Título: Em 2020 Brasília vai parar
Autor: Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 20/05/2012, Cidades, p. 23

Os recorrentes congestionamentos, que já não se restringem aos horários de pico, são uma prova inequívoca do perfil caótico da mobilidade urbana no Distrito Federal. A capital da República é, essencialmente, uma cidade em que as pessoas dependem de rodas. Isso é visível, assim como os problemas que a falta de um sistema eficiente de transporte público causa. Mas um estudo usado como argumento durante as negociações com o governo federal para receber obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da Mobilidade apresenta em números, gráficos e tabelas a situação viária de Brasília e demonstra o tamanho do problema que a falta de uma rede eficiente de transporte pode gerar em poucos anos.

O levantamento foi realizado no âmbito do Plano Diretor de Transporte Urbano e Mobilidade do DF e Entorno (PDTU) por consultores contratados no fim de 2009 e vem sendo usado pelo atual governo como parâmetro para as soluções discutidas pela Secretaria de Transportes do GDF. O documento contém dados alarmantes. Com gráficos e mapas, o estudo demonstra que, se não forem tomadas providências objetivas para aumentar o acesso ao transporte público, em 2020 Brasília vai parar. Especialistas que participaram da pesquisa demonstraram tecnicamente que, da forma como funciona hoje, a rede viária entraria em total colapso dentro de apenas oito anos (veja mapas acima).

Para qualquer morador do DF que dependa de transporte individual ou coletivo — praticamente oito em cada 10 habitantes do DF (leia mais na página 24) —, as imagens são apavorantes. Comparam o sistema viário da capital em 2010 ao de 2020 no horário de pico da manhã, levando em conta o volume de veículos e a capacidade das ruas e avenidas. Dividido por cores que variam do verde claro, passando pelo laranja, o vermelho e até chegar ao preto, em uma escala de saturação das vias, o documento revela que as principais vias de acesso a Brasília estarão intrafegáveis no fim da década.

Em 2010, o vermelho é a cor predominante no estudo que reproduz o nível de congestionamento do DF. Significa, em números, que o volume de veículos nas principais vias da capital da República atingiu pelo menos 80% de sua capacidade. Em 2020, esse mesmo desenho está praticamente todo pintado de preto, sinal de que o volume de carros e ônibus superou completamente o que comportam avenidas como a Estrutural, que liga Brasília a Taguatinga e Ceilândia; a EPTG, que passa pelo Guará, Águas Claras, Vicente Pires e Taguatinga; a EPNB, que leva ao Núcleo Bandeirante, Riacho Fundo, Recanto das Emas e Samambaia; e a BR-040, rodovia que dá a Santa Maria, Gama, Park Way e Plano Piloto.

Mesmo vias menos acessadas também aparecem nesse diagnóstico em situação praticamente insustentável, como a Estrutural e o trecho norte da Estrada Parque Indústria e Abastecimento (Epia). Hoje, essas pistas variam entre o laranja e o vermelho, representando saturação da ordem entre 60% e 80%, mas no mapa de 2020 figuram em estado crítico. Dentro de poucos anos, apenas ruas em regiões residenciais estariam desimpedidas no horário em que a maioria das pessoas saem de casa para trabalhar. "Se a gente continuar investindo só no carro como maneira de fazer a mobilidade, vamos chegar a esse colapso até antes de 2020. É necessário e urgente que se faça um investimento grandioso em transporte coletivo e não motorizado", recomenda Artur Morais, pesquisador em transporte público da Universidade de Brasília (UnB).

As circunstâncias que convergiram para criar em breve um cenário obscuro do sistema viário do DF foram listadas no estudo do PDTU. Entre os problemas citados estão a falta de integração operacional e tarifária no sistema de transporte coletivo; os elevados intervalos entre as viagens; a acessibilidade limitada para o usuário; a superposição de linhas; a baixa produtividade; a frota velha, de baixa qualidade e com perfil inadequado; o desconforto em terminais e pontos de parada; o desequilíbrio entre a demanda e a oferta de áreas de estacionamento; as práticas irregulares de carga e descarga; a ausência de calçadas e ciclovias, e a ocupação irregular das calçadas. Distorções que, se não forem corrigidas a tempo, prometem imobilizar o Distrito Federal.