Título: Supremo põe Cachoeira no palco do Congresso
Autor: Abreu , Diego
Fonte: Correio Braziliense, 22/05/2012, Política, p. 2

O bicheiro Carlinhos Cachoeira tem o depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que leva seu nome marcado para hoje à tarde, mas, no que depender da defesa do contraventor, a presença dele no colegiado deve ser preenchida pelo silêncio e poucas ou nenhuma resposta. O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou ontem à noite a liminar que suspendia o depoimento dele no Congresso Nacional. A decisão do magistrado obriga o bicheiro a comparecer à CPI às 14h, ainda que para não acrescentar informações sobre o seu envolvimento com políticos e empresários.

Na semana passada, Celso havia autorizado o adiamento da ida de Cachoeira ao Congresso, que estava inicialmente marcada para a última terça. O ministro concordou, na ocasião, com o argumento de que a defesa do investigado não teve acesso aos autos do inquérito e, por isso, ele não tinha condições de depor.

Diante da decisão tomada pelo Supremo na semana passada, a CPI reconvocou Cachoeira e autorizou o acesso de seus advogados à sala do Senado onde estão armazenados os dados relativos às investigações das operações Vegas e Monte Carlo. Embora tenha obtido a permissão de acessar toda a documentação, a defesa do bicheiro não compareceu ao Congresso ao longo do último fim de semana.

"É de assinalar, por relevante, que se propiciou, aos ora impetrantes, mesmo neste fim de semana (sábado e domingo), amplo acesso a todos os elementos e documentos probatórios existentes em poder de mencionado órgão de investigação parlamentar, não havendo notícia, contudo, de que tenham eles se utilizado de tal faculdade", destacou o ministro Celso de Mello, na decisão divulgada por volta das 20h de ontem.

Advogado de Cachoeira, o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos havia solicitado que o Supremo adiasse por pelo menos três semanas o depoimento, sob a alegação de que não teve tempo para analisar os autos do inquérito. Em caso de insucesso na tentativa, já havia sinalizado que seu cliente não responderia às perguntas.

Celso de Mello, no entanto, negou o pedido ao derrubar a liminar que postergava a ida do bicheiro até uma decisão definitiva do Supremo. O ministro frisou que a defesa do contraventor teve acesso aos documentos produzidos contra ele na Justiça e na comissão parlamentar de inquérito, o que descaracterizaria o alegado desconhecimento dos dados informativos por parte de Carlos Augusto de Almeida Ramos.

Autoincriminação

Segundo Bastos, Cachoeira ficará em silêncio. Conforme a decisão de Celso de Mello, Cachoeira tem um tríplice dever na CPI: comparecer, responder às indagações e dizer a verdade. O ministro ressaltou, porém, que o investigado tem “o direito de permanecer em silêncio, como expressão da prerrogativa constitucional contra a autoincriminação”.

O relator da CPI, deputado Odair Cunha (PT-MG), preparou 136 perguntas para o contraventor. Os questionamentos estão divididos por blocos e enfatizam aspectos como lavagem de dinheiro, extensão da organização criminosa e relações com a Delta no Centro-Oeste. O nome do ex-dirigente do Dnit Luiz Antonio Pagot também está entre as perguntas que serão feitas por Odair. Com relação à presença do deputado Cândido Vaccarezza (SP) na CPI, o PT resolveu mantê-lo, mesmo depois que ele foi flagrado garantindo blindagem ao governador fluminense, Sérgio Cabral.

Memória

Presença constante em CPIs

O bicheiro Carlinhos Cachoeira não é um novato em investigações parlamentares. Esta será a quarta ocasião em que o contraventor vai depor em situações semelhantes no Legislativo. Na primeira vez, foi na CPI da Loterj, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, em 2004. A segunda foi no processo de cassação do deputado André Luiz (PMDB-RJ), no Conselho de Ética da Câmara, em 2005. Ele também falou na CPI dos Bingos, tendo participado, inclusive, de uma acareação com Waldomiro Diniz, em 2005. O ponto comum nos depoimentos passados de Cachoeira foi ter selecionado alguns personagens para serem blindados e outros para serem atirados à fogueira. No último episódio, o bicheiro poupou o então ministro da Casa Civil e hoje réu do mensalão, José Dirceu, afirmando que ele não tinha conhecimento do esquema de cobrança de propina instalado por Waldomiro Diniz, flagrado em vídeo de 2002, gravado pelo próprio bicheiro, quando o ex-assessor de Dirceu presidia a estatal Loterj (loteria estadual do Rio). O então subprocurador da República José Roberto Santoro também virou alvo de Cachoeira, sendo acusado de omissão por não ter investigado a atuação de Waldomiro na renovação de contrato da Caixa Econômica Federal com a multinacional Gtech. No Conselho de Ética, Cachoeira acusou o então deputado André Luiz de extorsão, por ter pedido ao bicheiro R$ 4 milhões para protegê-lo na CPI da Assembleia do Rio que investigou a gestão de Waldomiro Diniz na Loterj.