O globo, n. 31111, 11/10/2018. País, p. 4

 

Bolsonaro larga na frente

Marco Grillo

11/10/2018

 

 

Candidato do PSL tem 16 pontos de vantagem sobre Haddad, do PT

A primeira pesquisa de intenção de votos divulgada no segundo turno mostra que o candidato do PSL à Presidência, Jair Bolsonaro, larga com uma ampla vantagem, de 16 pontos percentuais, sobre seu adversário, Fernando Haddad (PT). Segundo o Datafolha, o capitão da reserva tem 58% dos votos válidos, contra 42% do ex-prefeito de São Paulo — a conta exclui os votos brancos e nulos.

Em relação aos votos totais, Bolsonaro alcançou 49%, contra 36% de Haddad. Brancos e nulos somaram 8%, enquanto 6% não souberam responder.

A série histórica do Datafolha mostra que esta é a maior vantagem que um candidato impõe sobre o outro na largada do segundo turno de uma eleição presidencial desde 2002. Naquela ocasião, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) alcançou 64% dos votos válidos, contra 36% de José Serra (PSDB). As pesquisas anteriores também mostram que, para vencer a eleição, Haddad precisará de um feito inédito: nunca um candidato que iniciou a segunda etapa atrás do adversário conseguiu a virada — em 2014, Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB) estavam em empate técnico à esta altura, com o tucano à frente numericamente (51% a 49%).

No primeiro turno, Bolsonaro teve 46% dos votos válidos, enquanto Haddad chegou a 29%. De acordo com o Datafolha, o potencial do candidato do PSL cresceu, , em sua maioria, pelas adesões de eleitores que no primeiro turno escolheram Geraldo Alckmin (PSDB) e João Amoêdo (Novo). Entre os eleitores do ex-governador de São Paulo, 42% declararam que agora vão votar em Bolsonaro, enquanto 30% disseram que vão optar por Haddad. Em relação ao eleitorado de Amoêdo, 49% afirmaram que preferem o candidato do PSL, e 18% sustentaram que vão escolher o petista.

No caso de Haddad, os percentuais mais expressivos de apoio vieram de eleitores de Ciro Gomes (PDT) e Marina Silva (Rede). Na parcela que escolheu o exgovernador do Ceará no primeiro turno, 58% agora afirmam que vão votar no petista, enquanto 19% preferem Bolsonaro. Já entre os eleitores de Marina, 37% pretendem escolher Haddad, e 18% disseram que vão migrar para o capitão da reserva. O PDT já declarou apoio a Haddad, mas ainda não há definição sobre o papel de Ciro no segundo turno.

Frente democrática

Em uma tentativa de deslocar o eixo da própria campanha para o centro e conquistar eleitores mais refratários ao discurso de esquerda, Haddad esteve ontem com políticos do PSDB e recebeu uma carta de apoio. Senador eleito pela Bahia, Jaques Wagner se integrou à coordenação petista e anunciou que vai procurar Ciro, Marina e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para a formação de uma “frente democrática”. Em outro

Haddad, em entrevista ao “Jornal Nacional”, afirmou que reviu a posição sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte e desautorizou declarações recentes do ex-ministro José Dirceu.

Na outra ponta, o PSL vai insistir na estratégia de colar em Haddad a rejeição ao PT, lembrando de escândalos de corrupção e da crise econômica do governo Dilma, entre outros temas. A artilharia já pode ser vista nas redes sociais e em declarações de Bolsonaro, e o mesmo tom será levado aos programas de televisão.

O recorte regional das intenções de voto apresenta o panorama que saiu das urnas no domingo. Bolsonaro lidera com larga vantagem no Sudeste, que tem 44% do eleitorado (55% a 32% dos votos totais); e também está à frente no Sul (60% a 26%), Centro-Oeste (59% a 27%) e Norte (51% a 40%). Haddad está na dianteira apenas no Nordeste, onde tem 52% dos votos totais, contra 32% do adversário. Bolsonaro também pretende ganhar mais espaço no eleitorado nordestino e tem repetido que não vai acabar com o programa Bolsa Família, no qual cerca de 7 milhões de famílias do Nordeste estão inscritas.

