O globo, n. 31097, 27/09/2018. País, p. 4
ALVO ÚNICO
Dimitrius Dantas
27/09/2018
Com Bolsonaro internado, rivais concentram ataques em Haddad
A 11 dias do primeiro turno, o petista Fernando Haddad foi o principal alvo dos adversários em debate realizado ontem, em São Paulo. Enquanto o líder das pesquisas, Jair Bolsonaro (PSL), segue internado em recuperação do atentado sofrido, o ex-prefeito de São Paulo, isolado na segunda colocação, recebeu os mais fortes ataques, justamente de adversários com quem seu partido já teve boas relações, como Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede).
No embate direto com Haddad, Ciro e Marina se distanciaram do antigo aliado e apontaram o PT como responsável pelo crescimento de Bolsonaro e pela chegada do presidente Michel Temer à Presidência. Sem Bolsonaro, oito candidatos participaram do encontro organizado pelo “SBT” em parceria com o jornal “Folha de S.Paulo” e o “UOL”: Álvaro Dias (Podemos), Cabo Daciolo (Patriota), Geraldo Alckmin (PSDB), Guilherme Boulos (PSOL), Henrique Meirelles (MDB), além de Haddad, Ciro e Marina.
Bolsonaro pouco foi citado no debate mas esteve na cabeça dos adversários durante todo o confronto. Ao atacarem o PT, Alckmin, Ciro, Dias e Marina procuraram, na verdade, conquistar eleitores de perfil antipetista, e que estão hoje com o candidato do PSL. As campanhas têm avaliado que grande parte do eleitor de Haddad, herdeiro eleitoral do ex-presidente Lula, está consolidado e dificilmente trocará de candidato.
Terceiro colocado, com 12% das intenções de voto, segundo pesquisa Ibope divulgada ontem, Ciro afirmou que preferiria não governar com o PT, caso eleito. Disse que o partido de Haddad foi responsável pela boa performance nas pesquisas de Bolsonaro, a quem chamou de “aberração”.
— Francamente, se eu puder governar sem o PT, eu preferia. Nesse momento, o PT representa uma coisa muito grave para o país, se transformou nessa estrutura de poder odienta, que criou Bolsonaro —disse Ciro. Haddad rebateu:
— Acabo de ver o Ciro Gomes dizer que não gostaria de governar com o PT. Mas, poucos meses atrás, me convidava para vice-presidente na sua chapa e chamava essa chapa de dream team, o time dos sonhos.
Ao final do debate, indagados e continuará abuscar um aliança com o pedetista caso chegue ao segundo turno, o petista foi categórico: —Vou, lógico. Haddad também foi alvo de ataques ao debater com Marina, com quem travou um duelo sobre a“paternidade” do governo Temer. Primeiro, ela disse que o PT havia colocado Temer na Presidência, ao que Haddad respondeu:
— Quem botou o Temer lá foram vocês [oposição]. O Temer traiu a Dilma e não conseguiria chegar à Presidência se não fosse o apoio da oposição. Você participou desse movimento.
Na tréplica, a ex-senadora relembrou a aliança do PT com Renan Calheiros, também favorável à remoção de Dilma do cargo, em Alagoas:
— É muito engraçado, Haddad, você vir falar do Temer e do impeachment quando foi pedir a bênção do Renan Calheiros. O PT faz discurso dos trabalhadores e se junta com o Temer .
Alvaro Dias também teve confronto com Haddad:
— Em 2007, trabalhei duro para acabar com a CPMF. Agora alega que vai reduzir impostos. O PT é implacável com o pobre, distribui a pobreza —disse.
