O globo, n. 31099, 29/09/2018. País, p. 4
POLARIZAÇÃO REFORÇADA NA RETA FINAL
Jeferson Ribeiro
Miguel Caballero
29/09/2018
Bolsonaro se mantém, Haddad cresce e ambos se isolam dos adversários;
Pesquisa deve aumentar a pressão sobre Ciro, Alckmin e Marina, estagnados
A oito dias da votação, pesquisa Datafolha divulgada na noite de ontem confirma a polarização da disputa pela Presidência da República entre Jair Bolsonaro, do PSL, e Fernando Haddad, do PT. Na comparação com o levantamento anterior do instituto, em 20 de setembro, Bolsonaro se manteve com 28% das intenções de voto, na liderança, e o petista cresceu de 16% para 22%. A diferença entre os dois primeiros colocados, de seis pontos, foi a mesma captada pelo Ibope, em pesquisa divulgada na última quarta-feira. A distância de Haddad para Ciro Gomes (PDT), numericamente o terceiro colocado com 11%, aumentou de três para 11 pontos na série do Datafolha, reforçando o cenário de predominância de Bolsonaro e Haddad. Ciro está tecnicamente empatado com Geraldo Alckmin (PSDB), que marcou 10%. Marina Silva (Rede) figurou com 5% e está em empate técnico com o pelotão de baixo da pesquisa. O índice dos que pretendem votar nulo ou em branco oscilou de 12% para 10% e os que não souberam responder permaneceram em 5%. Haddad foi o único a crescer fora da margem de erro, que é de dois pontos percentuais. Ciro Gomes e Marina Silva oscilaram dois pontos para baixo, cada, e Geraldo Alckmin, um para cima. A incapacidade de crescer nas pesquisas já tem afetado as campanhas pelo menos do tucano e da candidata da Rede. Alckmin tem tido que conviver com aliados declarando ou planejando apoio a adversários, enquanto Marina iniciou a redução de sua equipe de trabalho com vistas a evitar um endividamento maior ao fim da eleição.
REJEIÇÃO DOS LÍDERES SOBE
O Datafolha também mediu a rejeição de cada candidato e as intenções de voto em diferentes cenários de segundo turno. Internado em um hospital de São Paulo, 23 dias depois do atentado a faca sofrido em Juiz de Fora no último dia 6, Bolsonaro voltou a sofrer ataques mais duros de seus adversários nos últimos dias, em especial da campanha de Geraldo Alckmin, dona do maior tempo de televisão. Se Bolsonaro se manteve consolidado na liderança e não perdeu intenção de votos, sua rejeição cresceu três pontos, de 43% para 46%. Os pesquisadores do Datafolha entrevistaram os eleitores ontem e anteontem, numa semana em que o candidato a vice de Bolsonaro, o general Hamilton Mourão, deu declarações que foram reprovadas pela própria campanha do PSL, como as críticas ao 13º salário. Também cresceu três pontos percentuais o número de eleitores que respondeu não votar “de jeito nenhum” em Fernando Haddad. A rejeição do petista foi de 29% para 32%. Os dois líderes são mais rejeitados que Marina Silva (28%), Geraldo Alckmin (24%) e Ciro Gomes (21%).
Nas simulações de segundo turno, Bolsonaro piorou sua performance, e aparece perdendo fora da margem de erro para todos os adversários. Numa eventual disputa com Haddad, o petista vence por 45% a 39% (ambos estavam empatados em 41% no levantamento anterior). Contra Ciro Gomes, a diferença aumentou quatro pontos, e agora o pedetista venceria Bolsonaro por 48% a 38% num segundo turno. Contra Geraldo Alckmin, o empate técnico da pesquisa anterior se transformou em vitória do tucano, por 45% a 38%. O cientista político e professor da USP Rubens Figueiredo diz que é preciso ter cautela ao analisar os cenários do segundo turno. — Nessa fase, os dois candidatos terão o mesmo tempo de TV, é possível que a taxa de rejeição de Haddad venha a crescer com os ataques. Isso pode equilibrar o jogo da rejeição. Essa é uma eleição do ele não. A pessoa vota para tirar o candidato inaceitável. O vencedor deve ser aquele que tiver a menor rejeição.
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Efeito teflon preserva votos bolsonaristas
Paulo Celso Pereira
29/09/2018
Em 2014, após ser alvo de intensa campanha de TV que associava sua proposta de independência do Banco Central à possibilidade de famílias ficarem sem ter o que comer, Marina Silva derreteu velozmente. Nas últimas semanas, Bolsonaro foi alvo de um intenso bombardeio dos adversários —e manteve-se inabalável do alto dos mesmos 28%, na liderança da corrida eleitoral.
A ampla campanha de artistas, brasileiras e internacionais, nas redes em torno do bordão #Elenão não impactou o eleitor que já havia escolhido o capitão reformado. Tampouco teve efeito sobre os eleitores do deputado a profusão de propagandas de Geraldo Alckmin alardeando a possibilidade de volta da CPMF e o risco de Fernando Haddad vencer Bolsonaro no segundo turno. Desqualificando moralmente os adversários e dizendo-se alvo de perseguição da imprensa, Bolsonaro parece ter conseguido desenvolver em seus eleitores o que no meio político se chama de “efeito teflon”: nenhuma informação negativa a seu respeito “cola” para quem já aderiu. Isso garante a Bolsonaro sua presença no segundo turno. O problema do capitão reformado hoje está nos cerca de dois terços dos eleitores que não aderiram à sua campanha. Os números divulgados pelo Datafolha ontem praticamente repetem os que já haviam aparecido na pesquisa Ibope do início da semana. A notícia mais relevante de ambas é que, embora mantenha seu apoio inabalável, Bolsonaro viu sua rejeição crescer fortemente, atingindo 46%.
As duas pesquisas também mostram que o capitão — que ontem disse que não reconheceria um resultado diferente da vitória — perde no segundo turno, fora da margem de erro, para Alckmin, Ciro Gomes e até para o petista Fernando Haddad. O ex-prefeito de São Paulo segue em rápido crescimento e ontem já tinha 22% das intenções de votos —o dobro de Ciro, que perdeu dois pontos, caindo para 11%, e quase empatou numericamente com Alckmin, que ganhou um e chegou a 10%. Mantido o ritmo atual, não é improvável que Haddad saia do primeiro turno numericamente à frente de Bolsonaro. Só que com o crescimento da intenção de votos no petista, aumenta também sua rejeição, que já atinge 32%.
O segundo turno que se anuncia tende a ser uma disputa entre dois campos que inspiram mais rejeição que confiança. Dele, não sairá um vencedor, mas um sobrevivente. Ao que tudo indica, parte significativa da sociedade será obrigada a escolher alguém que não gosta para impedir outro, que ela desgosta ainda mais, de ganhar.