Título: A insegurança que ronda os ministérios
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Fonte: Correio Braziliense, 24/05/2012, Brasil, p. 12

Cada vez que um grupo de manifestantes marcha pela Esplanada dos Ministérios munido de faixas e entoando gritos de guerra, servidores que trabalham no local ficam na expectativa, sem saber se vão conseguir entrar ou sair dos prédios ou mesmo se estão seguros no exercício da função. Ontem, cerca de 150 militantes chegaram à sede do Ministério da Fazenda, ainda de madrugada, e encontraram as portas fechadas. Por volta das 6h, venceram a resistência da segurança, quebraram vidros e ocuparam o prédio. Servidores reclamaram de agressões com pedaços de madeira e pedras e houve embate entre manifestantes e policiais. Na semana passada, foi a vez de os próprios funcionários das pastas de Saúde, Previdência, Trabalho e Emprego, que lutam pela reestruturação da carreira, bloquearem as cinco entradas de suas sedes.

Sem um protocolo específico para a segurança pública agir nesses casos, as pressões costumam dar resultado. Na manifestação de ontem, os trabalhadores só saíram do prédio às 10h40, depois de o secretário executivo, Nelson Barbosa, aceitar conversar com eles. Elisângela Araújo, coordenadora da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil (Fetraf), explicou que o movimento decidiu radicalizar por não ter respostas para uma pauta de reivindicações entregue ao governo federal em 19 de abril. “Foi a primeira vez que fomos recebidos aqui. Queremos discutir nossas questões do ponto de vista econômico”, afirmou.

A atitude do grupo liderado por Elisângela faz parte da rotina de manifestantes. A chefe da assessoria de imprensa do Ministério do Desenvolvimento Agrário — invadido duas vezes este ano —, Ayeska Azevedo, conta que o acesso é o primeiro ser desestabilizado. “Geralmente, as invasões ocorrem antes de o expediente começar para que os funcionários não consigam entrar no prédio”, disse. Embora o edifício do MDA seja o alvo mais comum por causa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), nenhuma atitude mudou em relação à segurança. Segundo Ayeska, quando o órgão é ocupado, a primeira reação é acionar a Advocacia-Geral da União para sejam adotadas medidas judiciais.

Assim como os demais edifícios da Esplanada, o MDA conta com os serviços de uma empresa de segurança privada e nenhum policiamento específico. O vice-presidente do Sindicato das Empresas de Segurança Privada de São Paulo (Sevesp), João Palhuca, esclarece que os seguranças não podem agir nesses protestos. “A lei é clara. O dever é de proteger o patrimônio. Não temos autoridade de polícia nem podemos proteger o direito constitucional de cada um. Por isso, em casos de ocupação, nosso dever é chamar a polícia”, explica. No caso dos ministérios, as polícias Civil e Militar são as primeiras a serem chamadas. Depois da invasão, quando corre risco de dano ao patrimônio, a Polícia Federal também entra em cena.

Identificação Os ministérios geralmente contam com dois vigias na portaria principal e dois funcionários que fazem o registro dos visitantes. A regra costuma ser a mesma para as entradas. “A gente pede uma identificação com foto, pergunta onde a pessoa vai e liga lá para confirmar”, explica o substituto da Coordenação de Administração do Ministério do Esporte, Olímpio Dionísio. Uma funcionária da portaria do ministério, que preferiu não se identificar, relata que, na última invasão que o prédio sofreu, algumas pessoas descaracterizadas entraram na sede e passaram para manifestantes do lado de fora informações sobre onde poderiam ir. “De repente, entraram 30 de uma vez e não teve como segurar”, detalha. Quando isso ocorre, os elevadores são paralisados e as portas, fechadas.

Reivindicações Os trabalhadores rurais organizaram o protesto para pedir mais recursos à reforma agrária, a criação de um conselho gestor da política que trata do tema, a proibição da comercialização de terras brasileiras a estrangeiros e a regularização fundiária. A categoria também tem demandas específicas, como medidas para minimizar os problemas da estiagem no Sul e no Nordeste, a abertura de uma linha de crédito de R$ 10 mil para os agricultores e a extensão do salário-maternidade de quatro para seis meses. Um dos coordenadores do movimento, Paulo César Farias, acrescentou que o governo propôs a criação de um grupo de trabalho para discutir as reivindicações. “Vamos debater os grandes entraves para o desenvolvimento dos assentamentos.”

Palavra de especialista

Sistema de proteção As instalações públicas precisam resolver o problema com o seu próprio sistema de vigilância terceirizado. Não tem sentido colocar policiamento nessas entidades. O ideal seria um sistema capaz de pelo menos impedir a depreciação do patrimônio público. Todo excesso deve ser encaminhado ao conhecimento da polícia e quem participa de quebra-quebra deve ser processado, porque isso é crime. Esses locais são públicos e permitem o acesso de quem quiser. Se houve um dano, a polícia tem que ser chamada para impedir. Os únicos locais que justificam ter aparato policial são as sedes dos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. Na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, a segurança é feita pelas polícias legislativas. No Palácio do Planalto, a responsabilidade é do Gabinete de Segurança Institucional. Coronel José Vicente da Silva, consultor em segurança pública

“Aqui está às moscas”

O sentimento de insegurança que toma conta da Esplanada devido às constantes invasões e ao aumento nos índices de criminalidade registrados nas proximidades dos órgãos fez com que funcionár ios dos ministér ios se unissem para exigir melhorias nas condições de vigilância. A ideia resultou no movimento Segurança na Esplanada, uma Questão de Estratégia, que agrega os ministérios da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), da Educação , do Trabalho e Emprego e o da Ciência e Tecnologia, mas pretende se estender por todo o setor.

Segundo a líder de coordenação interna do grupo, Maria Cristina Bustamante, a situação é dramática. “Os ministérios estão completamente desprotegidos. As políticas públicas são realizadas nesses prédios, precisamos de um cuidado diferenciado. Recebemos missões internacionais, documentos sigilosos. Não estamos querendo proteção à nossa integridade unicamente, mas ao exercício das atividades estratégicas ao governo. Até pouco tempo, não tínhamos nem policiamento na área”, frisou.

Nos últimos 40 dias, foram registrados três furtos a carros nas redondezas do Mapa. O chefe da seção de segurança da pasta, Jorge Lasneaux, lembra que a área já foi de segurança nacional. “E hoje está às moscas. Ninguém é responsável pela segurança da Esplanada”, reclama. Lasneaux explica que faz o possível para aproveitar os seguranças no auxílio, o que vai além da função deles. “Como eles não podem agir em dias de manifestação, ficam dois nas laterais dos prédios. Se eles veem alguma movimentação estranha, avisam e a gente fecha as portas. E, em casos de furto ou assalto, eles acionam uma sirene, que costuma assustar quem faz esse tipo de abordagem.” (GC)