O Estado de São Paulo, n. 45616, 08/09/2018. Política, p. A8
Agressor afirma à PF que agiu sozinho
Ricardo Galhardo
08/09/2018
Eleições 2018 Investigação / Em depoimento, Adelio Bispo de Oliveira diz que não foi contratado por ninguém e se considera um representante da ‘esquerda moderada’
Juiz de Fora (MG). Adelio Bispo de Oliveira ao ser detido anteontem, após atacar o presidenciável do PSL, Jair Bolsonaro
O agressor do candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, Adelio Bispo de Oliveira, afirmou em depoimento anteontem à Polícia Federal que “não foi contratado por ninguém para atentar contra a vida” do deputado. O servente de pedreiro disse que recebeu “uma ordem de Deus” para matar o presidenciável, porque, “embora ele (Bolsonaro) se apresente como evangélico, na verdade não é nada disso”. Declarou ainda que defende “a ideologia de esquerda” e se considera “da esquerda moderada”.
O preso se justificou dizendo que Bolsonaro “defende o extermínio de homossexuais, negros, pobres e índios, situação da qual discorda radicalmente”. Oliveira foi detido anteontem após dar uma facada no presidenciável durante ato de campanha em Juiz de Fora (MG).
Ontem, após audiência de custódia, foi determinada a transferência de Oliveira para um presídio federal (mais informações nesta página). A juíza Patrícia Teixeira de Carvalho considerou o atentado “delito grave, que revela profundo desrespeito à vida humana e ao estado democrático de direito”. Na audiência, Oliveira foi representado por quatro advogados.
Um dos quatro defensores do agressor, Zanone Manuel de Oliveira Júnior, disse ontem que Oliveira agiu sozinho e por motivação política. “Ele (Oliveira)
salienta que agiu de forma solitária. Aquela intenção era só dele. Não estava mancomunado, não havia concurso de pessoas”, afirmou o advogado. De acordo com o defensor, o grupo aceitou defender o agressor de Bolsonaro “por questões de igreja e familiares”.
Indiciamento. O autor do ataque a Bolsonaro foi indiciado pela PF com base na Lei de Segurança Nacional, que prevê penas para crimes por motivação política. A Lei 7.170, que define os crimes contra a segurança nacional, a ordem política e a ordem social, inclui a “prática de atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas”.
A pena para esse crime é de 3 a 10 anos de reclusão – ela pode dobrar se o fato resultar em lesão corporal grave e triplicar se resultar em morte. O indiciamento reforça a principal hipótese da PF nesta fase inicial de investigação, que é a de que a motivação do crime foi política. Documento. O termo de audiência de Adelio Oliveira
Para a defesa do agressor, o enquadramento na Lei de Segurança Nacional e a transferência para um presídio federal são medidas corretas, mas há “atenuantes” que devem ser levados em conta. Um deles seria a possível condição de insanidade mental. “Nós queremos analisar o estado da psique do nosso constituinte.”
Segundo o advogado de Oliveira, até a motivação política seria um atenuante. “O próprio discurso de ódio da vítima. Ele (Bolsonaro) trazia, até como meta de campanha. Nosso constituinte é negro, e aquela declaração de que um negro não serviria sequer pra procriar atingiu de uma forma avassaladora a psique de nosso constituinte”, disse. Em palestra no Rio, Bolsonaro disse que “quilombola não serve nem pra procriar”.
Reunião. O diretor-geral da PF, Rogério Galloro, se reunirá hoje com chefes de segurança dos candidatos à Presidência para avaliar o “grau de risco” de cada campanha e alinhar procedimentos de segurança. O ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, anunciou ontem que vai aumentar o efetivo
da PF destinado à segurança dos candidatos. Segundo o ministro, haverá aumento de 60% no número de agentes para proteger os presidenciáveis.
Jungmann disse que Bolsonaro havia sido alertado sobre riscos. “Havia sido conversado com a campanha de Bolsonaro que ficava muito difícil de fazer a segurança quando ele se lançava na multidão. Aquela situação (do atentado) não tinha nenhum controle.”
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Constança Rezende e Christini Antonini
08/09/2018
Agressor / Adelio Oliveira se hospedou no centro de Juiz de Fora; família abandona casa em Montes Claros
Pensão. Fachada de imóvel onde Adelio Oliveira alugou quarto, no centro de Juiz de Fora
Uma casa de dois andares, com grades de ferro, no centro de Juiz de Fora (MG). Este foi o local escolhido pelo pedreiro Adelio Bispo de Oliveira, agressor confesso do candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL), para se hospedar no último mês na cidade. Ele mora em Montes Claros, a 677 km de distância de Juiz de Fora.
Segundo um dos donos da pensão, Oliveira chegou ao local há duas semanas e pagou adiantado por um mês de estadia. Na época, a notícia de que Bolsonaro iria visitar a cidade em setembro já circulava entre os apoiadores do candidato.
Reservado, o pedreiro pouco falou com os demais hóspedes da pensão. Pagou R$ 400 à vista, em dinheiro, e ficou em um quarto particular na pensão modesta. Há outros 14 quartos na casa, que também conta com um prédio anexo. Na padaria da esquina, ele foi visto uma única vez para comprar pão.
Logo após o crime, a Polícia Federal foi até o local e recolheu os pertences de Oliveira, inclusive celulares e um notebook. O quarto onde ele esteve está trancado desde então. Na delegacia, ele disse que cometeu o crime “a mando de Deus” e “por motivos pessoais”, os quais a maioria das pessoas não entenderia.
Com medo de algum tipo represália, parentes do pedreiro deixaram a casa onde moram no bairro Maracanã, em Montes Claros. Vizinhos disseram que eles se transferiram para uma comunidade rural próxima, para evitar o assédio de estranhos. Uma das sobrinhas de Oliveira teve de desativar sua conta no Facebook, depois que apareceu como sendo parente do pedreiro. O jornal
Estado de Minas publicou ontem que a família estava amedrontada e sem entender os motivos para a agressão ao candidato do PSL.
“Ele era na dele, não falava muito sobre a vida. Disse que já foi morador de rua e que precisava trabalhar. Ficou comigo por uns quatro meses e depois pediu para sair”, afirmou ao Estado o dono de uma lanchonete em Montes Claros onde Oliveira trabalhou.
O pedreiro foi filiado ao PSOL de Uberaba de 2007 a 2014, quando pediu para sair da sigla. O PSOL considerava Oliveira um “militante de base” – expressão que, conforme o partido, significa que o filiado não participava das decisões tomadas pela legenda no município. O PSOL disse que, por se tratar de militante sem posto na agremiação, não é possível informar de que forma ele participava da vida partidária.
'Na dele'
“Ele era na dele, não falava muito sobre a vida. Disse que já foi morador de rua e que precisava trabalhar.”
PROPRIETÁRIO DE LANCHONETE ONDE ADELIO OLIVEIRA TRABALHOU