Correio braziliense, n. 20216, 26/09/2018. Política, p. 3

 

Polarização castiga candidatos de centro

Alessandra Azevedo e Gabriela Vinhal

26/09/2018

 

 

ELEIÇÕES 2018 » Movimento Não aos Extremos tenta costurar aliança capaz de levar ao segundo turno uma alternativa aos atuais líderes nas pesquisas de opinião

Em meio a uma disputa polarizada, os presidenciáveis de centro desidratam a cada pesquisa de intenções de voto. Enquanto algumas alas buscam alternativas, nada indica, hoje, que o segundo turno terá algum deles. Especialistas apontam que, a essa altura, os eleitores de centro podem abrir mão dos candidatos pelo voto útil. Com isso, ganham força Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), que lideram as sondagens.

Preocupados com o cenário, representantes dos presidenciáveis do centrão cogitaram se reunir para definir uma estratégia que possa levar algum deles para a segunda fase do pleito. Uma das opções seria escolher um só nome, com apoio dos demais. Entre os convidados peloMovimento Não aos Extremos estavam Alvaro Dias (Podemos), João Amoêdo (NOVO), Marina Silva (Rede), Henrique Meirelles (MDB) e Geraldo Alckmin (PSDB). Marcado para ontem, o encontro não ocorreu. O único que chegou a confirmar presença foi Alvaro, segundo um membro da campanha. Marina, que não tinha dado certeza, recusou depois que soube que Alckmin participaria.

A candidata é a que mais tem sofrido. Passou de segunda mais apoiada, em agosto, com 12%, para a quinta posição, na pesquisa mais recente do Ibope, com 5% das intenções de voto. Se mantiver o patamar, terá 7,3 milhões de votos, pouco mais de um terço dos 21 milhões que conquistou em 2014, quando ficou em terceiro lugar.

“Marina partiu de um patamar muito alto, devido ao recall das outras eleições. Como é a terceira vez consecutiva que é candidata, subiu cedo e muito rápido, mas não conseguiu manter. A queda também foi muito rápida e forte”, analisou o cientista político Sérgio Praça, da Fundação Getulio Vargas (FGV). “Ela não mostrou, em 12 anos, que consegue agregar outras forças políticas”, completou.

Na visão do deputado distrital Chico Leite (Rede), que concorre ao Senado, o peso da polarização é muito grande. “A rejeição tem pautado as eleições presidenciais. Quem é contra Bolsonaro vota no PT. Quem é contra o PT vota em Bolsonaro. E os outros ficam no meio. Tanto que outros candidatos também têm caído”, observa. Com perdas até entre o eleitorado mais fiel, os evangélicos (de 15% para 7% em um mês), outros correligionários admitem que ela não avançará para o segundo turno.

Isso porque, além da eleição polarizada, que estimula o “voto útil” e prejudica os nomes mais ao centro, a ex-ministra enfrenta outros obstáculos. Um deles é a dificuldade de chegar aos eleitores de baixa renda, por ter pouco tempo de televisão e rádio. Embora Marina tenha, proporcionalmente, mais votos entre esses eleitores (7% entre quem ganha até um salário mínimo, segundo o Ibope), o potencial é maior, acreditam especialistas.

Ciro Gomes (PDT) e Geraldo Alckmin (PSDB) buscam novas estratégias. O pedetista mantém 11% — mesmo percentual do levantamento anterior do Ibope —, enquanto o tucano passou de 7% para 8% das intenções de voto. Segundo o cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, coordenador do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas sobre a Democracia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), o fato de os presidenciáveis de centro não conseguirem avançar na disputa pelo Planalto é resultado da polarização que teve início em 2014.

Para o especialista, à época, o PSDB usou a estratégia de desqualificar a política baseado em episódios de corrupção do PT. No entanto, a narrativa abriu caminho para manifestações nas ruas, sustentadas pela revolta dos brasileiros com a máquina pública. “O PSDB só não imaginava que, com isso, desidrataria, pois também se envolveu em esquemas de corrupção. Esses movimentos deram força a Bolsonaro.”

