O globo, n. 31077, 07/09/2018. País, p. 8

 

Agressor diz que agiu 'a mando de Deus' e por divergir de ideias

07/09/2018

 

 

Agressor do deputado foi filiado até 2014 ao PSOL, que repudiou o atentado em Minas

O autor da facada no candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, Adélio Bispo de Oliveira, de 40 anos, foi identificado imediatamente por policiais federais que escoltavam o candidato e levado preso em flagrante por policiais militares, que evitaram que ele fosse linchado. Um inquérito foi aberto para investigar o ataque e hoje haverá uma audiência de custódia.

Desde o início, ele admitiu o crime e disse que agiu por divergências de ideias e de pensamento com as posições do candidato, segundo informou o tenente-coronel Marco Antonio Rodrigues de Oliveira, comandante do 2º Batalhão da PM. Na delegacia, ele foi novamente perguntado por policiais se havia agido a mando de alguém. E respondeu:

— Ninguém mandou. Quem mandou foi Deus.

Nascido em Montes Claros, morador de Juiz de Fora e eleitor em Uberaba, todas cidades do interior de Minas Gerais, Adélio atualmente está desempregado. Ele já atuou, por exemplo, como servente de pedreiro, além de ter trabalhado em cafeteria e hotel.

Clube do tiro

Nas redes sociais, ele é um crítico recorrente de Bolsonaro e também fazia críticas à maçonaria. Jussara Ramos, uma sobrinha de Adélio, afirmou ao site “Buzzfeed” que o tio havia sido missionário de uma igreja evangélica e que nos últimos tempos “ficava falando sozinho” e havia perdido contato com a família.

Adélio foi filiado ao PSOL de maio de 2007 até dezembro de 2014, quando sua filiação foi cancelada a seu pedido. O diretório do PSOL em Minas confirmou a filiação e divulgou nota afirmando que “a agressão sofrida por Bolsonaro configura um grave atentado à normalidade democrática e ao processo eleitoral. Repudiamos toda e qualquer ação de ódio”.

Há dois meses, Adélio praticou tiros em um clube do qual dois filhos de Bolsonaro, o deputado federal por São Paulo Eduardo e o vereador carioca Carlos, são sócios e frequentadores. No dia 5 de julho, ele esteve no “Clube e Escola de tiro .38”, em São José, na região metropolitana de Florianópolis, em Santa Catarina.

— Ele foi só uma vez. Está no nosso sistema — confirmou Julia Zanata, assessora do clube. — Ele esteve lá para praticar tiros. Quando chega no clube 38, você faz cadastro, compra um pacote com munições, armas e um instrutor acompanha.

Segundo a assessora, Eduardo e Carlos Bolsonaro são sócios do clube e frequentam o local há pelo menos três anos. O clube possui cerca de 600 associados e existe há 26 anos.

Nas redes sociais, o agressor tem várias publicações contra Bolsonaro. “Dá nojo só de ouvir que (sic) dizer que a ditadura deveria ter matado pelos uns 30 mil comunistas”, escreveu ele em 1º de agosto.

Um dia antes, ele afirmou na internet que Bolsonaro disse “muitas merdas” em entrevista ao “Roda Viva”, da TV Cultura. Há quatro anos, o homem comentou numa postagem de uma amiga que Bolsonaro é “um nazista, e verá isso na prática, um falso cristão, falso nacionalista, e estas coisas são bem visíveis”.

Segundo sua sobrinha Jussara Ramos, na última passagem de Adélio pela casa da mãe, que durou cerca de quatro meses, ele conversava consigo mesmo, cochichava sobre política, retrucava reportagens políticas que apareciam na TV e se irritava quando era questionado por familiares. Isso aconteceu há três ou quatro anos, antes de ele passar a evitar contato com os parentes.

Desde o ano passado, o servente de pedreiro move uma ação trabalhista contra uma construtora de Balneário Camboriú (SC), de onde foi demitido em 2015. O GLOBO falou com o advogado trabalhista Pedro Tiago Oliveira Santos, que defende o servente de pedreiro. Ele disse estar surpreso com a atitude do cliente:

— A última vez que falei com ele foi há um mês, coisas do processo. Estou vendo agora que foi ele quem fez isso com o Bolsonaro.

Em 2013, Adélio foi autuado na delegacia de Juiz de Fora pelo crime de lesão corporal, mas não chegou a ficar preso. As agressões teriam ocorrido durante uma briga com um parente.

Em julho do ano passado, Adélio defendeu o uso de militares no policiamento ostensivo. “O custo de um soldado dentro do batalhão é relativamente igual ao custo de um soldado patrulhando as cidades, então é viável e muito barato manter mais tropas do Exército patrulhando as grandes cidades", escreveu.

Nas redes sociais, Adélio também se mostra um crítico da maçonaria. “Metade dos assassinatos no Brasil estão diretamente ligados a maçonaria, execuções por ordem de maçon, e isso gira em torno de 33 mil assassinatos no Brasil por este sistema satânico”, postou em um texto de 2017.

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Além do autor do ataque, mais duas pessoas foram detidas

Bruno Abbud

07/09/2018

 

 

Além do autor do ataque ao deputado Jair Bolsonaro (PSL), Adélio Bispo de Oliveira, a Polícia Militar de Minas Gerais deteve outras duas pessoas. Segundo a polícia, eles seriam liberados após depoimento na sede da Polícia Federal em Juiz de Fora.

Um dos presos, identificado como Hugo Ricardo Bernardo, foi levado para delegacia por incitar atos de violência contra apoiadores de Bolsonaro. Outro detido, Bruno Pereira da Silva, de 21 anos, estuda Ciências Sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora. Segundo a família, que esperava do lado de fora da delegacia, ele é inocente.

— Só o prenderam porque ele é negro. Os seguranças de Bolsonaro bateram muito nele, mas ele estava com outros amigos brancos, não estava fazendo nada —disse uma familiar que preferiu não se identificar.

Segundo o parente, a cena do espancamento foi registrada em vídeo.

Autor do ataque, Adélio foi preso pelo cabo da PM Cleines Oliveira, candidato a deputado estadual pelo PSL de Minas.

— Para assegurar a integridade dele (Adélio), o levei para o segundo pavimento de um prédio até a chegada do camburão. Ele só dizia para olhar o Facebook dele que todo mundo ia entender por que ele deu a facada —disse Cleines.

Logo após o incidente na tarde de ontem, o cabo da Polícia Militar Paulo Tristão, candidato a deputado federal pelo PSL de Minas Gerais, que acompanha Bolsonaro nas agendas pelo país, e um delegado de Juiz de Fora foram procurados no local por uma testemunha que teria indicado os outros dois suspeitos.