Título: Auxílio na busca de pessoas
Autor: Mariz, Renata; Castro, Grazielle
Fonte: Correio Braziliense, 02/06/2012, Brasil, p. 10

Com dois anos e meio de atraso, a lei que cria o Cadastro Nacional de Crianças Desaparecidas finalmente vai sair do papel. Depois de uma tentativa fracassada, a Secretaria de Direitos Humanos (SDH), vinculada à Presidência da República, colocará no ar, em breve, a página em que pais, demais responsáveis e autoridades deverão incluir dados e foto do desaparecido. Segundo a secretaria, só depende de ajustes finais a definição da data de apresentação do site. Entre as novidades, estão um programa de computador capaz de envelhecer a imagem de um menino ou menina perdido há muito tempo e um formulário para parentes deixarem registrada a vontade de doar material genético a um banco de DNA. Esse recurso pode ser importante para agilizar testes de identificação de crianças encontradas em outros estados e até fora do Brasil. Além disso, o conselho tutelar mais próximo será acionado para visitar a casa do desaparecido.

“Sabemos que boa parte dos desaparecimentos, algo em torno de 75%, é na verdade fuga. E essas fugas acabam se repetindo, muitas vezes por problema de agressão, maus-tratos, violência doméstica ou sexual. Por isso, queremos que o conselho tutelar visite essas famílias para verificar se há problemas”, afirma Carmen Silveira de Oliveira, secretária nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente da SDH. Segundo ela, somente com o cadastro em funcionamento será possível saber exatamente o tamanho dessa tragédia social. Organizações não governamentais e setores do governo trabalham com uma estimativa de 40 mil crianças e adolescentes desaparecidos no Brasil por ano. Desse total, cerca de 80% são encontrados.

Um exemplo de adolescente que ainda não foi localizado é Beatriz Nery da Silva, desaparecida aos 16 anos, em janeiro de 2010. A mãe dela, Gildene Nery de Jesus, 36, conta que a filha foi vista pela última vez na avenida principal do Paranoá, onde a família mora. “A última pessoa que a viu disse que ela estava indo ao mercado. Mas ela nunca mais voltou. Fizemos tudo que poderíamos ter feito, mas até hoje nada”, lamenta. Para o diretor do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), João Batista de Oliveira Cândido, a partir do momento em que o novo cadastro nacionalizar os casos, ele pode ser mais uma ferramenta efetiva para que famílias, como a de Gildene, encontrem seus entes.

Segundo o advogado, um dos possíveis obstáculos para o sucesso do cadastro é a associação dele ao Conselho Tutelar. “Geralmente as pessoas fazem a ligação com medidas punitivas e isso faz com que elas fiquem com o pé atrás. O uso desse tipo de ferramenta é sempre uma incógnita. As pessoas geralmente não sabem do papel importantíssimo que o Conselho tem com as medidas protetivas”, destacou.

Tentativa frustrada

A secretária nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente reconhece que a página colocada anteriormente no ar pela SDH não atendia às necessidades das famílias nem o objetivo da lei que criou o cadastro nacional. “Era bem ruim, difícil de ser manuseada e sem muitos recursos. Demoramos um pouco para poder implantar um bom serviço, que seja ágil”, destaca Carmen Oliveira. Embora as considere pouco úteis, a secretária, mesmo com o novo sistema, não irá descartar as atuais formas de divulgação de crianças desaparecidas, por meio de fotos em contas de luz e água. “Quando a conta chega na casa da pessoa, a criança está há dias desaparecida.”

Mito das 24 horas

Uma preocupação de autoridades e grupos da sociedade civil que atuam no tema de crianças e adolescentes desaparecidos é derrubar o mito das 24 horas. “As famílias devem registrar a ocorrência o mais breve possível. Imediatamente, porque as chances de localização aumentam muito”, afirma Rogério Borges Cunha, delegado adjunto da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente do Distrito Federal. Ele ressalta que qualquer unidade policial, e não apenas as especializadas, pode registrar a ocorrência e investigar o caso. “Não é uma atribuição privativa nossa. As autoridades trabalham juntas.”

Banco poderá ser decisivo

Especialistas são unânimes em apontar a importância do banco de DNA, especialmente para casos em que o desaparecimento ocorreu há décadas. “Pode ser decisivo”, afirma o delegado adjunto da Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente do Distrito Federal, Rogério Borges Cunha. Em 2012, das 369 crianças e adolescentes desaparecidos na capital, 226 (ou 60%) foram localizados.

Para Cunha, a implantação dos bancos de DNA de familiares de desaparecidos é “perfeitamente possível”. “Já existe o laboratório de material genético na Polícia Civil do DF, seria mais um serviço a ser oferecido”, afirma. Em outros estados, com menos estrutura, será preciso investir mais, avalia o diretor do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), João Batista de Oliveira Cândido. “Sabemos que existe um atraso na polícia, provavelmente os estados com mais recursos se adiantarão. Porém, se todos conseguirem se adaptar, esse será o grande diferencial”.

Evite o desaparecimento

» 1. Em passeios, não tire os olhos da criança e mantenha-se de mãos dadas com ela;

» 2. A criança deve ser orientada a não se afastar de quem o acompanha, pois correrá riscos;

» 3. Em local de multidão, quando não for possível evitá-lo, vista-se com roupas de cores fortes, fáceis de serem vistas, fazendo o mesmo com as crianças. Preste atenção em como elas estão vestidas. Deixe com a criança um papel com seu nome e contato. Mantenha consigo foto recente da criança para que, numa necessidade, possa ser mostrada a terceiros que ajudem na localização. Não deixe nunca de combinar um ponto de encontro no caso de desencontros;

» 4. A criança deve ser orientada a procurar alguma pessoa para ajudá-la, preferencialmente policiais uniformizados ou seguranças, também uniformizados, do local;

» 5. A criança deve ser ensinada a fazer ligações telefônicas para os pais ou responsáveis, e estimulada a memorizar o seu nome, o dos pais, o nome da escola e telefone da família;

» 6. Pessoas estranhas? Cuidado! Jamais deixe crianças com elas, ainda que por pouco tempo;

» 7. Para garantir a segurança da criança, a pessoa responsável por deixá-la na escola deve se atentar que só poderá sair depois que tiver a certeza de que aquela entrou nas dependências do colégio e está em lugar seguro;

» 8. Ao contratar qualquer empregado ou serviço, não deixe de consultar uma delegacia de polícia sobre os dados do contratado.