O globo, n. 31130, 30/10/2018. País, p. 4

 

Chamado a Sergio Moro

Marco Grillo

Jussara Soares

30/10/2018

 

 

Bolsonaro quer juiz no STF ou Justiça e busca já votar a Previdência

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, afirmou ontem que vai convidar o juiz Sergio Moro para ocupar o Ministério da Justiça ou uma das vagas no Supremo Tribunal Federal (STF) que serão abertas durante o seu mandato, com a aposentadoria de ministros —a escolha, segundo Bolsonaro, caberá ao magistrado. O capitão da reserva do Exército defendeu ainda que pelo menos um trecho da reforma da Previdência proposta pelo governo de Michel Temer seja aprovado pelo Congresso neste ano. Bolsonaro concedeu entrevistas ontem para cinco emissoras de televisão: TV Globo, Record, SBT, Band e RedeTV!.

Sergio Moro

Um convite público e a janela aberta do juiz

Bolsonaro afirmou que vai convidar o juiz Sergio Moro para ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) ou o Ministério da Justiça. O presidente eleito ainda não procurou o magistrado, mas ressaltou que quer agendar a conversa em breve. Pelo menos duas vagas na Corte serão abertas nos quatro anos de mandato do capitão da reserva, com as aposentadorias compulsórias dos ministros Celso de Mello (novembro de 2020) e Marco Aurélio Mello (julho de 2021).

—Se tivesse falado isso lá atrás, soaria oportunista. Pretendo, sim (convidar Moro), não só para o Supremo, como quem sabe até para o Ministério da Justiça. Pretendo conversar com ele, saber se há interesse e, se houver interesse da parte dele, com toda certeza será uma pessoa de extrema importância num governo como o nosso —disse Bolsonaro.

A interlocutores, Sergio Moro não tem descartado a possibilidade de aceitar um convite para o Ministério da Justiça e diz, inclusive, que aceitaria de bom grado a indicação para o Supremo. Nas conversas, o magistrado afirma que a vantagem de integrar o governo neste momento seria afastar o temor de alguns setores da sociedade que seja quebrada alguma regra do Estado de direito.

Previdência

Volta a possibilidade de aprovar texto de Temer

Bolsonaro vai a Brasília na semana que vem conversar com o presidente Michel Temer e defendeu que ao menos um trecho da reforma da Previdência seja aprovado pelo Congresso. A declaração contraria o ministro da Casa Civil, deputado Onyx Lorenzoni (DEMRS), que criticou a proposta sobre a Previdência apresentada pelo atual governo e disse que as mudanças devem ocorrer de uma vez só.

—Buscaremos aprovar (este ano) alguma coisa, como reforma da Previdência. Se não tudo, alguma parte, pois evitaria problemas para o futuro governo — afirmou Jair Bolsonaro.

O presidente eleito também defendeu a manutenção do teto de gastos. Segundo ele, a discussão sobre a revogação da emenda constitucional é infrutífera, porque já não há verba para investimentos e, por isso, é necessário cortar gastos.

— Não adianta querer revogar a emenda do teto. Ela é importante e, se puder ser aperfeiçoada, (isso) será bem-vindo —acrescentou.

Papel do PSL

Longe do comando da Câmara dos Deputados

Bolsonaro defendeu que o próprio partido, o PSL, não ocupe a presidência da Câmara dos Deputados na próxima legislatura. Ele, no entanto, evitou se comprometer com a defesa da recondução de Rodrigo Maia (DEMRJ), que já começou as articulações para permanecer mais dois anos no posto.

—O que tenho falado para a minha bancada é que eu gostaria que não lutássemos pela presidência da Câmara. Seria um gesto de humildade da nossa parte, porque queremos que todos participem do governo. Não posso falar que sou (favorável à recondução de Maia). Tem vários nomes ali. O presidente não pode entrar nessa briga.

Jair Bolsonaro também recomendou que os parlamentares do PSL que vão estrear na Casa se abstenham de disputar as vagas na Mesa Diretora:

—Pela minha experiência no Parlamento, entendo que as vagas na mesa (diretora) devem ser ocupadas por quem já tem mandato.

Agressões contra gays

Pena pode ser ‘agravada’ nesses casos

Sobre as agressões recentes contra homossexuais, o presidente eleito afirmou que os atos precisam ser punidos de forma severa.

— A agressão contra um semelhante tem que ser punida na forma da lei e, se for por motivo como esse (em função da orientação sexual), tem que ter pena agravada —afirmou.

Bolsonaro afirmou que ganhou o rótulo de homofóbico por ter se posicionado contra a divulgação pelo governo de materiais contra a homofobia, o que o presidente eleito chamou de “kit gay”. Ele citou novamente o suposto “9º Seminário LGBT Infantil” que teria sido organizado na Câmara para discutir o assunto. A informação é falsa, conforme já mostrou o “Fato ou Fake”, blog de checagem do Grupo Globo. O que foi realizado foi o “9º Seminário LGBT no Congresso Nacional”, evento organizado atualmente.

