Nelson Lima Neto
29/09/2018
Em meio a uma crise na saúde, prefeitura planeja reposição salarial
A nove dias das eleições, o prefeito Marcelo Crivella se vale de uma melhora tímida na receita do município, que enfrenta problemas de caixa, inclusive na área da saúde — onde tem dívida de R$ 500 milhões com Organizações Sociais —, para acenar com um reajuste salarial dos servidores. Ontem, ele vedou, com um decreto, abertura de concursos públicos e aumento do número de cargos comissionados para, segundo fontes, conseguir uma reposição de 7,61% para o funcionalismo até o fim do ano. O percentual estimado para o aumento é referente à inflação acumulada desde setembro de 2016 — a gestão municipal já não havia concedido reposição em 2017 devido à crise econômica. O cálculo surge após uma avaliação, divulgada ontem, do desempenho da administração perante a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Pela primeira vez em 17 meses, a prefeitura reduziu seu gasto com pessoal a um patamar menor que o limite prudencial previsto pela LRF. Ao fim de agosto, ela gastou 51,19% de sua receita líquida com salários e direitos trabalhistas. O percentual, no entanto, está próximo ao limite prudencial da lei, estabelecido em 51,3%.
MOMENTO ELEITORAL
André Luiz Marques, especialista da área de gestão e políticas públicas do Insper, disse ao GLOBO que, caso o município não mantenha a evolução de receita registrada até o momento, a prefeitura voltará a extrapolar o limite prudencial da LRF ao fim de dezembro.
— O represamento do reajuste dos servidores durante dois anos, somado à contenção dos investimentos e a um aumento importante de arrecadação, pode possibilitar a recomposição salarial no final de 2018. Mesmo assim, para se manter abaixo do limite prudencial, a prefeitura tem que arrecadar R$ 7,2 bilhões até dezembro. Isso significa manter a receita mensal desde o início do ano, tendo apenas uma arrecadação residual do IPTU —alertou Marques. A concessão de um reajuste de 7,61% para o funcionalismo pode gerar uma despesa extra de R$ 80 milhões em 2018, de acordo com o secretário da Casa Civil, Paulo Messina. No entanto, o impacto será sete vezes maior no ano que vem, segundo cálculos feitos por André Luiz Marques. —Em 2019, a situação não será tão confortável, pois o impacto deste aumento chegaria a aproximadamente R$ 630 milhões. Para se manter dentro do limite prudencial da LRF, a prefeitura terá que conter novamente despesas e investimentos, além de crescer a receita 20% acima da inflação prevista para o ano — avaliou o especialista. Para o economista Luiz Mario Behnken, do Fórum Popular do Orçamento do Rio, o possível reajuste — embora haja uma pendência com o funcionalismo, que ficou sem aumento em 2016 e 2017 — gera frutos políticos e precisa ser avaliado do ponto de vista da receita.
— O problema da prefeitura está na arrecadação. Imagino que isso seja possível, no momento, em função do aumento do IPTU, por exemplo. Há uma pendência com servidores, mas existe um viés eleitoreiro — observou o economista. O prefeito tem aparecido na campanha do filho, Marcelo Crivella Filho (PRB), a deputado federal. Braço direito de Crivella, o ex-secretário municipal de Transportes, Rubens Teixeira, também concorre (PRB) a deputado federal. Paulo Messina destacou que o desejo da administração é encerrar o ano com o 13º salário quitado e o reajuste aplicado. — Começamos 2018 com a previsão de que a prefeitura quebraria no início do segundo semestre. Hoje, temos certeza de que vamos conseguir pagar os salários em dia até o fim do ano. Agora, vamos fazer as contas para garantir o 13º e ter condições de oferecer a reposição — disse Messina, que não quis comentar um possível uso eleitoral da medida. Entre lideranças do funcionalismo, as despesas da prefeitura alimentam incertezas em relação à reposição salarial.
