O globo, n. 31095, 25/09/2018. País, p. 8

 

‘Não há nova política. É ela que nos impede de ser selvagens’

Miro Teixeira

Bernardo Mello

25/09/2018

 

 

Aos 73 anos, após 11 mandatos como deputado federal, advogado diz que Supremo tem parcela de culpa pela ‘desqualificação’ do Congresso

Pesquisas têm mostrado que três candidatos considerados progressistas — Lindbergh (PT), Chico Alencar (PSOL) e o senhor — podem não se eleger. Não seria melhor terem se juntado?

A política não é determinada pelas pesquisas. Cada um tem sua visão programática. Uma linha divisória foi o impeachment da Dilma (Rousseff). Votei a favor, e votaria de novo se fosse hoje. Eles votaram contra. Com bons propósitos; não acho que participavam da quadrilha da Petrobras. Temos divergências, respeitosamente.

Depois de 11 mandatos na Câmara, por que tentar uma vaga no Senado?

Os problemas do Rio dependem de soluções nacionais. Os estados, que são representados pelo Senado, estão de pires na mão diante do poder federal. Adquiri muita experiência parlamentar, graças ao povo, o que me permite pregar a necessidade de uma nova Constituição, que mexa com o pacto federativo, o sistema tributário, a organização dos poderes e o sistema políticoeleitoral. E preservando os direitos individuais, para ninguém ficar assustado.

O senhor chegou a ser pré-candidato a governador...

Não obtive alianças, coligações. Governador não muda a Constituição, mas pode fazer movimento político. É preciso tirar os nós da vida brasileira. Estamos chegando a um ponto de inflexão em que poderemos ter um grande momento de tranquilidade, ou de conturbação. Achei que tinha um papel a desempenhar. Procuro usar o espaço da eleição para suscitar temas ao debate.

Por que apoiou o Romário (Podemos) para governador?

Eu estava praticamente combinado com o Eduardo Paes (DEM). Até que chegou o momento em que ele “destopou”. Alguns companheiros tinham o contato do Romário. Para resumir a história, marcamos em um restaurante na Barra da Tijuca, e eu perguntei se ele toparia fazer uma coligação com apenas um candidato ao Senado. Ele disse: “topo”. Ficou de pé e me estendeu a mão. Todos os trâmites partidários foram seguidos. Minha primeira aproximação com o Romário foi em 2014, quando ele era candidato ao Senado pelo PSB, e a Marina (Silva) substituiu o Eduardo Campos na disputa para a Presidência. Fizemos campanha juntos.

Marina caiu nas pesquisas. Por que a candidatura dela tem perdido espaço?

São visões contrárias que aparecem na sua pergunta. Será que, para exercermos a boa política, temos que imaginar propostas mais saborosas para o povo, para depois não cumpri-las? O que é a política, afinal de contas? É uma discussão que eu travava com a Marina, porque ela começou a falar muito em nova política. Não há nova política. Política é política. Não vamos tentar reescrever a maior criação social da inteligência humana. É a política que nos impede de ser selvagens. A política foi desqualificada por políticos, mas seu conceito continua íntegro.

Grande parte do seu eleitorado tem 45 anos ou mais. Como atrair os jovens?

Não mudo nada da minha vida. A campanha tem que ser verdadeira. E o povo decide se quer esse propósito ou não.

Seu primeiro mandato foi nos anos 1970, na ditadura. Dá para comparar aquela época com os dias de hoje?

Não, é tudo diferente. Existem novas formas de autoritarismo, não necessariamente ditado por ocupações militares. Mas não vejo a democracia ameaçada hoje. Confio na mobilização popular e no Poder Judiciário.

O senhor já disse que o Congresso atual é o fundo do poço. Por que chegou a um ponto tão crítico?

Lanço um pouco de responsabilidade sobre o STF. Fizemos uma boa lei sobre cláusula de barreira (em 2006) e o Supremo julgou inconstitucional. Teríamos cinco ou seis partidos hoje, em vez de 30 e tantos vivendo às custas de dinheiro público.

A Rede vai superar a cláusula de barreira neste ano?

Meu desejo é que consiga os votos. Agora, tem que tirar dinheiro público dos partidos. Tirando isso, resolve o resto. Ninguém ficará impedido de formar um partido. Pode disputar eleição municipal, ir crescendo...