Título: A gestão dos resíduos sólidos
Autor: Quintiere, Marcelo
Fonte: Correio Braziliense, 04/06/2012, Opinião, p. 11

A dificuldade em administrar os resíduos das cidades passou a ser um problema mais complexo no decorrer do século 20, em razão da concentração populacional e do processo de industrialização das regiões metropolitanas. Assim, devemos considerar inicialmente a complexidade crescente associada à gestão dos resíduos sólidos e a presença de alguns parâmetros fundamentais.

A primeira questão que devemos considerar é o fato de que a produção jamais sofre interrupções. Assim, o problema adquire caráter contínuo, além de operar com volumes crescentes. A solução para tratar dessas particularidades passa pela necessária introdução de tecnologias mais modernas para captar, separar e promover o tratamento mais adequado a cada componente dos resíduos sólidos.

A segunda é que, quando utilizamos o termo "lixo" de forma indistinta, estamos desconsiderando um aspecto relevante da gestão. O lixo é um produto heterogêneo e para cada tipo de componente existente temos uma forma mais adequada para promover sua coleta, tratamento e disposição final para que a gestão seja mais racional e apresente os melhores resultados. Exemplo mais concreto é a obrigatoriedade da incineração dos resíduos derivados dos serviços de saúde e os metais pesados presentes em baterias de celulares, cujo tratamento mais adequado é a reciclagem em indústrias especializadas.

Os países mais desenvolvidos já perceberam que os diversos componentes dos resíduos sólidos podem ser objeto de tratamentos específicos de modo a garantir mais empregos, renda, arrecadação de tributos, qualificação profissional para as camadas mais humildes da população, geração de energia elétrica e uma série de novos produtos a partir da reciclagem e reutilização. Os sistemas de reciclagem permitem que determinado resíduo, tal como um pneu, possa ser reaproveitado como matéria-prima na construção de estradas (asfalto ecológico) ou como fonte de energia em fornos de indústrias de cimento etc.

Uma das características de uma sociedade focada no consumo excessivo é a consequente geração de resíduos em quantidades crescentes. Na verdade, nunca produzimos tanto lixo como nos últimos anos. O Distrito Federal, considerada sua elevada renda per capita, apresenta uma produção diária de aproximadamente 1,56kg de lixo por habitante, traduzida basicamente em matéria orgânica, bem como por produtos descartáveis, tais como embalagens do tipo PET, vidros, metais e outros.

De acordo com a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) de 2008, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e editada em 2010, a disposição final de lixo nos municípios brasileiros é dividida da seguinte forma: 50,8% em lixões, 22,5% em aterros controlados e 27,7% em aterros sanitários. A prevalência dos lixões demonstra que grande porcentagem do lixo gerado diariamente não recebe o tratamento adequado, representando as inconsistências e fragilidades da gestão pública de resíduos no Brasil.

O depósito direto de resíduos em lixões consiste em uma prática considerada obsoleta em termos tecnológicos, propiciando desperdícios financeiros, uma vez que simplesmente enterra grandes volumes de resíduos que poderiam, alternativamente, ser reciclados ou transformados em combustíveis. Os lixões, esgotada sua capacidade de receber resíduos, se transformam em perigosos depósitos, inviabilizando o uso seguro da área e poluindo o meio ambiente por dezenas de anos após seu encerramento.

Os problemas mais comuns gerados ao meio ambiente e à saúde humana pela disposição irregular dos resíduos sólidos são: proliferação de vetores de doenças; produção de chorume e contaminação do solo e da água subterrânea; geração de metano, gás derivado da decomposição da matéria orgânica e considerado como um dos principais responsáveis pelo aquecimento global; marginalização do homem; contaminação por metais pesados etc.

Esse breve resumo dos parâmetros associados à gestão dos resíduos sólidos permite verificar a complexidade do tema, nem sempre percebida pelo público leigo. A inobservância das características supracitadas induz a equívocos que se traduzem em perdas financeiras, penalizando os municípios brasileiros que deixam de obter vantagens econômicas e, por falta de conhecimento, insistem em perpetuar uma solução ultrapassada (lixões).