— O gasto com pessoal, nos últimos quadrimestres, cresceu. Só que este crescimento se deu na contramão dos direitos do funcionalismo de carreira, ou seja, alguém ganhou enquanto nós, e a cidade, perdíamos. Uma prática de gestão que valorizasse efetivamente o serviço seria bem mais saudável do que promessas combinadas com o calendário eleitoral — disse Ulysses Silva, integrante do Movimento Unificado de Defesa do Servidor Municipal. Entre 2016 e agosto de 2018, a prefeitura elevou sua despesa com pessoal em R$ 600 milhões, pela necessidade de aplicar direitos comuns aos servidores, como triênios e enquadramentos. Para o fim do ano, as apostas de Crivella para manter ou elevar o percurso da receita têm alguns pilares. A esperança é que medidas como o Concilia (programa para incentivar a quitação de pendências com a Dívida Ativa), o Mais Valia e a taxação de parte dos inativos abram espaço para a reposição.
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Multa para van que roda irregularmente é suspensa
Marco Nunes
29/09/2018
A prefeitura voltou a abrir mão de punir motoristas do transporte alternativo que insistem em fazer itinerários para os quais não foram cadastrados. Uma resolução publicada ontem no Diário Oficial do município pela Secretaria de Transportes suspendeu todas as multas aplicadas desde 2013 a vans que circularam fora de trajetos permitidos nas zonas Norte e Oeste. A medida vale por 30 dias, prorrogáveis por igual período. O município não informou, no entanto, se é uma suspensão temporária ou uma anistia definitiva.
Não foi a primeira vez que a atual administração municipal beneficiou motoristas de vans flagrados fazendo lotada
fora dos trajetos autorizados. Em abril, pouco antes de deixar o cargo de secretário de Transportes, Rubens Teixeira suspendeu todas as infrações dos últimos cinco anos. Hoje, ele disputa uma cadeira na Câmara Federal.
De acordo com a nova resolução da prefeitura, a suspensão é válida para todas as multas aplicadas, inclusive as vencidas, e também englobará as que ainda não foram lançadas na base de dados do Sistema de Transportes Urbanos. Atualmente, o Rio tem 2.279 vans autorizadas a fazer lotada, e 613 delas circulam pela Zona Oeste, onde o transporte alternativo sofre forte influência de milícias.
Para Marcelo Cerqueira, presidente do Sindicato dos Proprietários de Vans do Rio, a medida tomada pela Secretaria de Transportes do município “incentiva o mau permissionário a circular fora dos trajetos permitidos”: —A resolução é um desserviço. O poder público não deveria conceder benefício a quem anda fora da lei. Tratase de um estímulo a quem trabalha de forma errada. Em abril, quando parte das multas foi suspensa, o Sindicato dos Motoristas do Estado do Rio (uma outra entidade que representa permissionários do transporte alternativo) argumentou que o ato serviria para corrigir um erro da própria prefeitura. Na ocasião, seus dirigentes alegaram que o município autorizou proprietários de vans a circularem fora das linhas, mas se esqueceu de comunicar a medida a agentes do serviço de fiscalização. Na época, a Secretaria de Transportes reconheceu, por meio de uma nota, que houve uma autorização para vans rodarem por itinerários alternativos até que um estudo sobre alteração de rotas fosse concluído. O mesmo comunicado alertava para um “problema” — multas continuavam sendo aplicadas por um sistema eletrônico que monitora deslocamentos do transporte alternativo por GPS. Em uma nova nota, a Secretaria de Transportes informou que a resolução publicada ontem no Diário Oficial tem como objetivo possibilitar “a realização de procedimentos administrativos, por parte dos permissionários, que estavam restritos por conta da existência de autuações (por descumprimento de itinerários)”. “Os procedimentos envolvem rotina administrativa, como inclusão e exclusão de auxiliares, troca de veículos e vistoria”, diz outro trecho do texto.