Empate entre mulheres

No eleitorado feminino, Bolsonaro está numericamente à frente, mas em empate técnico com Haddad (42% a 39%). Já entre os homens, a vantagem do candidato do PSL é expressiva: 57% a 33%. O recorte por renda também evidencia os perfis distintos dos apoiadores de cada candidato: Bolsonaro chega a 62% das intenções de voto nas parcelas que ganham entre cinco e dez e acima de dez salários mínimos por mês, enquanto Haddad tem seu melhor desempenho entre os que têm renda familiar média mensal de até dois salários mínimos. Entre os eleitores com curso superior, 58% apoiam Bolsonaro; já na parcela que cursou até o Ensino Fundamental, 44% declararam voto em Haddad. A vantagem do candidato do PSL é grande entre os evangélicos, segmento em que vários líderes religiosos anunciaram apoio a ele: 60% contra 26% de Haddad. Entre os católicos, a distância entre os dois candidatos é menor: 46% do capitão da reserva, e 40% do ex-prefeito de São Paulo.

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A tarefa hercúlea de Haddad

Paulo Celso Pereira

11/10/2018

 

 

Os 16 pontos que separam Jair Bolsonaro de Fernando Haddad na pesquisa Datafolha são oceânicos, especialmente em uma eleição polarizada como a atual. Ficou evidente, pelos resultados do primeiro turno, que muitos eleitores de Marina Silva e Geraldo Alckmin anteciparam para o domingo passado seu voto útil. Ao sair das urnas com 46%, contra 29% de Haddad, Bolsonaro colocou um pé no Palácio do Planalto. Hoje, começou a mover o outro.

Desde a redemocratização, nenhum candidato a presidente conseguiu vencer o segundo turno após sair atrás no primeiro. A eleição mais estreita de nossa história foi a de 2014, quando Dilma Rousseff sagrou-se vencedora com 51,6% dos votos. Nela, Aécio Neves conseguiu saltar numericamente à frente da petista nas duas primeiras pesquisas Datafolha do segundo turno, mas empatado na margem de erro, com 51% a 49%.

A virada da petista nas sondagens ocorreu nos dez dias finais de campanha. Ainda assim, em nenhum momento, mais de seis pontos os separaram. Ou seja, no auge da ácida campanha petista de desconstrução do tucano, Dilma conseguiu crescer quatro pontos e o tucano perdeu quatro — isso é apenas a metade do que Haddad precisa agora.

No primeiro turno, o candidato do PSL preservou-se do contraditório, auxiliado pelo fato de ter ficado semanas convalescendo após o atentado de Juiz de Fora. Agora, quando apenas duas forças estão na corrida, e ele está em casa concedendo entrevistas diárias, será mais difícil fugir do debate.

O principal ponto de fragilidade do capitão reformado hoje está no debate econômico. Desde o início da campanha, o candidato divide-se entre dois personagens antagônicos: ora avisa que não entende nada da área e que delegará sua condução para o ultraliberal Paulo Guedes, ora retoma sua antiga agenda de defesa das corporações e das estatais. Desorientado, o mercado financeiro tem vivido dias de cassino.

Ainda assim, a vantagem exibida ontem na pesquisa Datafolha deixa claro que será hercúlea a tarefa de derrotar Bolsonaro. A histórica militância do PT é hoje visivelmente menor que a massa de adoradores do deputado, as estruturas partidárias não tem mais o peso de outrora e a eleição foi marcada por um sentimento de renovação. A única trilha que ainda parece aberta é a de um eventual erro de grandes proporções de Bolsonaro e de seu entorno —o que, pelo histórico recente, não é de todo desprezível.