Correio braziliense, n. 20191, 01/09/2018. Política, p. 2/3

 

PT terá 10 dias para substituir Lula

Paulo Silva Pinto

01/09/2018

 

 

Depois de mais de 10 horas de sessão, TSE decide que ex-presidente está fora da eleição , da propaganda eleitoral e da urna eletrônica. Partido pode escolher novo nome até 10 de setembro. Defesa vai recorrer ao Supremo Tribunal Federal

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não poderá receber votos no mês que vem, quando os brasileiros vão às urnas para escolher o novo ocupante do Palácio do Planalto, decidiu a maioria dos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em sessão extraordinária que terminou já na madrugada de hoje, depois de 10 horas e 20 minutos.

A coligação que reúne PT e PCdoB poderá escolher um novo nome para encabeçar a chapa nos próximos 10 dias. Mas, quanto maior o tempo que usar esse prazo, maior será o prejuízo eleitoral devido a outra decisão do TSE. A coligação poderia ficar fora da propaganda no horário gratuito, que começou ontem para os candidatos a governador e se inicia hoje para os que se candidatam à Presidência — a exclusão de Lula da propaganda era certa, mas, até o fechamento desta edição, o tribunal não havia decidido se a chapa também ficaria de fora. A decisão não está livre de controvérsia. O advogado Luís Fernando Casagrande, da defesa de Lula, disse entender que o partido continuaria com direito à propaganda política nos próximos dias.

A decisão do TSE de anular a candidatura de Lula foi baseada na Lei da Ficha Limpa, sancionada por ele mesmo quando era chefe do Executivo. O texto determina a inelegibilidade de quem é condenado por pelo menos um tribunal colegiado. É o caso de Lula, com sentença de 12 anos e um mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, o que foi confirmado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre.

“A Lei da Ficha Limpa foi resultado de mobilização popular de demanda por patriotismo”, destacou, em seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso, relator dos vários pedidos de impugnação da candidatura de Lula. “Não estamos julgando sua culpabilidade ou seu legado político. Quem poderá fazer isso ainda é o STJ (Superior Tribunal de Justiça) ou o STF (Supremo Tribunal Federal)”, disse.

Na tentativa de manter a validade da candidatura de Lula, a defesa baseou-se em decisão liminar do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), de 17 de agosto (Leia matéria ao lado). O órgão decidiu provisoriamente que Lula deve ter assegurado o direito de concorrer à Presidência. Barroso, porém, argumentou que a decisão não tem força de lei no Brasil. E que, mesmo que seja considerada improcedente mais tarde, já terá causado um dano irreparável ao país. O julgamento do mérito da questão pelo órgão internacional ocorrerá apenas no próximo ano.

O ministro Edson Fachin divergiu de Barroso, com base na decisão do Comitê da ONU. Disse que considera Lula enquadrado na Ficha Limpa, portanto, impedido de concorrer, mas ressalvou que a decisão do órgão internacional se sobrepõe. Votaram com Barroso os ministros Og Fernandes, Jorge Mussi, Admar Gonzaga, Tarcísio Vieira e a presidente da Corte, Rosa Weber. Ela destacou que o comitê que deu a liminar a Lula é um órgão que está em segundo nível na hierarquia da ONU, os chamados órgãos de tratados. “Essa controvérsia nada tem a ver com a Corte Internacional de Justiça da ONU”, ressaltou.

“Algoz do partido”
Para Luís Fernando Casagrande, da defesa do ex-presidente, o voto de Fachin “muda o caso de Lula de patamar”. “Muitos petistas acusam Fachin de ser um algoz do partido. Eu nunca achei isso. Pode não dar a vitória ao Lula, mas retira o discurso de que o que nós apresentamos era uma artimanha para ganhar tempo”. Ele pretende recorrer ao STF para modificar a decisão de ontem. A Comissão Executiva Nacional do PT confirmou, em nota, que continuará lutando na Justiça para manter a candidatura do ex-presidente.

Casagrande tentou, no início da sessão, adiar a decisão do TSE. Disse na tribuna, antes de Barroso apresentar o voto que, como não houve espaço para os adversários de Lula se pronunciarem sobre os argumentos da defesa, o julgamento poderia ser cancelado, caso o ex-presidente viesse a vencer: “É a crônica de uma morte anunciada”. Barroso negou isso em seu voto: “Todas a posições são conhecidas”. Ainda durante a sustentação oral, o advogado deixou clara a intenção de recurso. E destacou que 146 candidatos puderam concorrer a prefeito nas eleições de 2016, mesmo com registro de candidatura indeferido.

