Título: Regras para repasse de verba
Autor: Paganini, Arthur; Tahan, Lilian
Fonte: Correio Braziliense, 02/06/2012, Política, p. 28

A recente Operação Hofini, da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), evidenciou um problema que, agora, o GDF pretende reparar: a brecha na legislação que permitia repasses de recursos públicos a entidades religiosas. Uma lei julgada parcialmente inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT) em 2010, que dispunha sobre a concessão de subvenção social, serviu de sustentação para que recursos públicos escorressem durante anos pelos ralos das instituições investigadas. Agora, o GDF quer aproveitar a repercussão causada pela prisão de Brunelli (leia Cronologia) para que a Câmara Legislativa analise, em regime de urgência, projeto de lei de autoria do próprio Executivo que visa definir essas normas de colaborações a entidades religiosas.

O Projeto de Lei nº 906/2012 prevê regras para as colaborações que o Poder Público é autorizado a prestar a eventos culturais ou sociais promovidos por entidades religiosas situadas no Distrito Federal. Pela proposta, essa assistência pode ser concedida por meio de repasses de recursos públicos mediante convênio ou por meio do fornecimento de bens ou prestação de serviços, diretamente ou por empresa contratada por licitação. Na atual legislação, é possível, por exemplo, que entidades ligadas a igrejas recebam transferências de subvenções sociais para arcar com despesas de custeio dos eventos realizados. Foi por meio dessa medida que três entidades ligadas a Brunelli receberam, entre 2005 e 2009, pelo menos R$ 4,5 milhões. Com a nova lei, a transferência de recursos a título de subvenção para o custeio de eventos religiosos fica proibida.

O secretário de Transparência do GDF, Carlos Higino de Alencar, acredita que, desta forma, haverá uma redução na possibilidade de desvio de dinheiro, uma vez que as regras de aplicação dos recursos estarão definidas. Ele diz também que as suspeitas que recaem sobre as transferências às entidades religiosas ligadas a Brunelli devem chamar a atenção dos distritais para a importância do debate e da aprovação do projeto em regime de urgência. “Há algum tempo nós já estávamos pensando um projeto para trazer esse tema à legalidade. Fizemos o debate com vários setores da comunidade religiosa e acreditamos que a proposta será favorável ao interesse público”, afirma.

Detalhamento

A proposta encaminhada pelo Executivo aos distritais também detalha de que forma as colaborações às festividades religiosas podem ser oferecidas pelo governo. O Poder Público fica obrigado a organizar o trânsito e a segurança das imediações do evento; fornecer infraestrutura, suporte e equipamentos para a prestação de serviços artísticos e culturais, e também alimento e acomodação aos participantes da celebração. A realização também fica condicionada à anuência da Secretaria de Transparência e Controle, que, pela proposta, deve ser notificada com cinco dias úteis de antecedência da data do evento.

O relator da matéria na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Legislativa é o distrital Joe Valle (PSB). Ontem, foi aprovado parecer pela admissibilidade do projeto. O projeto também deverá ser analisado pela Comissão de Economia, Orçamento e Finanças (CEOF), antes de ser levado a plenário.

Principais pontos da proposta

» Quando houver eventos religiosos promovidos por igrejas, o GDF fica obrigado a organizar o trânsito e a segurança das imediações, fornecer infraestrutura, suporte e equipamentos para a prestação de serviços artísticos e culturais e também fornecer alimento e acomodação aos participantes da celebração.

» Essas obrigações podem ser assumidas pelo governo por meio de fornecimento de bens ou prestação de serviços — diretamente ou por empresa contratada mediante licitação ou por repasse, mediante convênio, de recursos públicos.

» Na colaboração às entidades religiosas, o Poder Público fica proibido de repassar recursos a título de subvenção social, como era permitido. Além disso, o governo também fica desautorizado a assumir qualquer obrigação para viabilizar o custeio de despesas de manutenção, aquisição ou reparo de bens, além de construção ou reforma de prédio no âmbito de celebrações religiosas. Apenas o custeio de despesas de conservação, reparo e reformas de bens do patrimônio público poderá receber recursos do governo.

» Promover ou, de qualquer forma, fazer publicidade de eventos religiosos também fica vedado ao governo. O fornecimento de vestuário, brindes ou quaisquer bens para distribuição gratuita ou venda também são proibidos ao governo

» O uso de local aberto ao público para a realização de evento artístico ou cultural promovido por instituição religiosa não necessita de autorização do governo. A instituição deve apenas avisar ao órgão ou entidade competente com antecedência mínima de cinco dias úteis.

» Para que a instituição religiosa requeira o fornecimento de bens ou a prestação de serviços do governo, é necessário a comprovação do interesse público envolvido no evento promovido, além do compromisso de devolver o bem nas mesmas condições em que foram recebidos.

"Há algum tempo nós já estávamos pensando um projeto para trazer esse tema à legalidade. Fizemos o debate com vários setores da comunidade religiosa e acreditamos que a proposta será favorável ao interesse público” Carlos Higino, secretário de Transparência do DF