Até porque não tem, até o momento, outra solução. No meu governo, vou continuar pedindo ao governo federal ajuda, mas entendo que não seja necessária a continuação da intervenção.

Anthony Garotinho (PRP)

> Ajuda federal é sempre bemvinda, mas, da forma como está sendo feita, não teve resultado algum até agora. Iremos apresentar ao atual interventor o planejamento que fizemos para reestruturar o sistema penitenciário e as polícias Civil e Militar. Se quiserem, está à disposição agora mesmo.

Índio da Costa (PSD)

> Eu não pediria a prorrogação. A intervenção, como as UPPs, teve o sentido político de produção de uma imagem oca, sem profundidade. Sou crítico da ação. O governo federal deve uma fortuna ao Rio de Janeiro pelas pirotecnias que só pioram a situação. No lugar de prorrogar a intervenção, que tem sido mera substituição das polícias pelo Exército, que venham recursos para investir no trabalho de investigação. Quem sabe agir contra o crime são as polícias. O Exército não está qualificado para a função.

> A intervenção só faria sentido se Michel Temer tivesse afastado o Pezão, como sugeri a ele publicamente. A intervenção foi um prêmio a um governo inepto, comprometido com as decisões do Cabral e do Picciani.

Tarcísio Motta (PSOL)

> A intervenção é uma farsa. Foi uma jogada eleitoreira do Temer planejada com sua equipe de marqueteiros que aproveitou a falência do governo Pezão. Desde então, as chacinas aumentaram e a apreensão de fuzis caiu. É muito tiro e pouca inteligência.

> O Rio é um laboratório de intervenções militares desde a Rio-92. Só na última década, o Exército esteve no Morro da Providência, em 2008, no Alemão, em 2010, na Maré, em 2014, e na Rocinha, em 2017. Vamos continuar enxugando gelo e derramando sangue?

> O Rio não precisa de intervenção, mas de outro modelo de segurança pública. Chega de tratar o Exército como polícia e a polícia como Exército. Isso não funciona em lugar nenhum do mundo.

Márcia Tiburi (PT)

> Os recentes dados produzidos sobre a intervenção militar autorizada pelo governo Temer retratam o fracasso dessa medida e o alto risco de desmoralização do Exército brasileiro, envolvido em mais uma ação populista com finalidade política distinta dos interesses da população. Isso para não falar dos riscos para os jovens militares e a população em razão da falta de planejamento, estrutura e preparo para atuar na área da segurança interna.

> Como o governo Temer, a intervenção também é uma fraude. O número de crimes no estado aumentou, apesar da quantidade de dinheiro público gasta com a intervenção. Alguns lucraram muito com ela, mas não foi a população.

Marcelo Trindade(Novo)

> Não haverá espaço para mantê-la porque o novo presidente não abrirá mão de apresentar as propostas de emenda constitucional de que o Brasil precisa.

> As PECs não podem ser examinadas se houver intervenção em algum estado. Mas é fundamental manter no Rio de Janeiro os recursos materiais e humanos trazidos pelas forças federais. Isso é perfeitamente possível por intermédio de Decreto de Garantia da Lei e da Ordem.

> É preciso assegurar uma transição do comando da segurança de volta para o estado, mantendo estruturas e cultivando as sementes plantadas pela intervenção. As polícias têm que voltar a ser instituições do estado, não de governo.

Pedro Fernandes (PDT)

> Não sou a favor da intervenção, mas sim de integração entre as esferas do poder executivo. A meu ver, a intervenção federal no Rio foi de caráter político e eleitoral, e por isso não teve os resultados esperados.

> É fundamental que a principal ação seja o ataque à atividade econômica do crime: que as nossas polícias Civil e Militar, além de receberem maiores investimentos em inteligência e tecnologia, atuem em parceria com a polícia e a Receita Federal.

