Correio braziliense, n. 20197, 07/09/2018. Política, p. 2

 

A facada que sacode a corrida eleitoral

Leonardo Cavalcanti e Lucas Valença

07/09/2018

 

 

ELEIÇÕES 2018 » Atentado contra Jair Bolsonaro repercute mundialmente, com sérias consequências para o país em um ano em que a população vai escolher o próximo presidente. Candidato está fora de perigo, mas ataque influenciará diretamente as urnas

A movimentada Rua Halfeld, no centro de Juiz de Fora, estava ainda mais cheia por causa da passeata feita pelo candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL). Uma confusão tomou conta do local onde ele estava: o capitão da reserva levou uma facada na barriga. O autor, detido pelos apoiadores de Bolsonaro e pela polícia, foi identificado como Adelio Bispo de Oliveira, natural de Montes Claros (MG), que tinha em sua página no Facebook diversas críticas ao militar e ao presidente Michel Temer.

O ataque preocupou familiares, amigos e militantes fiéis, em uma cirurgia que durou cerca de três horas.

Também afetou diretamente o futuro do país, afinal, ele lidera todas as pesquisas eleitorais para o Palácio do Planalto. E deixou a pergunta: como isso vai influenciar a corrida até as urnas? (Confira análise na página 4).  A repercussão veio imediatamente entre os concorrentes, o mundo político e a sociedade civil. “A democracia não comporta esse tipo de situação”, declarou Cláudio Lamachia, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil.

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Golpe no meio da campanha

Leonardo Cavalcanti e Lucas Valença

07/09/2018

 

 

Às 15h40, o candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL) deu entrada na Santa Casa da Misericórdia, em Juiz de Fora (MG), com um sangramento no abdômen. Quinze minutos antes e a 1,2km dali, o capitão reformado havia sido golpeado por uma faca manuseada por Adelio Bispo de Oliveira, 40 anos. O suspeito, preso em flagrante, se aproveitou da aglomeração, no centro da cidade mineira, e avançou com um golpe acima da cintura do político, que estava apoiado nos ombros de um correligionário. O ataque é o mais grave desferido contra um presidenciável, pelo menos desde a redemocratização, em 1985. A arma do crime feriu os intestinos grosso e delgado, além de uma veia, o que provocou hemorragia interna, contida duas horas depois no hospital, em uma cirurgia. Até o fechamento desta edição, às 23h30, na Unidade de Terapia Intensiva, o deputado federal havia recuperado a consciência, apresentava quadro estável, respirava normalmente e não corria riscos imediatos.

As imagens gravadas por celulares, e de vários ângulos da cena, mostram que, no momento do ataque, por volta das 15h25 — noticiado em primeira mão pelo site do Correio —, Bolsonaro contrai o abdômen em sinal de dor. O golpe é rápido, sem chances de defesa. Os 10 policiais federais que acompanhavam o político não conseguiram fazer muito. Um dos relatos dão conta de que um dos agentes chegou a tocar o braço do suspeito, sem conseguir interferir na ação. Bolsonaro participava de caminhada em Juiz de Fora, um município de 500 mil habitantes, depois de três atos de campanha, incluindo uma carreata e um almoço com empresários. O local do ataque é uma encruzilhada de ruas estreitas. Dali, Bolsonaro participaria de um ato religioso. Ao perceberem a gravidade do ferimento, as pessoas mais próximas o levaram até um carro. O percurso até a Santa Casa foi de menos de 15 minutos, por causa do trânsito.

Desde a chegada ao hospital, populares e curiosos fizeram vigília em busca de informações. Bolsonaro é o líder nas pesquisas, e o atentado influenciou a agenda e a estratégia de adversários, que ainda na noite de ontem cancelaram compromissos de campanha e pediram alterações nos programas gravados com ataques ao capitão reformado. Suspeito do crime, Adelio não tem filiação partidária, mas chegou a integrar as fileiras do PSol entre 2007 e 2014. Nas redes sociais, nas fotos em que aparece, ataca políticos, incluindo o próprio Bolsonaro. Em nota, a direção-regional do PSol condenou o ataque. “Nosso partido tem denunciado a escalada de violência e intolerância que contaminou o ambiente político nos últimos anos, por isso não podemos de nos calar diante deste fato grave. Em março, uma caravana do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi atingido por tiros, em Laranjeiras (PR).

Durante a cirurgia, Bolsonaro recebeu quatro bolsas de sangue. Quando a hemorragia foi estancada,  a pressão arterial voltou ao normal, o que o levou a reagir de forma positiva. O médico responsável pela cirurgia, Cícero Rena, disse que, por causa das lesões, o político não pode ser transferido. Uma equipe do hospital Sírio-Libanês, de São Paulo, chegaria de madrugada a Juiz de Fora. Mas o político só deve deixar a Santa Casa em sete ou 10 dias. Além da repercussão interna, o ataque recebeu a atenção dos principais jornais do mundo. A um mês das eleições, a facada contra Bolsonaro mexe na corrida eleitoral. Às cenas dos próximos capítulos.

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Em estado grave, mas estável

07/09/2018

 

 

Médicos da Santa Casa da Misericórdia de Juiz de Fora, onde Jair Bolsonaro (PSL) foi operado, afirmaram, em entrevista na noite de ontem, que a situação do candidato é grave, mas estável. Luiz Henrique Borsato, membro da equipe de cirurgia geral do hospital que participou da operação, afirmou que o candidato foi vítima de um traumatismo abdominal causado pela arma branca e deu entrada no hospital com sinais de choque.

A cirurgia foi realizada em caráter de urgência, com uma “volumosa hemorragia interna” diagnosticada e controlada. Além disso, o militar apresentou lesões em diversos órgãos, segundo o médico. “Três perfurações no intestino delgado, além de uma lesão grave no intestino grosso. Houve contaminação de fezes no interior da cavidade abdominal”, explica o médico. Por isso, foi submetido a uma colostomia (colocação de uma bolsa na parede interna do intestino para recolher as fezes do paciente).

Gláucio Souza, outro cirurgião da equipe, afirmou que Bolsonaro chegou à Santa Casa “com a pressão muito baixa e felizmente conseguimos conter a hemorragia a tempo”. Por ora, o militar recebe antibióticos e deve ficar no local até que tenha condições físicas para ser transportado.

Bolsonaro não estava de colete à prova de balas quando chegou ao hospital. Borsato afirmou que ele perdeu “entre 2 litros e 2,5 litros de sangue” e que os danos foram “muito graves”. Ele conta, também, que o início da cirurgia foi um momento crítico, no qual o candidato estava “muito instável” e que, durante o procedimento, ele foi progressivamente se estabilizando. “É cedo para falar se ele terá sequelas, mas acreditamos que não”, frisou.