Do lado dos candidatos antipetistas que também tentam chegar ao segundo turno, Alckmin não teve confronto direto contra Haddad. Na defensiva, o ex-governador sofreu com críticas a pontos fracos de seu governo no estado de São Paulo. E aproveitou as considerações finais para atacar o PT e Bolsonaro:
— O Brasil tem pressa, não pode errar de novo: nem o PT voltar, que é o responsável por isso, nem o candidato da discriminação, que só vai levar à violência. Mais da metade da população não quer nem um, nem outro. Precisamos agora de uma grande reflexão.
Alckmin foi duramente atacando por Boulos, que o chamou de “Cabral que não foi preso”, e ironizado por Meirelles, por problemas no governo de São Paulo:
— Candidato, vamos falar de eficiência. O estado de São Paulo deve finalmente completar a linha 5 do Metrô. O problema é que isso demorou 20 anos.
“Você participou desse movimento pelo impeachment para colocar o Temer lá”
Fernando Haddad, em discussão com Marina sobre “paternidade” do governo Temer
“É muito engraçado você vir falar do Temer e do impeachment, quando você foi pedir a bênção para o Renan Calheiros, que também apoiou o impeachment”
Marina Silva, em tréplica a Haddad
“Se eu puder governar sem o PT, prefiro”
Ciro Gomes, respondendo se teria alguém do PT em algum ministério de um governo seu
“(É preciso) evitar a insensatez de um candidato que representa o que há de mais atrasado na política brasileira, com uma intolerância num país tão plural”
Geraldo Alckmin, em referência a Jair Bolsonaro (PSL), que continua internado em hospital.
______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________
Terceira via tenta um sprint final
Robson Bonin
27/09/2018
Com a polarização entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) consolidada nas pesquisas eleitorais, o debate promovido ontem marcou o início do sprint final do pelotão intermediário, que ainda tenta demonstrar fôlego para ameaçar o segundo turno entre o antipetismo bolsonarista e o lulismo que rejeita o ex-capitão. Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede) entregaram-se à pancadaria já no primeiro bloco do debate dispostos a desconstruir a polarização e seduzir o eleitorado desiludido com uma possível terceira via.
Na mais recente pesquisa Ibope, divulgada ontem, Bolsonaro segue líder, com 27% das intenções de voto, enquanto Haddad tem 21%. Eles são seguidos à distância por Ciro (12%), Alckmin (8%) e Marina (6%). O levantamento mostra que três em cada dez eleitores admitem deixar de votar no candidato de preferência para votar em outro que tenha condições de evitar que o candidato rejeitado vença a eleição. Foi com esse grupo de eleitores que o trio de presidenciáveis tentou se conectar no debate.
Ciro falou diretamente ao antilulismo, que vota em Bolsonaro para não permitir a volta do PT. Falou também aos antibolsonaristas, que tendem a votar no projeto de poder encarnado por Haddad. O pedetista atacou a “estrutura odienta” de fazer política, criada pelo petismo, que teria gerado a “aberração” Bolsonaro.
Representante dos partidos de centro, Alckmin replicou o discurso empregado na TV em que se apresenta como o único em condições de vencer o PT no segundo turno. O tucano explorou o radicalismo de Bolsonaro e o passado de escândalos de corrupção e grave crise econômica gestada nas administrações petistas.
Já Marina buscou dialogar com o imenso eleitorado feminino, que representa 52% dos eleitores. A exministra tentou desvencilhar-se da figura frágil, mostrando um discurso mais provocativo, quando usou o slogan de Henrique Meirelles para criticar as declarações do vice de Bolsonaro sobre famílias comandadas por mulheres. Quando tem briga numa família, disse Marina, “ninguém chama o Meirelles”, chama uma tia, uma mulher corajosa para colocar ordem na casa e fazer todo mundo conversar.
Com boa parte das falas decoradas pelos candidatos e alguns confrontos previsíveis, o debate serviu de vitrine para a terceira via, mas tornou-se assunto nas redes sociais por um motivo bem menos relevante. As acrobacias de Cabo Daciolo foram citadas internacionalmente no Twitter e terminaram por melhorar o marasmo do evento.