Título: ONU sofre ataque e fala em guerra civil
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 13/06/2012, Mundo, p. 19

Tiros e pedradas forçam observadores internacionais a suspenderem missão na cidade de Al-Haffeh. Regime de Bashar Al-Assad teria perdido boa parte do território

Enquanto a Organização das Nações Unidas (ONU) garantia que o conflito na Síria já ganhou contornos de guerra civil e denunciava a tortura de crianças, observadores internacionais eram impedidos, a tiros e pedradas, de chegar à cidade de Al-Haffeh (noroeste). Foi o segundo ataque sofrido pelos monitores da ONU em cinco dias.

Se a situação no front torna-se cada vez mais tensa — com civis retidos em meio a bombardeios —, no campo diplomático o cenário não é diferente. A secretária de Estado americana, Hillary Clinton, acusou Moscou de mentir sobre o repasse de armamentos à Síria. "Estamos preocupados com a informação de que helicópteros de ataque da Rússia estão a caminho da Síria, o que intensificará a escala do conflito dramaticamente", declarou. "Pedimos aos russos que detenham seus constantes envios de armas à Síria." Ela considerou "muito difícil" estender a missão dos observadores — o mandato se encerra em 20 de julho.

Imagem de vídeo mostra destruição em Homs: sob bombardeio intenso

Hervé Ladsous, chefe das operações de manutenção da paz da ONU, admitiu que o regime "perdeu grande parte do seu território para a oposição e quer recuperar o controle". Segundo ele, este seria um indício de guerra civil. Opositores e ativistas sírios refutam essa hipótese. Em comunicado à imprensa, a Comissão Geral da Revolução Síria afirmou que o anúncio de Ladsous "não reflete a realidade nem representa o povo sírio". "Esse anúncio (de guerra civil) iguala o assassino à vítima e ignora os massacres cometidos pelo regime de Al-Assad", alega a nota. Ausama Monajed, integrante do Conselho Nacional Sírio (CNS), lembrou ao Correio que o tecido social em seu país permanece intacto (leia o Eu acho...).

O novo incidente envolvendo a ONU, em Al-Haffeh, ocorreu quando uma multidão interceptou o comboio de observadores e arremessou pedras e barras de metal contra três carros, antes que atacantes desconhecidos abrissem fogo. Os rebeldes do Exército Sírio Livre abandonaram a cidade e as forças de Al-Assad intensificaram os ataques aos moradores. Os Estados Unidos temem a iminência de um massacre no local.

Em outro desdobramento, as Nações Unidas divulgaram ontem relatório com graves acusações ao regime de Al-Assad, no que diz respeito ao tratamento das crianças. "Raras vezes, vi uma brutalidade semelhante contra crianças como na Síria, onde meninas e meninos são presos, torturados, execulados e usados como escudos humanos", disse à agência de notícias France-Presse Radhika Coomaraswamy, representante especial da ONU para crianças em conflitos armados. O documento revela que tropas capturaram dezenas de crianças de 8 a 13 anos no povoado Ayn Aruz, na província de Idlib, em 9 de março. Segundo a Human Rights Watch, 1.176 dos 14,1 mil mortos desde o início do levante eram crianças.

Moradora de Homs, a ativista Rama não se surpreende com as denúncias sobre os helicópteros artilhados de Moscou. "A Rússia apoia Al-Assad e o ajuda a nos matar", afirmou ao Correio. "Eu começo a sentir que os russos são inimigos de meu povo." De acordo com Rama, Homs — considerada o centro nevrálgico da revolução — voltou ontem a ser fortemente bombardeada. "Houve pesados ataques contra casas, hospitais e mesquitas, especialmente na Cidade Velha. Estamos em uma situação muito ruim", desabafou.

Eu acho... "O povo sírio está reunido contra um único inimigo: o regime de Bashar Al-Assad. Ele tem incitado tensões sectárias e bombardeado áreas sunitas próximas a vilarejos de maioria alauíta. As únicas forças que continuam a empurrar o país para uma posição mais tensa são o regime de Al-Assad e o governo da Rússia. Chamar isso de "guerra civil" é outra tentativa de rotular a revolução síria como outro conflito qualquer, no sentido de dessensibilizar as percepções da opinião pública sobre futuros incidentes. O povo sírio permanece resoluto em manter o seu tecido social."

Ausama Monajed, integrante do Conselho Nacional Sírio (CNS), órgão de oposição a Bashar Al-Assad