Caso a coligação opte pela troca de nomes, a tendência é de que registre como candidato a presidente o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, que atualmente consta como vice de Lula. No lugar de Haddad ficaria a deputada estadual gaúcha Manuela D’Ávila, do PCdoB. Há no PT, porém, quem queira recorrer da decisão do TSE, mantendo o ex-presidente como candidato até o dia pleito. O risco de o partido não participar da eleição, embora Lula lidere as pesquisas de intenção de voto, não é ignorado. Os petistas que defendem essa opção argumentam que ou seu líder máximo participa da disputa ou, então, é melhor declarar que ela é ilegítima.

Análise da notícia

O caldo do discurso petista engrossou

» LEONARDO CAVALCANTI

O voto do ministro Edson Fachin, mesmo sem interferir no resultado do julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), engrossa o caldo do discurso de vitimização dos petistas. A derrota para o partido na Corte foi apenas um detalhe. A questão é outra.

Nos bastidores, o PT já dava como perdida a manutenção da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva. O pronunciamento do Comitê de Direitos Humanos da ONU deu certo fôlego para a legenda criar uma confusãozinha no Supremo Tribunal Federal (STF).

O PT sabia que não iria longe — e o plano, desde a prisão de Lula em abril passado, sempre foi colocar o ex-prefeito Fernando Haddad na cabeça de chapa. O que muda, agora, é que o relator da Lava-Jato deu um voto favorável ao PT — na guerra eleitoral, ninguém esperava algo tão favorável ao partido.

Os próximos passos

As consequências da decisão
» Lula está impedido de concorrer
» Proibido de fazer campanha
» PT deve trocar de candidato
» Confirmada inelegibilidade do ex-presidente por 8 anos
» Afastada recomendação do Comitê da ONU
» Nome do petista deve ser retirado da urna

Recursos possíveis da defesa
» Embargos de declaração (TSE)
» Recurso extraordinário (STF)

Etapas e regras
» TSE notifica o partido da impugnação
» PT tem 10 dias para apontar novo candidato
» Escolha deve seguir estatuto partidário

17 de setembro
» Último dia para a troca de candidatos (todos os partidos)

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Decisão da ONU foi base da defesa

01/09/2018

 

 

A defesa de Lula usou decisão provisória do Comitê de Defesa da Organização das Nações Unidas (ONU), em 17 de agosto, a favor do ex-presidente, na qual se determina que ele tenha direito de concorrer à Presidência. Uma das responsáveis pela impugnação, a advogada Marilda Silveira, do partido Novo, primeira a falar, argumentou que a manifestação do órgão internacional não suspende a inelegibilidade de Lula. “O próprio Comitê de Direitos Humanos da ONU reconhece que tem competência opinativa. O que propõe é que se avalie o caso para que a violação dos direitos humanos não ocorra. É o que estamos fazendo aqui”.

A procuradora-geral eleitoral, Raquel Dodge, que pediu o impedimento da candidatura de Lula, afirmou que a decisão do Comitê de Direitos Humanos não tem validade porque não foi ratificada por decreto presidencial. Além disso, sustentou que os direitos humanos são importantes também na eleição e que o tema guiou a aprovação da Lei da Ficha Limpa. “Corrupção mata”, afirmou, citando uma frase que, como ela ressaltou, é usada com frequência por integrantes da própria ONU.

Para a advogada de Lula Maria Cláudia Bucchianeri, o governo brasileiro se manifestou em várias situações em que as decisões do Comitê de Direitos Humanos têm, sim, validade no Brasil. “Seria irônico, para não dizer trágico, que o Judiciário, cuja função precípua é defender os direitos humanos, viesse a desdizer o que o próprio Estado brasileiro reconhece”, afirmou na tribuna. Ela citou juristas e decisões do STF que, no seu entender, referendam o reconhecimento de tratados internacionais sem a necessidade de decreto presidencial.

Barroso, em seu voto, alinhou-se a Dodge, destacando que a falta de decreto presidencial invalida as decisões do Comitê. E acrescentou que, mesmo que fossem válidas, as decisões não teriam de ser cumpridas obrigatoriamente. “Comitê é órgão administrativo, sem competência jurisdicional, suas recomendações, mesmo quando definitivas não têm efeito vinculante”, explicou. Ele ressaltou também que a decisão foi tomada em caráter provisório, por apenas 2 dos 18 integrantes do Comitê. A decisão final ficou para o próximo ano, quando os “fatos já estarão consumados e serão de difícil e traumática reversão.” Diante disso, destacou Barroso, não é possível fazer o que o órgão da ONU sugere. “O não cumprimento é justificável diante do abalo que poderia causar no Brasil.” (PSP)

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Decisão mobiliza cenário político

Renato Souza

01/09/2018

 


O foco em campanhas próprias, seja em nível estadual, seja nacional, não impediu que o setor político parasse para acompanhar o julgamento do registro eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Líder nas pesquisas de intenções de votos, a estratégia dele e do Partido dos Trabalhadores sempre foi vista como ponto-chave para o resultado do pleito deste ano. Ao longo do dia, diversos políticos se manifestaram em eventos de campanha e pelas redes sociais.

