Título: Britto evita polemizar
Autor: Braga, Juliana
Fonte: Correio Braziliense, 31/05/2012, Política, p. 12

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Carlos Ayres Britto, saiu em defesa do Judiciário ao afirmar que o poder é “imune” a pressões externas. Evitando polemizar sobre o recente episódio no qual o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria pressionado o ministro do STF Gilmar Mendes a ajudar num possível adiamento do julgamento do mensalão, Britto adotou tom ameno e disse que o fato não tem potencial para manchar a imagem da Corte.

“O Judiciário está imune a esses dissensos. Tenho dito reiteradamente que somos experimentados em enfrentamento de situações de toda ordem. Isso não nos tira do eixo. Não perdemos o foco, que é o nosso dever de julgar todo e qualquer processo, inclusive esse chamado de mensalão, com objetividade, imparcialidade, serenidade, enfim, atentos às provas dos autos”, destacou Britto, em entrevista antes da sessão plenária de ontem.

Ayres Britto visitou Gilmar Mendes na noite de terça-feira. Ele disse não ter recebido do colega nenhum pedido para se manifestar publicamente em nome do STF. “Não combinei a visita. Saí da OAB por volta das 20h30 (onde participou de um evento) e liguei para ele, dizendo: ‘Vou tomar um café aí’ (na sua casa). Não fui lá para me solidarizar nem para recriminar. Simplesmente trocamos ideias”, relatou Britto. O ministro acrescentou que Gilmar “estava razoavelmente bem”, e que não lhe pediu “absolutamente nada”. “Ninguém tomou essa iniciativa (de fazer uma moção em apoio a Gilmar), porque não há gravidade para isso”.

Em relação às declarações feitas à imprensa por Gilmar Mendes, de que Lula comandaria uma central de boatos para difamar o tribunal, Britto se esquivou. “Não me cabe opinar sobre isso. O ministro Gilmar vê as coisas por esse prisma. Certamente, ele tomará as providências compatíveis com o quadro que ele mesmo traçou”, frisou. Ontem, Gilmar Mendes encaminhou ao Congresso documentos que comprovariam que ele não voou em aeronave cedida por Carlinhos Cachoeira no ano passado.

Antes de se encontrar com Mendes, Britto se reuniu na terça-feira com a presidente Dilma Rousseff para tratar de assuntos administrativos dos poderes Judiciário e Executivo. Ele negou, em nota, que tenha tratado sobre mensalão com Dilma. O Palácio do Planalto também divulgou nota negando que o assunto tenha sido discutido e, ainda, desqualificou as informações de que a presidente teria alertado para o risco de uma crise institucional.

Julgamento O presidente do STF avalia como necessária a marcação do início do julgamento do mensalão para evitar novos desgastes ao Supremo. “Estamos tentando definir uma data para que a formatação do julgamento se faça de uma vez por todas e, naturalmente, por modo adaptado às possibilidades do próprio relator, do ponto de vista físico do ministro Joaquim”, disse Britto, referindo-se ao problema crônico que Joaquim Barbosa tem no quadril, o que o impede de permanecer por muito tempo em plenário. “A proposta será aquela mais conveniente para o estado de saúde do relator”, completou.

De acordo com Ayres Britto, a data do julgamento só será marcada “depois que o ministro revisor, Ricardo Lewandowski, disponibilizar o processo para a pauta de julgamentos”. Enquanto isso, segundo ele, “estamos tratando da logística do processo”.

Na semana passada, o Supremo definiu que três sessões semanais serão destinadas ao julgamento do mensalão, às segundas, quartas e quintas-feiras à tarde, com a possibilidade de se estender à noite. Lewandowski deve entregar o voto até o fim de junho, o que levaria o julgamento a ser realizado em agosto, já que julho é reservado ao recesso do Judiciário. Britto convocará, na semana que vem, uma reunião administrativa para que os ministros “batam o martelo sobre” o cronograma do mensalão.

“Camomila”

O presidente da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), sugeriu ao ministro Gilmar Mendes e ao ex-presidente Lula que bebam “chá de camomila” para arrefecer os ânimos. “Neste momento, o importante é que se passe uma borracha nesse episódio, que não vai trazer problema para o Brasil. Temos que dar um chá de camomila a todos os envolvidos, principalmente neste momento em que se aproxima a votação no STF”, afirmou. Ainda ontem, o PSol protocolou representação na Procuradoria-Geral da República contra Mendes. O partido questiona a conduta do ministro em relação às acusações a Lula.

ONGs pedem agilidade

Representantes de ONGs protocolaram ontem, no STF, documento que reúne 37 mil assinaturas em favor do julgamento imediato do mensalão. O abaixo-assinado, organizado em conjunto pelas entidades Transparência Brasil e Contas Abertas, em parceria com os movimentos 31 de Julho e Queremos Ética na Política, reúne 11 mil assinaturas presenciais. O restante foi colhido na internet ao longo dos últimos dois meses. O grupo tentou entregar o documento ao ministro Gilmar Mendes, que preferiu não pegar a papelada. “Isso não é uma pressão contra o Supremo, mas um apoio. A nossa intenção é fortalecer os poderes”, disse Ana Luiza Archer, integrante do movimento 31 de Julho. “Queremos rapidez, pois há o risco de prescrição e ainda teremos a aposentadoria de dois ministros este ano”, completou Gil Castello Branco, do Contas Abertas.