O crescimento de Haddad, para Geraldo, não afetou o eleitor que votaria em Ciro. Enquanto o petista avançou, o ex-governador do Ceará não ganhou nem perdeu votos. Mas precisa ganhar espaço entre eleitores de centro. “O Ciro tem limitações para encarnar o antipetismo. Ele não critica o Lula, critica o PT. Ou seja, é difícil um eleitor radicalmente antipetista migrar rapidamente para o Ciro”, destacou.

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Caciques articulam o segundo turno

Lucas Valença e Simone Kafruni

26/09/2018

 

 

Com o cenário de polarização cada vez mais consolidado, os caciques políticos começam a articular alianças para o segundo turno. Ainda que algumas lideranças partidárias digam que não desistiram das candidaturas próprias, já admitem qual a tendência de apoio numa disputa, cada vez mais provável, entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT). O racha é geral no MDB, cujo candidato, Henrique Meirelles, não decola: o Nordeste acena para a esquerda, o Sul para a direita.

O PSB, que optou pela neutralidade na candidatura nacional, com veto ao nome de Bolsonaro, seguirá o caminho mais óbvio, afirmou o líder Julio Delgado (MG). “Ficamos à vontade para apoiar Ciro ou Haddad. Na convenção do partido, ficou claro que não há possibilidade de retrocesso e de apoio à direita”, disse. “Parte do PSB já apoia o Haddad, no Nordeste, então o caminho é natural.”

Lideranças da Rede, partido de Marina Silva, admitem que a legenda é contra o que Bolsonaro representa. Portanto, a tendência é apoiar politicamente a candidatura petista, mas sem aliança formal, com negociação de cargos. Líderes do Partido Novo também não descartam alianças no segundo turno, nos mesmos moldes de Rede, sem toma lá da cá.

Caso o MDB, partido do presidente Michel Temer, decida apoiar um candidato no segundo turno, a escolha pode não ser respeitada pelos diretórios regionais. O senador Roberto Requião (PR) não dá bola para o que o partido possa determinar: ficará com o PT, garantiu um assessor. No Sul, a tendência da legenda é à direita. No Nordeste, o petista tem apoio declarado de Renan Calheiros (AL).

Para os especialistas, o MDB pode vir a influenciar tanto o processo eleitoral quanto a governabilidade do próximo presidente da República. O cientista político da Universidade Federal do Ceará (UFC) Valmir Lopes acredita que, depois de 1994, quando lançou Orestes Quércia à presidência, o partido “se especializou” no Legislativo. “O MDB foi, progressivamente, migrando para o fisiologismo. É da natureza dele e foi se constituindo eleição a eleição.”

Lopes explicou que a legenda se transformou em um “partido condomínio”, com um tipo de liderança “imperial”, mas a pulverização regional impede a “marcha unida”. Mesmo que feche acordo nacional para a presidência, não terá condição de segurar esse apoio. “A direção nacional pode até definir um candidato. Porém, achar que essa decisão se desdobrará nos estados, não acredito que isso vá acontecer.”

Valmir Lopes alertou que o MDB pode voltar a ter uma bancada expressiva no Congresso. “Não parece muito fácil governar sem o MDB. Talvez, garimpando voto por voto em partidos menores, mas que acabam sendo tão fisiológicos quanto o MDB”, afirmou.

A cientista política e professora da Universidade Federal de Goiás (UFG) Denise Paiva também acredita que o MDB é importante para qualquer coalizão. “Os candidatos que vão para o segundo turno vão buscar apoio de políticos regionais”, sentenciou. Para a acadêmica, é “improvável” que a sigla histórica se posicione em favor de um candidato, nacionalmente.

Frase

"A direção nacional (do MDB) pode até definir um candidato. Porém, achar que essa decisão se desdobrará nos estados, não acredito”

Valmir Lopes, cientista político da Universidade Federal do Ceará