Correio braziliense, n. 20195, 05/09/2018. Política, p. 2

 

PT bate cabeça

Paulo Silva Pinto e Alessandra Azevedo

05/09/2018

 

 

ELEIÇÕES 2018 » Sem definição pelo partido se será candidato a presidente ou não, Fernando Haddad enfrenta mais uma denúncia do Ministério Público de São Paulo. Defesa de Lula recorre ao Supremo para que ele continue na campanha

A defesa de Lula entrou com novo recurso. Desta vez, quer que o Supremo Tribunal Federal (STF) se curve uma decisão liminar de dois integrantes de um comitê — composto por 18 membros — das Nações Unidas e permita que o petista, preso em Curitiba, seja candidato ao Palácio do Planalto. Na última sexta-feira, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu barrar a candidatura do ex-presidente porque ele foi condenado em segunda instância e, portanto, está inelegível pela Lei da Ficha Limpa. Dentro do PT, há divisão sobre a melhor estratégia a ser seguida. Um grupo acha que a insistência em Lula já passou do limite e deveria ser dada a chance de Fernando Haddad ser efetivado como o candidato do partido. O ex-prefeito, aliás, voltou a sofrer novo revés: foi denunciado pelo Ministério Público de São Paulo por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.

A acusação é de que Haddad recebeu, em 2013, primeiro ano no mandato como prefeito de São Paulo, R$ 2,6 milhões da construtora UTC para pagar dívidas de campanha. Ele nega. Um dos principais argumentos da defesa está no fato de que o relato do pagamento está na delação do ex-presidente da empresa, Ricardo Pessoa, que teria sido anulada.

Segundo o promotor Marcelo Mendroni, o pedido de dinheiro foi feito pelo então tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, condenado e preso em Curitiba no âmbito da Operação Lava-Jato. “Vaccari falava em nome de Haddad, que foi beneficiário final do pagamento da dívida”, afirmou Mendroni. Vaccari também foi denunciado, assim como o doleiro Alberto Youssef e outras três pessoas. Haddad já é réu em um processo na Justiça de São Paulo, mas no âmbito civil, não criminal, em um processo por improbidade administrativa na construção de ciclovias quando era prefeito. A denúncia veio em 21 de agosto.

A presidente nacional do PT, senadora Gleisi Hoffmann, minimizou os efeitos da nova denúncia e classificou a motivação do Ministério Público de eleitoreira. “Se denúncia atrapalhasse, nós não estaríamos em primeiro lugar nas pesquisas. O Ministério Público de São Paulo está a serviço da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB). O promotor é o mesmo que já fez denúncia contra o presidente Lula. Estamos tomando providências em relação a ele no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público)”, afirmou a senadora.

A assessoria de Haddad publicou nota sobre a denúncia, tentando desacreditar as delações de Pessoa e afirmando que o ex-prefeito contrariou interesses do empresário. “Surpreende que no período eleitoral, uma narrativa do empresário Ricardo Pessoa, da UTC, sem qualquer prova, fundamente três ações propostas pelo Ministério Público de São Paulo, contra o ex-prefeito e candidato a vice-presidente da República, Fernando Haddad”, diz o documento.

Haddad não corre riscos de se tornar inelegível, explicou o advogado Flavio Unes, especialista em direito eleitoral e professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP). “A lei da Ficha Limpa é bem clara ao determinar que só se torna inelegível quem for condenado em decisão colegiada”, afirmou. Também não há tempo para que Haddad seja julgado e condenado em duas instâncias no processo em que é réu.

Supremo acionado

É o que aconteceu com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado em segunda instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Na sexta-feira, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu indeferir sua candidatura à Presidência, exatamente com base na Ficha Limpa, concedendo prazo até 11 de setembro para que seja apresentado um substituto. Assim, Haddad está em uma espécie de limbo: é candidato a vice-presidente, aparecendo na propaganda de rádio e tevê, mas não tem um candidato a presidente na chapa.

Ontem, porém, a defesa de Lula apresentou uma tutela de urgência ao STF para manter a candidatura até uma decisão final do tribunal. “Protocolamos hoje (ontem) perante o Supremo Tribunal Federal pedido de tutela de urgência para que, com base na decisão liminar proferida pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU (...), seja afastado qualquer óbice à candidatura”, diz a nota assinada por advogados do petista. “Na mesma petição, demonstramos a urgência na apreciação do pedido diante das determinações do TSE no último dia 31 de agosto”, acrescentam os defensores.

O tema sobre a insistência na candidatura de Lula é controverso no PT. Governadores do partido defendem que a substituição seja feita logo, o que poderia favorecer a transferência de votos de Lula para Haddad, algo que, por enquanto, não tem animado os eleitores lulistas. Outra corrente, liderada por Gleisi, defende que se desconsidere essa possibilidade para aumentar as chances de uma decisão da Justiça.

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Partido pode ter de devolver dinheiro

05/09/2018

 

 

O PT pode ter que devolver os valores do fundo eleitoral que tenham sido gastos com a campanha de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República. Até agora, o partido destinou R$ 19,8 milhões para o financiamento da campanha do ex-presidente, barrado pelo TSE, com base na Lei da Ficha Limpa, mas que o PT insiste em manter como candidato, embora haja divergências internas cada vez mais fortes a respeito dessa estratégia. Petistas afirmam que mantê-lo na chapa por mais tempo dificultaria a transferência de votos para o vice, Fernando Haddad, em cima da hora.

Na última sexta-feira, durante o julgamento do pedido de registro do ex-presidente, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estipulou o prazo de 10 dias para a substituição do nome, mas não decidiu sobre o requerimento do Ministério Público Eleitoral (MPE) que pede a devolução dos valores gastos durante a campanha. Chefiado pela Procuradora-Geral de República (PGR), Raquel Dodge, o Ministério Público entende que a Corte não deveria apenas declarar a rejeição do registro de candidatura de Lula, mas também a “devolução ao TSE dos recursos destinados ao financiamento da campanha do candidato impugnado, até sua eventual substituição”.

Desde que pediu a impugnação da candidatura de Lula, em 15 de agosto, Dodge sustenta que os recursos públicos devem ser usados “apenas para financiar campanhas dos elegíveis”. Como não houve decisão do TSE sobre o assunto, o relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso, sugeriu, no fim do julgamento, que ele poderia ser retomado por meio de um embargo de declaração, a ser enviado pela PGR. Dodge assentiu, mas não confirmou que entraria com o recurso, de forma que o assunto pode não voltar à pauta.

Tutela de urgência

Ao mesmo tempo, a advogada Karina Kufa, especialista em direito eleitoral, entrou com uma tutela de urgência para que o tema seja decidido pelo TSE. Para Karina, como o registro foi indeferido, o gasto deve ser considerado irregular pela Corte. “Caso o partido tenha usado algum valor desse fundo na campanha de Lula, deve ser devolvido”, afirmou. Além disso, qualquer material elaborado antes não pode ser usado na campanha, porque o gasto teria sido feito por fora, o que prejudicaria a prestação de contas. “Ou seja, se tiver alugado um estúdio para gravar um vídeo, antes de ser preso, por exemplo, não pode usar o material final na campanha”, explicou. (AA e PSP)