O globo, n. 31077, 07/09/2018. Colunas, p. 9

 

Uma eleição fora dos trilhos

Bernardo Mello Franco

07/09/2018

 

 

O ataque a Jair Bolsonaro é o episódio mais lamentável de uma eleição que saiu dos trilhos. A violência ronda a campanha desde março, quando dois tiros atingiram a caravana do ex-presidente Lula no Paraná. Ontem o candidato que lidera as pesquisas foi vítima de uma facada em Juiz de Fora.

O atentado contra Bolsonaro é inaceitável. Numa democracia, as divergências devem ser resolvidas no debate de ideias e no voto. O discurso radical do deputado não justifica o uso da força contra ele.

A facada pode mudar os rumos da eleição. Com o impedimento de Lula, Bolsonaro virou líder da corrida presidencial. No entanto, pesquisas telefônicas que circulam nas campanhas indicavam que ele começava a cair. O desgaste era atribuído ao intenso bombardeio na propaganda de Geraldo Alckmin.

Agora os comerciais que criticavam o capitão serão retirados do ar. A comoção com o ataque também deve ter consequências eleitorais. Elas serão medidas na próxima rodada de pesquisas, que Ibope e Datafolha vão divulgar depois do feriadão.

Em março, Alckmin desdenhou do atentado contra a caravana lulista e disse que os petistas estariam “colhendo o que plantaram”. Bolsonaro sugeriu, sem provas, que o ataque a tiros teria sido armado.

Ontem ninguém repetiu o erro de culpar a vítima. Os principais candidatos condenaram a intolerância e desejaram pronto restabelecimento ao deputado. É o mínimo que se espera numa disputa civilizada.

Hoje os presidenciáveis devem se recolher em respeito a Bolsonaro, que se recupera da cirurgia a que foi submetido. É um bom momento para que todos pensem no que podem fazer para esfriar os ânimos e evitar novos atos de violência na campanha.

Michel Temer pode ser acusado de muitas coisas. Menos de bobo. Ao divulgar vídeos com críticas a candidatos, o presidente desviou o foco do inquérito do quadrilhão do MDB. Desta vez, a Polícia Federal afirma que ele embolsou propina da Odebrecht.

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Bolsonaro sofre 'lesões internas graves'

Cesar Baima

Marco Grillo

Renato Grandelle

07/09/2018

 

 

 Recorte capturado

 

 

Segundo médicos, facada rompeu veia no abdômen e provocou lesões nos intestinos delgado e grosso, corrigidas em cirurgia. Candidato permanece em UTI e seu estado é considerado grave, porém estável

Atingido por uma facada durante evento de campanha em Minas, o candidato à Presidência pelo PSL, Jair Bolsonaro, sofreu rompimento de uma veia no abdômen e lesões nos intestinos delgado e grosso, corrigidas durante uma cirurgia. O estado de saúde dele é considerado grave, porém estável. A equipe médica que atendeu Bolsonaro afirmou que ele chegou ao hospital com “sinais de choque” e com uma “volumosa hemorragia interna”. A facada também provocou três perfurações no intestino delgado, que foram suturadas, e uma lesão grave no intestino grosso. A cirurgia, que levou duas horas, foi realizada na Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora.

Para tratara lesão no intestino grosso, foi realizado um procedimento chamado colostomia, que consiste na colocação de uma bolsa par aonde serão excretadas as fezes. Em função desta lesão, havia uma contaminação na cavidade abdominal, que segue sendo tratada com antibióticos.

— As lesões que traziam risco à vida foram tratadas (na cirurgia). O quadro é naturalmente grave, mas ele está estável no momento. Foi uma lesão transfixante, muito profunda. Os órgãos no abdômen ficam sobrepostos — explicou o médico Luiz Henrique Borsato.

Bolsonaro está na UTI, procedimento padrão nestes casos, e a equipe estima um tempo mínimo de internação hospitalar variando entre oito e dez dias. O candidato deverá ser transferido para o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, quando houver condições, mas ainda não há prazo.

O médico Gláucio Souza, que também participou da cirurgia, relatou que o quadro era grave quando Bolsonaro chegou ao hospital.

— Chegou muito grave, com pressão muito baixa pela perda de sangue, mas conseguimos conter a hemorragia a tempo.

Para realizar as correções, o abdômen de Bolsonaro foi aberto, em um procedimento conhecido como laparotomia exploradora. Bolsonaro deverá ser submetido a outra operação para reverter a colostomia, feita em caráter temporário na primeira cirurgia.