Em campanha pelo Rio Grande do Sul, o candidato do PDT à Presidência, Ciro Gomes, chamou a estratégia do PT de fraude. “A rigor, minha vontade é dizer que não tenho nada com isso, porque o PT tomou essa atitude. A burocracia e a cúpula do PT tomaram essa atitude e, na prática, é uma fraude”. Ciro completou dizendo que o fato de o partido levar o caso até os últimos atos na Justiça Eleitoral “é para manipular um justo sentimento da nação brasileira que tem pelo Lula carinho e gratidão”. Ele evitou dizer se poderia herdar os votos do petista.

O candidato do Podemos, Alvaro Dias, também se disse contra a estratégia jurídica do PT. Nas últimas semanas, ele ganhou notoriedade em debates e na internet por lançar críticas à candidatura do ex-presidente. “Essa encenação é afrontosa à população brasileira”, afirmou. As opiniões dos políticos se repetiram entre os eleitores. Na rede social Twitter, a maioria das hastags girou em torno do julgamento. Ao longo do dia, internautas contra e a favor à candidatura do petista travaram uma batalha por meio de mensagens e fizeram com que o assunto fosse parar nos temas de repercussão global.

Críticas petistas
A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, acompanhou cada minuto do julgamento. Além de criticar o voto dos ministros contrários à candidatura do ex-presidente, ela atacou a atuação do Ministério Público. “O MP Eleitoral agiu diferente nos casos de Lula, Alckmin e Bolsonaro. Lula foi impugnado em menos de uma hora. Teve quatro pareceres no processo, um pedido de julgamento antecipado. Alckmin teve uma manifestação 11 dias depois da impugnação. Com Bolsonaro, só falaram após a defesa”, afirmou ela, se referindo ao voto do ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso.

“A burocracia e a cúpula do PT tomaram essa atitude e, na prática, é uma fraude”
Ciro Gomes, candidato do PDT à Presidência da República

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Mais duas chapas são aprovadas

01/09/2018

 

 

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou, por unanimidade, o registro da candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência da República. Os sete magistrados da Corte se posicionaram contra a impugnação da chapa formada também por PP, PR, DEM, Solidariedade, PRB — o chamado Centrão —, além de PTB, PSD e PPS. A contestação havia sido feita pela campanha do candidato do MDB, Henrique Meirelles, e sua coligação, formada por MDB e PHS.

Meirelles questionou as atas entregues pelos partidos que integram a coligação de apoio ao adversário tucano, com a argumentação de que a formação da chapa não estava explícita nos documentos. Com isso, o MDB pediu que o TSE mantivesse na chapa tucana apenas PSD e PPS, além do PP, partido de sua vice, a senadora Ana Amélia (RS), para que o resultado do julgamento não “rachasse” a coligação de Alckmin. Se o pedido de impugnação fosse aceito pelo TSE, a campanha do PSDB poderia perder 36% do seu tempo de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV.

Em sua manifestação, a procuradora-geral eleitoral, Raquel Dodge, se posicionou contra a impugnação. Na avaliação de Dodge, não há irregularidades na formação da coligação. A manifestação de Raquel atendeu intimação do ministro-relator Tarcisio Vieira. Em seu voto, Vieira defendeu não haver “legitimidade” do MDB para impugnar a candidatura adversária, “salvo quando se tratar de fraude com impacto na lisura do pleito”. Segundo ele, não há regra explícita sobre como as legendas devem preencher as atas na formalização das coligações. Na sessão, também foi aprovado o registro da candidatura de José Maria Eymael, candidato à Presidência pela Democracia Cristã.

Bolsonaro
Em parecer enviado ao TSE, o Ministério Público Eleitoral manifestou-se favoravelmente à candidatura de Jair Bolsonaro (PSL-RJ) à Presidência da República. O registro de candidatura do deputado federal havia sido questionado por um advogado, que informou que o candidato responde a duas ações penais no Supremo Tribunal Federal. Assinado pelo vice-procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, o parecer afirma que, apesar de a Lei da Ficha Limpa ter aumentado o rol de crimes geradores de inelegibilidade, “não se chegou ao ponto de a inelegibilidade ser causada desde o início da ação penal”.