O globo, n. 31095, 25/09/2018. País, p. 6

 

Para tucanos, Doria trai campanha de Alckmin

Daniel Biasetto

25/09/2018

 

 

Em grupo de WhatsApp, correligionários do ex-prefeito de São Paulo e candidato ao governo dizem que ele está envolvido em articulações a favor do presidenciável Jair Bolsonaro e sequer cita o colega do PSDB em cartazes

Polêmica entre os tucanos, a participação do ex-prefeito João Doria na campanha presidencial de Geraldo Alckmin movimentou neste fim de semana o principal grupo de conversas que o PSDB usa para traçar estratégias de olho numa vaga no segundo turno. Na lista de WhatsApp, intitulada “Movimento Social Democracia”, que inclui o coordenador do plano de governo de Alckmin, Luiz Felipe D’Ávila, e o ex-governador e ex-presidente da legenda Alberto Goldman, o assunto era um só: a aproximação de Doria com pessoas ligadas ao candidato Jair Bolsonaro (PSL) e a consequente queda na popularidade de Alckmin na capital e no estado.

A discussão veio à tona por causa do lançamento de um cartaz de campanha de Doria ao governo com o título “Contagem Regressiva. Faltam 15 dias para você mudar São Paulo”. Numa das mensagens, Alberto Goldman critica a omissão a qualquer “referência ao candidato a presidente, nem ao partido, depois de 24 anos de nossos governos”. Goldman, que é desafeto declarado do ex-prefeito, diz, durante a discussão do grupo, que “não se poderia mesmo esperar dele (Doria) nada nem partidária nem eticamente aceitável”. E finaliza: “É a expressão do seu caráter”.

Em outro trecho da conversa, uma das assessoras do coordenador de campanha de Alckmin, Denise Zuanazzi, também manifesta a indignação com a aproximação e até reuniões de Doria com apadrinhados políticos dele ligados a Bolsonaro e que fazem campanha de dentro do PSDB para o rival político. A ela se junta, também no grupo, a coordenadora de política de drogas da Secretaria de Desenvolvimento Social de São Paulo, Gleuda Apolinário.

Em nota, a campanha de Doria negou conexão com Bolsonaro e afirmou que o candidato dele é Alckmin.

Em campanha no Rio, o presidenciável tucano disse que, se alguém deve ser questionado sobre uma aproximação entre Doria e Bolsonaro, essa pessoa teria que ser o próprio candidato ao governo de São Paulo:

— Não sei se é verdade. Se for, você deve perguntar a ele (Doria), não a mim.

“Abalou Geraldo”

Procurado, Goldman não poupou críticas a Doria, a quem acusa de ser “irmão siamês” de Bolsonaro:

— Temos ouvido, sim, conversas de que ele tem feito movimentos em direção ao apoio de outro candidato. Doria não tem nada a ver com o partido. Sua postura ideológica é a mesma do Bolsonaro.

Goldman ainda falou do ressentimento do partido por causa da falta de apoio de Doria à campanha de Alckmin ao Planalto:

—Essa atitude dele abalou bastante o Geraldo. Ele é quase um candidato da oposição. Basta olhar o que ele fala sobre a segurança de São Paulo.

No mês passado, o PSDB iniciou uma ofensiva a políticos filiados ao partido que estão declarando voto a adversários de Alckmin. Um dos advertidos foi o vereador de Presidente Prudente Mauro Neves, tenente da Polícia Militar, que declarou apoio a Bolsonaro e tornou-se um dos representantes do fenômeno “Bolsodoria” em São Paulo.

Efeito "Bolsodoria"

Em junho, os números do Ibope revelaram essa combinação de votos em São Paulo: eleitores que preferem o candidato do PSDB ao governo paulista e, ao mesmo tempo, Bolsonaro, o que compromete o empenho do PSDB paulista na campanha de Alckmin. No fim de agosto, segundo o Ibope, 28% dos eleitores de Doria declaravam voto em Bolsonaro contra 20%.

Essas aparentes dissidências já têm reflexo também na campanha de Doria ao Palácio dos Bandeirantes. No domingo, durante uma agenda de campanha próxima ao Parque do Ibirapuera, algumas correntes do PSDB boicotaram a carreata que o ex-prefeito fez pelas ruas.