O globo, n. 31098, 28/09/2018. Economia, p. 19

 

CASO ENCERRADO

Henrique Gomes Batista

Bruno Rosa

28/09/2018

 

 

Quatro anos depois da Operação Lava-Jato revelar o escândalo de corrupção na Petrobras, a estatal fechou um acordo com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos e com o órgão regulador do mercado de capitais americano (SEC, na sigla em inglês), que põe fim a todas as investigações. A estatal pagará US$ 853,2 milhões (ou R$ 3,6 bilhões) para encerrar o caso. Para analistas de mercado, o compromisso marca uma virada de página para a estatal, e as ações da petroleira subiram mais de 6% ontem, com isso a companhia voltou a ser a segunda mais valiosa da Bolsa. O Departamento de Justiça dos EUA aceitou o argumento da Petrobras de que ela foi vítima de um esquema fraudulento por parte de sua antiga diretoria.

“Executivos nos mais altos níveis da Petrobras, incluindo membros de sua diretoria e conselho de administração, facilitaram o pagamento de centenas de milhões de dólares em propinas a políticos e partidos brasileiros e depois ocultaram o suborno dos investidores e reguladores”, afirmou, em nota, Brian A. Benczkowski, procuradorgeral assistente da Divisão Criminal do Departamento de Justiça.

80% FICAM NO BRASIL

O acordo abrange casos de corrupção e impactos no mercado de ações entre 2003 e 2012. O objetivo da investigação era apurar se a atuação da empresa violava a Lei de Práticas Corruptas Estrangeiras (FCPA, na sigla em inglês). A decisão foi importante porque era possível chegar à conclusão de que a Petrobras era uma “organização criminosa” e, com isso, banir as atividades da empresa no país. Agora, o acordo serve como um “atestado” de idoneidade da companhia. Como a Petrobras já havia feito acordo com acionistas minoritários, a partir de agora, ela fica integralmente livre para operar nos EUA.

No documento assinado com o Departamento de Justiça, a Petrobras se responsabiliza pelos atos de exexecutivos e diretores que violaram regras legais sobre registros contábeis e controles internos, mas não se declara culpada pelos atos. Isso vale também para a SEC. O acordo inclui ainda o Ministério Público Federal, no Brasil, que participou das investigações.

Na avaliação de Robert Johnson, diretor assistente da Divisão de Investigação Criminal do FBI, o pagamento de US$ 853,2 milhões deve agir “como um impedimento para qualquer um que pretenda cometer esse tipo de fraude no futuro”.

Os termos do acordo preveem que 10% do montante (US$ 85,3 milhões ou R$ 360 milhões) serão destinados ao Departamento de Justiça. O mesmo valor será repassado à SEC. Os 80% restantes (US$ 682,6 milhões ou R$ 2,88 bilhões) serão pagos ao Ministério Público Federal, no Brasil, em termo no qual não há atribuição de culpa ou dolo à empresa. Em comunicado, a Petrobras esclarece que o pagamento no Brasil será usado conforme o previsto no acordo, o que inclui programas sociais e educacionais voltados para a promoção da transparência no setor público. Os pagamentos serão registrados no balanço da companhia do terceiro trimestre.

CONTA DA CORRUPÇÃO

Presente ao encerramento da Rio, Oil & Gas, no Riocentro, o presidente da Petrobras, Ivan Monteiro, destacou que 80% dos recursos do acordo serão destinados ao Brasil. Ele ressaltou que a estatal valia R$ 60 bilhões, em 2015, quando chegou à diretoria da empresa e que, ontem, superou os R$ 300 bilhões.

— Agora, vamos juntos construir o futuro. Não tem mais sofrência. A crise acabou —disse.

A leitura do mercado é que os termos do acordo anunciado ontem foram positivos para a estatal, pois o pagamento é inferior ao de outros termos firmados por empresas brasileiras nos EUA. Odebrecht e Braskem, por exemplo, aceitaram pagar, em dezembro de 2016, US$ 3,5 bilhões em acordos pelos atos de corrupção, no maior acordo da história do governo americano.

Desde que foram revelados os casos de corrupção na Lava-Jato, a Petrobras já conseguiu recuperar R$ 2,5 bilhões desviados. Mas a conta da corrupção foi alta para a companhia. Em 2015, ela fez uma baixa contábil de R$ 6,2 bilhões no balanço em razão dos projetos superfaturados, executados sem compromisso com a melhor alocação de recursos. No começo deste ano, a estatal também registrou nas próprias contas o impacto do ressarcimento de US$ 2,95 bilhões aos seus acionistas minoritários nos EUA, no maior acordo global deste tipo de ação. Desde a Lava-Jato, a Petrobras já fez baixas contábeis motivadas não só por corrupção como pela revisão de projetos que somam R$ 50,8 bilhões.

“Não tem mais sofrência. A crise acabou”

Ivan Monteiro, presidente da Petrobras

“Executivos facilitaram o pagamento de centenas de milhões de dólares em propina a políticos e partidos brasileiros”

Brian Benczkowski, procurador geral assistente do Departamento de Justiça

OPINIÃO DO GLOBO - PARA ILUSTRAR

À MARGEM do volumoso e crescente noticiário sobre as eleições, chega a informação de que a Petrobras pagará US$ 853 milhões de multa para encerrar investigações do Departamento de Justiça dos Estados Unidos abertas a partir do desmantelamento do esquema de corrupção montado na empresa e descoberto pela Lava-Jato.

NO INÍCIO do ano, a Petrobras já desembolsara US$ 2,9 bilhões para acabar com uma ação coletiva de investidores americanos contra ela, instaurada pelo mesmo motivo. A coincidência com a campanha é ilustrativa, porque os bilhões gastos pela estatal para encerrar processos são mais um sólido atestado de que o lulopetismo atuou mesmo criminosamente dentro da empresa, um dos temas abordados na campanha.