‘Mesmo barco’

Pedido de união a quem não o escolheu

Depois de uma eleição bastante polarizada, Bolsonaro fez um aceno para os eleitores que não o apoiaram durante a eleição:

— Quero dizer a todos vocês que não votaram em mim que nós estamos no mesmo barco. Se o Brasil não sair dessa crise ética, moral e econômica, todos nós sofreremos as consequências do que se aproxima. Temos tudo para sermos uma grande nação. O que falta é união de todos.

Segurança e armas

Sinais para policiais e caminhoneiros

Jair Bolsonaro voltou a defender que a Câmara aprove o excludente ilicitude para evitar que policiais sejam responsabilizados por crimes cometidos em serviço e disse que os bandidos serão responsabilizados “pela lei ou sendo abatidos”:

— Quem está à margem da lei tem que entender que, fazendo algo errado, ele vai ser responsabilizado, quer seja na lei ou quer seja sendo abatido. Não podemos cada vez mais deixar que a bandidagem fique à vontade, sabendo que a lei está muito mais do lado dele, do que do lado de quem está defendendo o Estado.

Além das mudanças no Estatuto do Desarmamento, facilitando a posse de armas, o presidente eleito foi além e defendeu a flexibilização do porte —o que permite aos cidadãos saírem de casa com o armamento. Hoje, a legislação praticamente proíbe o porte, que está restrito a casos muito específicos.

— O porte de arma de fogo tem que ser flexibilizado também. Por que um caminhoneiro não pode ter porte de arma de fogo? Ao reagir se alguém estiver furtando ou roubando seu estepe, o caminhoneiro armado vai dar exemplo para a bandidagem: atirou, o elemento foi abatido em legitima defesa, ele (caminhoneiro) vai responder, mas não tem punição. Vai diminuir a violência, com toda certeza — defendeu Bolsonaro.

Maioridade penal

Eleito defende redução inicial para 17 anos

O presidente eleito defendeu, em um primeiro momento, a redução da maioridade penal para 17 anos. Bolsonaro afirmou que luta pelo tema desde que se elegeu deputado federal há 28 anos, mas disse que nunca teve êxito porque a esquerda sempre teve força no Congresso e barrava a proposta.

— Se não for possível (a redução da maioridade penal) para 16 anos, que seja 17. Como futuro presidente, se tiver resultado, podemos tentar 16. Eu gostaria que fosse 14, mas com 14 anos a chance é quase zero de ser aprovado.

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Eleito volta a fazer ameaças a veículos de imprensa

30/10/2018

 

 

Bolsonaro diz que publicação ‘não é digna’ e fala em cortar verbas; em nota, ‘Folha’ diz que ele ‘não entendeu o papel’ do jornalismo

Depois de dizer ontem, em entrevista ao “Jornal Nacional”, que era “totalmente favorável à liberdade de imprensa”, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, acusou o jornal “Folha de S.Paulo” de propagar notícias falsas a respeito dele e disse que irá cortar as verbas de propaganda oficial de veículos jornalísticos que agirem, na avaliação dele, “mentindo descaradamente”.

Bolsonaro citou uma reportagem veiculada pelo jornal no início do ano, revelando que uma funcionária lotada no gabinete dele vendia açaí em um pequeno comércio de Angra dos Reis, na mesma rua onde fica sua casa de veraneio. Na ocasião, ele alegou que a assistente estava de férias. Ontem, Bolsonaro desqualificou as informações da reportagem dizendo que o jornal havia mentido no episódio.

Em nota, a “Folha de S. Paulo” afirmou que “o presidente eleito se engana”. “A reportagem da Folha mostrou que uma funcionária sua na Câmara dos Deputados trabalhava em horário de expediente vendendo açaí em Angra dos Reis (RJ) em mais de uma ocasião e em meses diferentes. Tanto que ela acabou exonerada por ele. Jair Bolsonaro, mesmo após eleito presidente, não deixa de ameaçar a Folha. Ainda não entendeu o papel da imprensa nem a Constituição que promete obedecer”, destacou o veículo.

Na entrevista ao JN, Bolsonaro foi questionado se seria do seu desejo que o jornal acabasse. Ele então citou as verbas do governo.

— Não posso considerar essa imprensa digna. Não quero que ela acabe, mas, no que depender de mim, da propaganda oficial do governo, a imprensa que se comportar dessa maneira, mentindo descaradamente, não terá apoio (financeiro) do governo federal.

Ele também criticou reportagem recente da “Folha de S. Paulo” sobre empresas que bancaram disparos de mensagens falsas contra o PT. Mais cedo, em entrevista à TV Record, o presidente eleito afirmou que não vai atuar para impor limites à liberdade de expressão, deixando a tarefa aos cidadãos.

— Quem vai impor limite é o leitor. Tem certos órgãos de imprensa que caíram em descrédito por ocasião das eleições. Estão perdendo assinantes ou telespectadores. Quem vai limitar isso vai ser o cidadão na ponta da linha —disse Bolsonaro.