O globo, n. 31073, 03/09/2018. Artigos, p. 6

 

Lula, agora, só em 2038, aos 93 anos

Eduardo Oinegue

03/09/2018

 

 

Só quem tem 76 anos ou mais sabe o que é eleição presidencial sem Lula. Entre os 147 milhões de eleitores registrados no cadastro eleitoral, apenas sete milhões de pessoas pertencem a esta faixa etária. Tinham ao menos 18 anos para votar em 1960, ano em que se disputou no Brasil a última eleição direta para presidente antes do regime militar. Após a redemocratização, lá estava ele na corrida de 1989 ao Palácio do Planalto. Naquela e em todas as outras que se seguiram. Participou pessoalmente em cinco, duas por intermédio de Dilma. O placar, a seu favor, está assim: quatro vitórias e três derrotas.

Para os demais 140 milhões de eleitores, mesmo os que votarão pela primeira vez em 2018, eleição presidencial e Lula pareciam inseparáveis, feito arroz e feijão. Só que veio a Operação Lava-Jato, vieram os inquéritos, as denúncias, as ações penais — e veio a primeira condenação, seguida da decisão colegiada do Tribunal Regional Federal da 4ª Re gião, que tornou o ex-presidente inelegível por forçada Lei da Ficha Limpa.

Coma sessão do Tribunal Superior Eleitoral, finalizada na madrugada de sexta-feira para sábado, encerraram-se as discussões sobre a candidatura Lula. Eventuais embargos interpostos por sua defesa nos próximos dias não mudarão a realidade. A reunião agendada para hoje entre Fernando Haddad e o expresidente na carceragem da Polícia Federal em Curitiba tampouco alterará a situação jurídica de Lula. O momento chegou: ou o PT troca o cabeça de chapa ou estará fora da eleição. Simples assim.

As lideranças petistas sempre souberam que o momento chegaria. Por mais que tenham proferido discursos empolgados à militância, nunca se iludiram com as chances na Justiça. Ou será por acaso que bolaram uma campanha de marketing dando a Haddad uma visibilidade inédita para quem seria apenas vice? Lula também tinha clareza de que mais dia menos dia seria preso, e que lá ficaria por um bom tempo. Ou será também por acaso que tenha deixado um farto material gravado em áudio e em vídeo? Há falas suas apoiando candidatos a governador, recomendando votos nos candidatos ao Congresso Nacional, às Assembleias estaduais e falando bem do “vice” Fernando Haddad. Tudo estudado, tudo programado. Se acreditasse no desfecho positivo da campanha “Lula Livre”, deixaria as gravações para quando saísse da cadeia. Como a cúpula partidária prometeu não deixar Lula na chuva, o desafio agora é anunciar a substituição sem dar aos admiradores do expresidente a impressão de que foi abandonado.

Esse é o desafio do PT, que seguirá seu caminho. Resta o desafio pessoal de Lula. A não ser que seus advogados consigam tirar um coelho da cartola quando recorrerem ao STF, a matemática penal que recai sobre Lula é dramática. Pela legislação, um condenado só pode disputar eleições oito anos depois de encerrado o cumprimento da pena que lhe foi imposta. A pena imposta a Lula pelo TRF4 foi de 12 anos. Doze anos mais oito anos dá 20 anos. Até 2038, portanto, quando terá 93 anos, Lula não poderá disputar eleições. Ficará fora da corrida de 2018, e das 6 seguintes.

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Adversários reagem à insistência do PT com Lula

André de Souza

Leticia Fernandes

Sérgio Roxo

03/09/2018

 

 

Partido Novo e PSDB ingressam com representações na Justiça Eleitoral contra exposição de petista; ministros do TSE admitem que uso da imagem de ex-presidente em campanhas a deputado pode levar a uma enxurrada de ações nos estados

Dois partidos já se insurgiram no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra os planos do PT de manter em alta a exposição do ex-presidente Luiz Inácio Lu lada Silvam esmoa pó sele ter sua candidatura barrada. O Partido Novo ingressou ontem com três representações pedindo a suspensão de propagandas veiculadas na TV e no rádio, enquanto PSD B reclamou de o jingle do petista ter invadido o horário de candidatos a deputado. Provável herdeiro da candidatura, Fernando Haddad afirmou, ontem, em Alagoas, que a estratégia do PT daqui pra frente será traçada hoje, após reunião com Lula em Curitiba (PR), onde o expresidente está preso.

O Partido Novo argumentou nas suas ações que Lula foi apresentado como candidato, o que descumpriria a decisão judicial. Além de pedir que as peças não sejam mais exibidas, solicita que a campanha do PT seja punida com perda de tempo. O partido refutou a hipótese de que não teria dado tempo para substituição da peça, destacando o fato de o programa do PT já mencionar a decisão do TSE. A campanha de Geraldo Alckmin (PSDB), por sua vez, reclamou que o jingle da campanha foi veiculado no horário reservado aos candidatos a deputado estadual e federal de São Paulo. O pedido também é para perda de tempo no horário obrigatório.

— Eles sabem que o Lula não será candidato. O que fazem é tentar artificialmente vitimizar alguém que foi candidato, e de outro lado, esconder o candidato (real). Isso é enganação — afirmou Alckmin, ontem, durante evento em São Bernardo do Campo (SP).

Reflexo em todo o País

Lula foi proibido pelo TSE de se apresentar como candidato, masa Justiça Eleitoral ainda terá dese manifestar sobre aliados que o promovam. Éo caso, por exemplo, de alguém que está concorrendo à Câm arados Deputados ea presente santinhos com amensagem “Lula presidente ”. Três ministros do TSE ouvidos pelo GLOBO dizem que a situação é inusitada, mas afirmam que qualquer decisão só será tomada se o Ministério Público Eleitoral ou algum adversário político contestar tal propaganda. Um deles avaliou ainda que um candidato promovendo Lula está infringindo a decisão do TSE.

Os ministros também opinaram que qualquer contestação à propaganda de candidatos a deputado, senador ou governador, mesmo fazendo menção a Lula, têm de passar primeiro pela Justiça Eleitoral de seu estado. Para os integrantes da Corte, uma decisão sobre o tema, por ser inusitada e sem precedentes, vai ter que ser guiada pelo princípio da razoabilidade e pelo bom senso.

Líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS) disse que o partido continuará usando L ulana campanha, destacando que ainda há recurso ao Supremo Tribunal Federal( STF ).

— Não vai ter material sem Lula e não há nenhuma chance de que possamos fazer alguma alteração nisso —disse.

O governador petistaPI ), que busca a reeleição, afirmou que a estratégia é “trabalhar o 13”.

—Aqui agente já tem alguns cartazes em que aparece o Lula com o Haddad do lado. A população já estás e familiarizando coma imagem do vice, tanto que foi aqui que e le (Haddad) deu alargada na campanha. Vamos seguir com todo material coma imagem do Lula. Aceitando ele na urna ou não, essa é a decisão —afirmou Dias.

Ainda na função de vice, Haddad condicionou qualquer mudança na estratégia do partido à reunião com Lula em Curitiba. Ontem, em visita a Alagoas, Haddad recebeu o apoio do senador Renan Calheiros (MDB) e de seu filho, Renan Filho, candidato à reeleição ao governo. O petista foi saudado pelo governador como “nosso presidente Haddad”.

—Nós vamos levar um novo cenário para ele (Lula). Como ninguém visitou ele desde então, se houver novidades, é amanhã (hoje) — afirmou Haddad, que evitou entrar em detalhes sobre o momento no qual o PT deve anunciá-lo como candidato.