O globo, n. 31131, 31/10/2018. País, p. 4

 

Guedes, o superministro

Jussara Soares

Martha Beck

31/10/2018

 

 

Pasta terá Fazenda, Planejamento e Indústria

O presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) decidiu ontem criar o superministério da Economia, que abrigará na mesma estrutura as pastas da Fazenda, Planejamento, e Indústria e Comércio Exterior. A decisão, anunciada após a primeira reunião com a sua equipe depois da vitória, dá a dimensão também dos superpoderes que o economista Paulo Guedes terá.

Apelidado de “Posto Ipiranga” pelo capitão da reserva durante a campanha, ele havia ficado contrariado quando Bolsonaro, na semana passada, sinalizou que poderia recuar da ideia de fusão dos ministérios e dar autonomia à área de Indústria e Comércio. Guedes teria entendido como uma perda de poder e prestígio.

A criação do superministério da Economia colocará nas mãos de Guedes o controle do caixa da União e também toda a programação orçamentária federal. Se hoje o ministro da Fazenda já é poderoso, pois comanda o Tesouro Nacional e a formulação da política econômica, ele passará a centralizar a decisão de como cada centavo será gasto. Caberá aos outros ministros bater à porta de Guedes quando quiserem recursos.

Como se não bastasse isso, o superministro também terá o controle das maiores estatais do setor financeiro. Caixa e Banco do Brasil já estavam ligados à estrutura da Fazenda, mas o BNDES estava subordinado ao Planejamento. Agora, o banco de fomento, instrumento importante para o financiamento do setor produtivo, também irá para o guardachuva da Economia.

Guedes vai comandar também o dia a dia da máquina pública, a gestão de pessoal, do patrimônio da União, além da secretaria de gestão das empresas estatais e a interlocução com o empresariado.

A união dos ministérios foi criticada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e por outras entidades do setor. Questionado, Guedes ironizou pedidos de incentivos fiscais.

—Interessante. No programa, os três (ministérios)já estavam juntos. Foi criticado pelo setor? Pelos industriais? Está havendo uma desindustrialização há 30 anos. Nós vamos salvar a indústria brasileira, apesar dos industriais— atacou o futuro ministro de Bolsonaro.

A crítica de Guedes se refere ao que ele considera um excessivo lobby por benefícios fiscais e proteção contra o mercado externo:

—O que aconteceu é que o Ministério da Indústria e Comércio acabou se transformando em uma trincheira da Primeira Guerra Mundial, defendendo subsídios, desonerações, coisas que prejudicam a indústria brasileira.

Polêmicas na campanha

Em nota, o presidente da CNI, Robson Andrade, reiterou que a entidade é contrária à extinção do Ministério da Indústria, Comércio Exterior:

“Precisamos de um ministério com um papel específico, que não seja atrelado à Fazenda, mais preocupada em arrecadar impostos e administrar as contas públicas (...) Nenhuma grande economia do mundo abre mão de ter um ministério responsável pela indústria e pelo comércio exterior forte e atuante”.

Especialista em contas públicas, Raul Velloso explica que, numa situação de equilíbrio das contas, é natural que haja uma área de planejamento estratégico separada. Mas esse não é o caso do Brasil no momento. O principal problema hoje é justamente o desequilíbrio fiscal. E, diante desse cenário, é positivo que o comando da área fique nas mãos de um único ministro:

—Temos que resolver o problema do déficit público. Por esse aspecto, é bom que haja essa unificação entre os ministérios da área econômica.

O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Carlos Megale, disse que prefere aguardar:

—Ainda estamos tentando entender. Mas temos certeza que a indústria não ficará desassistida dentro do governo. Temos essa convicção.

Com longa trajetória no mercado, Guedes se aproximou de Bolsonaro depois da desistência de Luciano Huck de entrar na disputa. Antes de fazer parte do círculo próximo ao presidente eleito, Guedes aconselhava o apresentador, a quem tentava convencer a ser presidenciável. Feitas as pontes com Bolsonaro, o economista passou a encontrá-lo para convencê-lo da importância de uma agenda liberal. 

Órgãos do ministério

> Receita Federal e Tesouro. Administra impostos e faz gestão de contas.

> BNDES. Financia diversos setores da economia.

> Banco do Brasil e Caixa. As instituições são referência para financiar agricultura e habitação.

> Patrimônio da União e servidores. A pasta também vai gerir o s funcionários públicos

> Interlocução. Guedes fará gestão de estatais e receberá demandas do empresariado.

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Concentração de poder traz riscos à gestão

Martha Beck

31/10/2018

 

 

No governo Bolsonaro, Paulo Guedes deve se tornar o ministro mais poderoso que o Brasil já conheceu no período democrático. Nem Pedro Malan e Guido Mantega, os mais longevos ocupantes do cargo, tiveram tantos tentáculos. Ficarão sob o comando do “Posto Ipiranga” Fazenda, Planejamento e Indústria e Comércio. Algo semelhante só foi visto no governo Collor, quando Fazenda e Planejamento, unificados, foram conduzidos por Zélia Cardoso de Mello. A estratégia não deu certo e acabou após o impeachment.

Bolsonaro ressuscita a ideia, colocando sob a batuta de Guedes o controle do caixa, a formulação da política econômica, a gestão do Orçamento e das estatais e a interlocução com o setor produtivo, com suas demandas por desonerações e programas setoriais.

Há riscos na opção pela concentração. Áreas podem acabar negligenciadas, e o próprio ministro pode ficar sobrecarregado. Afinal, a máquina pública estará sob seu comando: da tecnologia da Esplanada à gestão de pessoal.

Perde-se também o contraponto importante, valorizado pelas gestões anteriores, entre a arrecadação dos recursos e como eles devem ser gastos.

Guedes vai controlar todo o governo.

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Alto escalão já tem primeira divergência pública

Marcello Corrêa

31/10/2018

 

 

Paulo Guedes reprova fala de Onyx Lorenzoni sobre Previdência: ‘É um político falando de economia. Não dá certo, né?’

Ogoverno eleito já tem a primeira divergência pública para administrar entre dois dos mais importantes futuros ministros. Um dia após o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), confirmado como futuro chefe da Casa Civil de Jair Bolsonaro, dizer que a reforma da Previdência do governo Michel Temer não interessava, Paulo Guedes reagiu.

Os dois homens fortes do novo governo discordam sobre a urgência das alterações no INSS e vêm travando um cabo de guerra sobre quem terá mais influência no Planalto a partir de janeiro.

Onyx descarta seguir com a reforma da Previdência proposta por Temer — ele também já falou sobre a possibilidade de o futuro governo usar uma meta de taxa de câmbio, sem flutuação. Em entrevista a jornalistas, Guedes chamou para si a responsabilidade na área:

— Ele (um jornalista) está dizendo que Onyx, que é coordenador político, está falando de banda cambial. Ao mesmo tempo diz que o Onyx, que é coordenador político, diz que não tem pressa na Previdência. Aí o mercado cai. Estão assustados por quê? É um político falando de coisa de economia. É ames maco isaque eu sair falando coisa de política. Não dá certo, né? —afirmou Paulo Guedes.

Ao responder sobre a Previdência, Guedes afirmou que sempre foi a favor da medida, desde que o texto foi apresentado há dois anos.

Durante a campanha, o economista foi desautorizado por Bolso na roa falar sobre política após cogitara possibilidade de adoção de“super poderes” para partidos no Congresso. A ideia de Guedes visava a facilitara aprovação de medidas econômicas.