> Esse trabalho em conjunto servirá para conter a entrada de armas e drogas no território, uma vez que não são produzidos aqui. Com isso, cortaremos pela raiz os meios de sobrevivência e o poderio bélico do crime organizado.

Wilson Witzel(PSC)

> O governo federal não realizou as mudanças constitucionais que planejava e usou a intervenção para demonstrar força. Apesar disso, o Rio de Janeiro está em uma situação tão crítica que toda ajuda é bem-vinda.

> As Forças Armadas contribuem no policiamento e por isso agradeço a todos os militares envolvidos, mas a única maneira de combater o crime organizado, de solucionar esse problema grave, é a investigação, descobrindo o caminho do dinheiro e retirando o poder das quadrilhas. Eu não pedirei a prorrogação da intervenção porque não vou terceirizar a segurança do estado. Vou criar e integrar um gabinete com membros das polícias Civil e Militar, Forças Armadas e demais instituições nacionais.

Dayse Oliveira (PSTU)

> Sou contra. A intervenção federal é parte da mesma lógica da ação militar para resolver problemas sociais por meios militares. A intervenção militar aprofunda a violência contra os mais pobres e desprotegidos. Legitima, quando não incentiva, a continuidade do genocídio de nossa juventude pobre e negra.

> A maior prova disso é que aumentou o número de chacinas nas comunidade e favelas, ou seja, a violência contra a população. É, na verdade, vergonhoso ver que o Exército brasileiro treinou durante anos no Haiti métodos de massacre contra a população e agora, depois de servir de repressor do povo haitiano, vem cumprir o mesmo papel contra a população negra e pobre do Brasil.

Qual é o seu principal projeto para combater a corrupção policial e o fortalecimento das milícias?

Eduardo Paes (DEM)

> É necessário desarticular o crime organizado e retomar os territórios. Vamos criar uma força-tarefa com foco na asfixia financeira e nas ações de inteligência. Hoje o domínio territorial é tão grande que a abordagem precisa ser dividida de acordo com a situação do território: dominado pelo crime organizado — milícia ou tráfico — ou sob o controle do estado.

> Vamos restabelecer o sistema de corregedoria independente, coordenada com o Ministério Público e a Polícia Federal, para juntas atuarem no combate à corrupção policial e penitenciária. A desarticulação do crime também depende da melhoria do sistema penal. É preciso ampliar as vagas e melhorar a gestão.

Romario  (Podemos)

Fortalecer as corregedorias, tornando-as definitivamente independentes. Que elas possam ter independência em suas ações, o que hoje não acontece.

A milícia é um grande problema que nós estamos enfrentando no estado e que acabou se tornando um poder paralelo de grande potencial. A ideia é investir na inteligência, na investigação, para cortarmos seu braço financeiro.

Anthony Garotinho(PRP)

> Foi a minha gestão que criou a corregedoria externa. O primeiro corregedor foi o advogado João Luiz Duboc Pinaud (conhecido ativista pelos direitos humanos que morreu este ano). Por serem muito corporativistas, as corregedorias (das polícias ou da Justiça ou do MP) precisam de um olhar de fora para uma atuação conjunta.

> Sobre as milícias, elas crescem no vazio do Estado. Onde o poder público é presente, não existe espaço para atuação do tráfico ou da milícia. Vamos tornar o estado presente.

lndio da Costa(PSD)

> A corrupção policial e as milícias são crimes da mesma natureza. Sem investigação não se combate o crime, seja de que natureza for. Os governos abandonaram a investigação. O fato está explícito na série de crimes sem autoria.

> Posso dizer que serei implacável com a corrupção policial, mas como puni-la na raiz? Como combater milícias, aplaudidas por políticos, sem investigação? Um batalhão inteiro em São Gonçalo foi preso e desativado pela polícia. Isso dá sinais de que a polícia não gosta da corrupção. Tenho conversado com policiais civis e militares que mostram nojo de corruptos. Para combater o crime é fundamental entender que isso se faz com a polícia e investigação bem feita.

