O globo, n. 31048, 09/08/2018. País, p. 8

 

Licitações de R$ 780 milhões na área de TI foram suspensas

Patrik Camporez

Pedro Gomes

09/08/2018

 

 

TCU criou força-tarefa para investigar contratos do governo e encontrou série de irregularidades

Oito pregões milionários e duas licitações já foram anuladas pelo TCU

O crescimento do número de denúncias de irregularidades na área de Tecnologia da Informação levou o Tribunal de Contas da União (TCU) a criar uma força específica para investigar os contratos do governo nessa área. Nos sete primeiros meses de 2018, o TCU suspendeu R$ 780 milhões em licitações de TI envoltas em irregularidades. Foram encontrados ilícitos que vão de sobrepreço a direcionamento de licitação. Ao todo, oito pregões milionários foram suspensos e outros estão sob análise. Duas licitações já foram anuladas e outras duas foram suspensas por iniciativa dos próprios órgãos públicos investigados.

A força-tarefa é coordenada pela Secretaria de Fiscalização de Tecnologia da Informação (Selfti) do TCU, e conta com a participação de secretarias do órgão em sete estados (Amazonas, Pernambuco, Sergipe, Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais e São Paulo). O pente-fino nos contratos foi motivado especialmente pela identificação do mau uso do dinheiro público na área de TI.

Uma das auditorias da Secretaria de Fiscalização encontrou indícios de sobrepreço de 1.500 %. Trata-se do contrato da XYS Tecnologia com o Ministério da Saúde, no qual a auditoria também detectou indícios de superfaturamento. As licitações, na ordem de R$ 41 milhões, visavam atender a demandas do Sistema Único de Saúde (SUS). O Ministério da Saúde firmou o contrato com a XYS em 2014. O contrato foi reajustado em outubro de 2015 e sua vigência foi prorrogada até 4 de dezembro de 2017, por meio de dois aditivos sucessivos no valor de R$ 29,9 milhões cada.

Diante das evidências de irregularidade e suspeitas de direcionamento de contrato, a Secretaria de Fiscalização do TCU determinou a suspensão dos pagamentos à empresa de TI. A XYS recorreu, mas o ministro do tribunal André Luís de Carvalho manteve a suspensão.

Os maiores indícios de superfaturamento foram encontrados na aquisição de licenças de software. O TCU avaliou os preços unitários de licenças semelhantes contratadas pelo Banco Central, também em 2015, e constatou que o Ministério da Saúde pagou de 700% a 1.500% de sobrepreço pelas soluções.

Em manifestação recente do TCU, obtida pelo GLOBO, o órgão de fiscalização afirma que o “mau uso do dinheiro público destinado à TI pode estar relacionado ao modelo adotado pelo governo” para fazer contratação com o setor. Tal modelo favorece a proliferação, em Brasília, de pequenos escritórios que nem sequer têm capacidade técnica e estrutura física para atender contratos públicos, diz o TCU.

Antes mesmo dos processos de suspensão de licitações do TCU, o GLOBO já havia visitado a sede da XYS, em julho, pois a empresa está entre as 10 companhia de TI que mais receberam dinheiro do governo em 2017. Dados da ONG Contas Abertas, levantados a pedido do GLOBO, apontam que a XYS recebeu o montante de R$ 31 milhões do governo federal apenas no ano passado. No endereço da empresa — indicado pelos sócios no contrato com o governo —, a reportagem constatou que funciona uma clínica médica, sem nenhum sinal de trabalho na área de TI.