O globo, n. 31126, 26/10/2018. Colunas, p. 5
O capitão fugiu dos debates. E depois?
Bernardo Mello Franco
26/10/2018
Hoje à noite, o eleitor teria a última chance de comparar os candidatos à Presidência. Jair Bolsonaro e Fernando Haddad deveriam se enfrentar ao vivo na TV Globo. O duelo começaria às 22h, mas foi cancelado por motivos de fuga. O capitão desertou.
No primeiro turno, Bolso na roa legou razões médicas paranã o comparecera debates. Tudo certo, porque ele sofreu uma facada e passou 23 dias no hospital. Ago raque o atestado perdeu a validade, o deputado admite que ficará em casa por“estratégia ”.“Quem conversa com poste é bêbado”, debochou, no Twitter.
O capitão acredita que o arrego vai prejudicar seu adversário. Podes er,masqu em mais perdeéo eleitor. A três dias das urnas, e o favorito para assumir o governo continua a esconder suas ideias. Nem seus aliados sabem dizer ao certo o que ele vai fazer se chegar lá.
Bolson aro costumas e esquivar de perguntas objetivas com chavões que já viraram piada, como“Tem que muda risso aí” e“Não dá pra continuar desse jeito ”. A fórmula funciona na propaganda enos comícios deFa cebo ok. Quando ele pode ser contestado, é outra história.
Nas duas vezes em que aceitou debater, ainda no primeiro turno, o capitão teve desempenho abaixo da média. Na Band, ele pareceu sonolento, como se estivesse dopado. Na RedeTV!, levou um sermão desconcertante de Marina Silva, que o acusou de discriminar as mulheres e deseducar as crianças ao fazer apologia das armas.
A atitude de Bolsonaro produziu uma situação inédita. Desde 1989, o Brasil nunca havia atravessado um segundo turno sem debate presidencial. Collor, Lula, Serra, Alckmin, Dilma e Aécio aceitaram o contraditório e enfrentaram seus oponentes. Ele, não.
A recusa é um desrespeito ao eleitor, que tem o direito de saber o que pensam os candidatos. Também serve como um sinal de que, se eleito presidente, ele continuará a se esconder do escrutínio da imprensa.
Na campanha, Bolsonaro já exibiu desprezo pelo jornalismo profissional. Fez vista grossa aos seguidores que ofendem repórteres e ameaçou usar verba pública para retaliar veículos que o criticam. O que mais ele fará se chegar ao Planalto?
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Bolsonaro recua e fala em manter Acordo de Paris
Mariana Martinez
26/10/2018
Candidato havia dito que poderia retirar Brasil do tratado do clima por afetar a soberania. Ontem, disse ainda que proposta de unir os ministérios da Fazenda e da Indústria e Comércio voltará a ser discutida após eleições
Em novo recuo, o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, disse ontem que não vai tirar o Brasil do Acordo de Paris, caso seja eleito no próximo domingo. E disse que é preciso esclarecer a verdade sobre o que o tratado representa.
O Acordo de Paris foi assinado por 195 países em 2015 e prevê que todos devem manter o aquecimento global abaixo de 2ºC, buscando limitá-lo a 1,5ºC.
— Não, não sai. Fica no Acordo de Paris — respondeu o candidato do PSL que, em cerimônia simbólica, recebeu ontem uma faixa preta dos lutadores Robson Gracie e Austregesilo de Athayde.
No mês passado, ao participar de um encontro com empresários, Bolsonaro havia dito que, se fosse eleito, poderia retirar o Brasil do acordo por não concordar com as premissas, entendendo que o documento afeta a soberania nacional.
Ontem, ele voltou a criticar a medida. Segundo o candidato, é possível o Brasil buscar essas metas sem precisar fazer parte de “acordo nenhum”, mas que pode manter o país no tratado se houver garantias que não está em jogo o chamado Triplo A —a proposta de um grande corredor ecológico que ligue os Andes ao Atlântico, passando pela Amazônia.
— Não estaria mais sob a nossa jurisdição, mas a de outro país. Pergunto: nesse acordo nós poderíamos abrir mão da nossa Amazônia? Vamos colocar no papel que não está em jogo o Triplo A, nem a independência de nenhuma terra indígena, que eu mantenho o Brasil no Acordo de Paris.
Bolsonaro disse ainda ser favorável a investimentos em energia eólica e solar.
Fusão de Ministérios
O líder nas pesquisas afirmou também que a proposta de unir o Ministério da Fazenda ao da Indústria e Comércio Exterior voltará a ser discutida após as eleições. Durante uma transmissão ao vivo pelo Facebook anteontem, o capitão da reserva já havia reconhecido que iria rever a decisão, em um eventual governo, se for interesse dos empresários e do país.
Com o recuo, o superministério da Economia previsto para ser comandado pelo economista Paulo Guedes perderia força. Questionado sobre o assunto, Bolsonaro disse que “a evolução faz parte do ser humano”.
Em entrevista à Band, o candidato afirmou que pretende colocar o preço dos combustíveis “compatível com a realidade brasileira”.
— Mais baixo do que tá aí. Estamos no limite do limite. Não temos mais como majorar o preço do combustível —disse Bolsonaro.
Sobre a hipótese de extinção do Ministério da Cultura, Bolsonaro disse que o problema é a Lei Rouanet, que, para ele, é mal aplicada.
— Tem de ter um filtro. Se for uma secretaria ou ministério, qual é o problema?