Título: Câncer mata mais pessoas no DF
Autor: Oliveira, Sheila
Fonte: Correio Braziliense, 21/05/2012, Cidades, p. 17

Acompanhada do marido, Edimar, Maria Aparecida faz tratamento de um câncer de colo de útero no Hospital Universitário de Brasília: demora para iniciar a radioterapia e a quimioterapia

O Relatório de Doenças Não Transmissíveis do Distrito Federal, elaborado pela Secretaria de Saúde (SES-DF), revela o aumento do número de brasilienses que morrem em decorrência de câncer. De acordo com o levantamento realizado no ano passado, a cada 100 mil habitantes, 81,7 perdem a vida por complicações resultantes de tumores. Em 2010, foram 79,6 óbitos a cada grupo de 100 mil pessoas. O coeficiente médio nacional é de 77,5. Com o resultado de 2011, o DF ocupa o 12º lugar no ranking do país e o primeiro da Região Centro-Oeste. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), neste ano, já foram identificados 216 casos de incidência da doença na população da capital federal. A média brasileira é de 200 casos por grupo de 100 mil pessoas.

O aumento da demanda exige mais recursos financeiros e planejamento no atendimento por parte da rede pública de saúde. No DF, o centro de referência no tratamento do câncer é o Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF), que conta com uma equipe de 14 cirurgiões oncologistas e cinco radioterapeutas, além de dois aparelhos de radioterapia, sendo que somente um está funcionando. Para quem depende do serviço, o número de profissionais e de aparelhos é insuficiente.

É o caso da dona de casa Maria Aparecida Ferreira Seabra, 48 anos, que, para garantir tratamento do câncer de colo de útero, recorreu à Justiça. "Na rede pública, o tratamento por radioterapia segue uma fila única de pacientes que não leva em consideração a gravidade da doença. No Hospital de Base, informaram que o aparelho estava quebrado e teria que esperar. Como sentia muita dor e estava com sangramento, meu marido e filho recorreram ao Ministério Público para garantir o tratamento imediato. Mesmo assim, não consegui iniciar as sessões de radioterapia", conta.

Segundo o gerente de câncer da Secretaria de Saúde, Arturo Santana, está prevista a construção de um Centro de Radioterapia em Taguatinga, que deverá contar com verba do Ministério da Saúde. "São mais de R$ 500 milhões que serão destinados para o DF ampliar o tratamento e atendimento do câncer. Os planos incluem também a ampliação do Centro de Oncologia do Hospital de Base", revela.

Recomendação Hoje, a rede pública de saúde do DF conta com um aparelho de radioterapia em funcionamento no HBDF e outros dois no HUB. "A demanda por tratamento é tanta que nos vimos obrigados a dividir a equipe de profissionais e ampliar o horário de atendimento. Ainda está em estudo a possibilidade de atender aos pacientes à noite, mas tudo depende de um convênio entre a universidade e o GDF para pagar horas extras para os médicos", explica Sandro Martins, chefe da oncologia do HUB. O GDF ainda tem convênio com os hospitais Santa Lúcia e Anchieta para utilizar os equipamentos dessas instituições. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a recomendação é de que exista um aparelho de radioterapia para cada 500 mil pessoas.

A via-crúcis de Maria Aparecida, que morava na Bahia e voltou para o DF com o intuito de tratar o câncer, durou 10 meses, entre exames e consultas em clínicas particulares e hospitais públicos. O marido se viu obrigado a abandonar o emprego para acompanhar a parceira na luta contra a doença. Hoje, o casal conta com a ajuda dos familiares e amigos para pagar as contas, tais como passagem e alimentação. "A primeira médica que desconfiou do câncer solicitou uma biópsia e ficou de ligar, caso fosse algo grave, mas até hoje não ligou. Outro médico da rede pública acreditava que os sintomas, de dor e cólicas na barriga, eram a chegada da menopausa e receitou uma série de hormônios e comprimidos para dor. Esses remédios contribuíram para aumentar o tamanho do tumor e, por isso, quando descobri o câncer, não foi possível retirar o útero", afirma Maria Aparecida.

Atualmente, a dona de casa está internada no HUB, onde realiza o tratamento de quimioterapia e radioterapia, na tentativa de diminuir o tamanho do tumor e, assim, submeter-se à cirurgia. "Depois que fui internada, as dores diminuíram porque estou sendo medicada com morfina. Tenho fé de que o tumor diminuirá e vou ficar curada dessa doença. O meu sonho hoje é ter saúde para cuidar dos meus filhos, netos e marido", diz.

Resultado demorado O marido de Maria Aparecida, o motorista Edimar Seabra de Alvarenga, 46 anos, diz que o descaso na rede pública de saúde com os pacientes é grande. "Mesmo sabendo do estágio avançado do câncer da minha mulher, os médicos nos obrigavam a aguardar até 30 dias por um resultado de exame. O tratamento não foi possível pelo excesso de burocracia do governo e por falta de vontade dos médicos. Éramos tratados com muita frieza pelos profissionais de saúde", critica.

Os dados referentes à mortalidade de câncer no DF são usados como referência para o Inca. Para Sandro Martins, do HUB, eles devem ser analisados com cuidado. "Muitos casos de óbitos que ocorrem nos hospitais regionais são de pacientes de outros estados e que recorrem ao sistema de saúde do DF assim como Barretos, em São Paulo", observa.

» Benefícios

Segundo a Lei Federal nº 8.742/93, o paciente com câncer em estágio avançado ou que sofra consequências de sequelas irreversíveis do tratamento oncológico tem direito a um salário mínimo mensal. Para obtenção do referido benefício, outro critério fundamental é que a renda familiar seja inferior a um quarto de salário mínimo por integrante. Os portadores de câncer com renda familiar de, no máximo, três salários mínimos têm direito também à carteira de passe livre, que possibilita a utilização de transporte coletivo gratuitamente. Se comprovadamente necessário, o acompanhante também pode ter passe livre.