Risco de infecção

Marcelo Enne, cirurgião hepático da Rede D’Or São Luiz, ressalta que uma facada no abdômen pode perfurar intestino, fígado e estômago, órgãos onde há uma grande concentração de veias e artérias, agravando o risco de hemorragia interna. Ele alerta para o risco de possíveis complicações no pós-operatório.

— Ninguém morre imediatamente por um ferida no intestino, mas uma infecção dias após a cirurgia não é descartada, e isso pode implicar a necessidade de uma nova operação — explica. — Uma facada pode provocar grandes lesões porque as vísceras estão em contato íntimo. Praticamente não há um espaço que as separe dentro do abdômen. Por isso, vários órgãos podem ser simultaneamente perfurados.

Segundo Enne, um paciente, após sofrer ese tipo de lesão, deve ser monitorado por um período de 12 a 24 horas antes de ser transferido para outro hospital. Ainda assim, precisa continuar internado —afirmou.

— Estes procedimentos são necessários porque podem ser registrados sangramentos após as primeiras horas de cirurgia, e a pressão sanguínea deve ser constantemente observada.

Bruno Rangel, cirurgião geral do Centro de Trauma do Hospital Estadual Alberto Torres, destaca que o tratamento médico vai além de estancar o sangramento. Depois, é preciso saber se a hemorragia afetou outros órgãos.

— Nas primeiras 48 horas, o problema principal é o sangramento e suas repercussões — alerta Rangel, que também é instrutor do curso de suporte avançado de vida no trauma do Colégio Americano de Cirurgiões. —Quando uma pessoa sangra, aquele sangue deixou de chegar a algum local, e os órgãos que deveria atingir ficam comprometidos, porque não recebem nutrientes e oxigênio.

Região delicada

Rangel ressalta que a faca atingiu uma região mais profunda do organismo do candidato.

—O local alcançado pela faca é extremamente complexo. Além do intestino, uma facada pode provocar uma série de lesões associadas.

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Repouso deve durar pelo menos um mês, dizem especialistas

07/09/2018

 

 

Se prognóstico se confirmar, candidato não poderá fazer atos de campanha

No momento em que foi atacado, em um ato de campanha em Juiz de Fora, Jair Bolsonaro era carregado por militantes. Após o ataque a faca, a cena não deve se repetir, na avaliação de especialistas. A recuperação pode durar semanas, e o candidato do PSL deve ter que fazer repouso e evitar movimentos bruscos por pelo menos um mês.

O médico Luiz Henrique Bors ato, que atendeu Bolson aro, diz que o candidato não deverá receber alta hospitalar antes de“uma semana ou dez dias ”. Ele evitou traça rum prognóstico sobre a participação de Bolsonaro nas agendas da campanha eleitoral.

— É muito subjetivo (dizer se pode ou não participar da campanha) —finalizou.

Bruno Rangel, cirurgião geral do Centro de Trauma do Hospital Estadual Alberto Torres, a capacidade física do candidato, de 63 anos, será crucial.

— A idade quer dizer menos do que as condições físicas do paciente. Quanto mais saudável for a pessoa, melhor será sua resposta ao trauma —explica. —Ainda estamos no primeiro capítulo dessa novela. Correndo tudo muito bem, ele ficará no hospital pelo menos sete dias, e provavelmente terá de ficar de repouso em casa.

Mesmo que fique no hospital por pouco tempo, Rangel ressalta que Bolsonaro não poderá realizar exercícios físicos nas próximas semanas.

—Não é recomendável que ela faça contrações abdominais por pelo menos um mês —alerta o cirurgião.

Idade pode prejudicar

Já um cirurgião com experiência em atendimentos de emergência no Hospital Souza Aguiar, no Centro do Rio, acredita que, devido à idade, o candidato pode ter complicações de saúde que tornarão a recuperação ainda mais difícil.

—Em pessoas jovens e saudáveis, a alta hospitalar poderia ocorrer em até uma semana, com a retomada das atividades em dez dias. Mas é um paciente idoso, que pode ter comorbidades que alterariam totalmente seu quadro clínico — avalia o médico, que não quis se identificar.

Já o cirurgião hepático da Rede D’Or São Luiz Marcelo Enne acredita que a recuperação após cirurgia pode durar “algumas semanas”.

— Bolsonaro tem uma laparotomia, uma incisão no abdômen. A orientação que damos aos pacientes com esta condição é que fique pelo menos dois meses sem atividade física intensa, como a que realizava no momento em que foi atacado.