Tarcisio Motta (PSOL)

> Quando Paes foi prefeito e Cabral governou o estado, as milícias cresceram muito, em especial na Baixada e na Zona Oeste da capital. A milícia é um dos braços armados da máfia da velha política. Nesse período, só o PSOL teve a coragem de enfrentar as milícias. E somente nosso governo terá condições de combater a corrupção policial.

> Nossa principal medida será ouvir os próprios policiais para, junto com eles, melhorar suas condições de trabalho. Vamos valorizar o salário dos servidores e garantir planos de carreira dignos. Além disso, vamos qualificar o controle externo e retirar das ruas os agentes envolvidos com grupos criminosos.

Marcia Tiburi (PT)

> A corrupção será atacada onde quer que apareça. As milícias serão enfrentadas com ações de inteligência, como o estrangulamento financeiro desses grupos criminosos. Nosso governo aperfeiçoará os procedimentos administrativos e licitatórios para prevenir fraudes e práticas corruptivas, implementando políticas de monitoramento irrestrito. Pretendemos, por exemplo, gravar as abordagens policiais como forma de atestar a legitimidade da ação estatal.

> Construiremos uma cultura de respeito à legalidade estrita, regulamentando ações para reduzir espaços de discricionariedade e dar efetividade ao enfrentamento do crime, evitando arbítrio, corrupção e impunidade.

Marcelo Trindade  (Novo)

> Em primeiro lugar, o exemplo deve vir de cima. Corruptos, políticos que andam de mãos dadas com corruptos ou sonegadores, ou seja, quem está pouco se lixando para cumprir a lei, não vai resolver o problema. É preciso ter tolerância zero com a bandidagem em todos os níveis.

> Em segundo lugar, só é possível melhorar o desempenho das polícias com estabilidade de seus comandos. Eles devem ter respaldo para cumprir metas claras de redução e de solução de delitos, e não ficar à mercê da pressão de políticos ou criminosos. É fundamental apostar na investigação e na punição efetiva, porque a maior motivação de um bandido é a sensação de que não vai ser pego nem condenado.

Pedro Fernandes (PDT)

> Vou fortalecer e dar autonomia à Corregedoria Unificada das Polícias, para que deixe de ser reativo e se torne um órgão promotor de medidas preventivas contra a corrupção da polícia.

> Quanto às milícias, são organizações criminosas que devem ser combatidas com inteligência. Rastreando a movimentação do dinheiro e descobrindo a origem de sua fonte de renda, acredito que vamos desarticular sua atividade e libertar a população do seu domínio.

Wilson Witzel (PSC)

> Dar independência à corregedoria e instituir as dez medidas contra a corrupção propostas pelo Ministério Público Federal. Todos os que estiverem envolvidos na administração pública, inclusive o próprio governador, deverão apresentar transparência e colaboração com essa iniciativa.

> Vamos realizar testes de integridade, campanhas contra a cultura da corrupção e investigação de sinais exteriores de riqueza, com a possibilidade de improbidade administrativa e demissão.

> O combate às milícias será feito através da investigação, liderada pela Polícia Civil, dos recursos e lavagem de dinheiro, tirando o poder do crime organizado.

Dayse Oliveira (PSTU)

> É preciso mudar a polícia. Precisamos democratizar a polícia, tanto para dentro, dando a seus trabalhadores o direito de se organizar sindical e politicamente, acabando com a hierarquia e disciplina militar, como para fora, permitindo que a população eleja e controle os delegados e oficiais da polícia.

> Uma polícia única, desmilitarizada, controlada pela população, que dê a seus setores mais de base, os que hoje são soldados, cabos e sargentos, o direito de se organizar, seria um passo fundamental para o combate à corrupção. O outro lado disso é a punição exemplar de todos aqueles envolvidos em crimes contra a população