Título: Reação em cadeia
Autor: de Luna, Thais
Fonte: Correio Braziliense, 30/05/2012, Mundo, p. 16

Pela primeira vez desde que a revolução começou na Síria, há 14 meses, importantes nações do Ocidente tomaram medidas mais duras, em represália aos massacres que ocorrem no país. A carnificina em Houla — que vitimou 59 adultos e 49 crianças, na madrugada de sábado — culminou ontem com a decisão de diversos países, como Estados Unidos, França e Reino Unido, de expulsarem diplomatas sírios de seu território.

O presidente francês, François Hollande, chegou a divulgar que mais sanções serão anunciadas. Sem a mobilização das outras potências, a Rússia pediu uma “investigação objetiva e imparcial” liderada pelas Nações Unidas. Todas as iniciativas ocorreram no dia em que o ditador Bashar Al-Assad recebeu o mediador da ONU e da Liga Árabe, Kofi Annan. Durante o encontro, o líder sírio condicionou o plano de paz ao “fim do terrorismo”.

Os EUA expulsaram o encarregado de negócios Zuheir Jabbour, maior representante da Síria em Washington. “Nós tomamos esta decisão em coordenação com as nações parceiras Austrália, Canadá, Espanha, Reino Unido, Itália, França e Alemanha”, explicou a porta-voz da diplomacia norte-americana, Victoria Nuland. O assessor de imprensa da Casa Branca, Jay Carney, disse que uma ação militar dos EUA contra a Síria “é sempre uma opção”. Hollande também considera a possibilidade de intervenção armada, “com a condição de que seja feita respeitando o direito internacional, ou seja, após deliberação do Conselho de Segurança das Nações Unidas”.

Semana decisiva

Ruben Safrastyan, diretor do Instituto de Estudos do Oriente da Academia Nacional Armênia de Ciências, não crê que o Conselho de Segurança interfira, a curto prazo, no governo da Síria “por causa da posição negativa de tais membros permanentes, como a Rússia e a China”. “Eles vão bloquear qualquer resolução do tipo”, opina, em entrevista ao Correio. Suíça, Holanda e Bulgária tomaram decisão semelhante às potências, enquanto a Bélgica convocou o embaixador sírio para uma conversa. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, comentou que, ao menos por enquanto, o Brasil não pretende expulsar diplomatas sírios, apesar de repudiar os bombardeios em Houla.

As medidas mais duras instituídas pelas nações ocidentais agradaram aos opositores (leia a entrevista abaixo), que reiteraram seus pedidos de que a comunidade internacional use “a força necessária” contra o regime de Al-Assad. Enquanto não se conhece a autoria da tragédia em Houla, Moscou exigiu que a missão de observadores no país do Oriente Médio investigue os crimes. O chanceler russo, Serguei Lavrov, conversou por telefone com Annan e defendeu a “necessidade imediata de que todas as partes renunciem à violência”. Lavrov reafirmou o apoio ao plano de paz do emissário.

As primeiras conclusões de uma investigação realizada pela ONU são de que a maioria das vítimas foi executada, em Houla (leia o depoimento nesta página). “Acreditamos que menos de 20 dos 108 assassinatos podem ter sido provocados por disparos de artilharia e tanques”, salientou Rupert Colville, porta-voz do Alto Comissariado para os Direitos Humanos. “A maior parte foi executada de forma sumária em dois incidentes cometidos, segundo os moradores, por milicianos favoráveis ao regime, os shabiha.” Para Safrastyan, a semana será decisiva. “Essa deve ser a última chance que o conselho dará para Al-Assad. Apenas após seu possível fracasso para impedir a violência, a Rússia estará pronta para discutir um plano de transição. A meu ver, a única forma de evitar uma guerra civil”, declarou.

Cobrança

Kofi Annan pediu para que Al-Assad tome “medidas enérgicas” a fim de pôr fim à violência. “Preciso que ele aja agora e que as outras partes façam a parte do trabalho que lhes corresponde”, afirmou Annan. “Pedi que tomasse medidas audazes agora — não amanhã, agora — para criar as condições necessárias para pôr em andamento o plano de paz”, acrescentou o representante da Liga Árabe. “O governo e todas as milícias que o apoiam devem cessar as operações militares.”

Al-Assad, por sua vez, afirmou que o êxito do projeto de seis pontos, que visa o cessar-fogo e a liberdade de manifestações, depende do fim do terrorismo e do contrabando de armas. “Os grupos terroristas armados intensificaram claramente suas operações em diferentes regiões, e mataram e sequestraram civis”, declarou Al-Assad. Ontem, 98 pessoas teriam morrido em diversas partes do país, segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos. Desde o início dos confrontos, em março de 2011, 13 mil sírios foram mortos.

Se não implementarmos o plano de paz, que Deus possa nos ajudar” Kofi Annan, emissário especial da ONU e da Liga Árabe a Damasco]]>