Título: Cristina apela à ONU
Autor: Luna, Thais de
Fonte: Correio Braziliense, 15/06/2012, Mundo, p. 19

Presidente marca os 30 anos da derrota argentina na guerra com discurso ao Comitê de Descolonização das Nações Unidas, no qual insistiu em chamar Londres para negociações

A governante argentina assiste à reunião na sede das Nações Unidas: %u201CColonialismo anacrônico%u201D na disputa sobre o arquipélago

A presidente Cristina Kirchner marcou o 30º do fim da Guerra das Malvinas, com a retirada das tropas argentinas do arquipélago e a restauração do domínio britânico, para reiterar diante do Comitê de Descolonização das Nações Unidas a reivindicação da soberania sobre o território. Acompanhada de uma comitiva numerosa, integrada por quase todos os partidos políticos, ela foi a primeira chefe de Estado a comparecer ao encontro, em Nova York (EUA). Horas antes da reunião, jornais de todo o mundo — inclusive os principais do Reino Unido — publicaram como anúncio pago uma carta na qual Cristina denuncia a situação das ilhas como um "caso colonial anacrônico". No texto, intitulado "Vamos pôr um fim ao colonialismo acatando resoluções das Nações Unidas", a presidente pede que os dois países negociem uma saída pacífica para o impasse. Nas Malvinas, que os britânicos e os nativos chamam de Falkland, os 3 mil moradores das ilhas festejaram a "libertação" com uma cerimônia religiosa e um desfile militar, debaixo de chuva e neve.

"A única coisa que estamos pedindo é que se sentem para negociar", disse Cristina, de forma enérgica. "Faço esse pedido pelo direito humanitário", insistiu. A presidente discursou acompanhada de ministros, de representantes dos principais partidos políticos e de veteranos da guerra, a fim de mostrar que toda a Argentina reivindica a soberania nas ilhas. Antes de comparecer ao comitê, ela se reuniu com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, que reconheceu o "forte apelo regional" da situação.

Federico Merke, pesquisador de ciências sociais da Universidade de San Andrés, na Argentina, acredita que a presidente fez a coisa certa ao recorrer à ONU. "Mas que não espere muitas mudanças. Sabemos que os britânicos vão permanecer em silêncio sobre a disputa, que vai ficar para os próximos anos", afirmou ao Correio. De acordo com o professor de geopolítica Klaus Dodds, da Universidade de Londres, era previsível a ida de Cristina ao comitê, no período mais tenso das relações com o Reino Unido desde 1982. Ele disse à reportagem que a Argentina está determinada a dificultar as coisas para os britânicos e para as ilhas.

Mike Summers, um dos oito integrantes da Assembleia Legislativa das Falkland, participou do debate no comitê e expôs a visão dos kelpers, como são chamados os nativos. "A autodeterminação é um direito universal e esperamos que os membros do comitê foquem no bem estar dos habitantes das ilhas", disse Summers à imprensa. A assembleia, que responde pelo autogoverno das ilhas, decidiu convocar para o primeiro semestre de 2013 um referendo sobre o estatuto do arquipélago.

O primeiro-ministro britânico, David Cameron, por sua vez, reafirmou o apoio aos kelpers e a recusa de Londres a negociar a soberania do território. "Isso não é um jogo de banco imobiliário, com nações trocando territórios entre elas. A questão é sobre o povo das ilhas determinando o próprio futuro", advertiu, em evento no edifício histórico Lincoln"s Inn. Em memória a 14 de junho de 1982, foi hasteada uma bandeira das Falkland na residência oficial do chefe de governo, na Downing Street. Segundo um porta-voz, a intenção foi "mostrar solidariedade aos habitantes das ilhas, que continuam a enfrentar ameaças de vizinhos".

Celebrações No arquipélago, a população homenageou os mortos no conflito em solenidades que contaram com a participação do secretário de Estado britânico para a América Latina, Jeremy Browne. Após uma missa na catedral de Port Stanley, a capital, veteranos do conflito fizeram uma parada pela avenida principal da cidade.

"A única coisa que estamos pedindo é que se sentem para negociar" Cristina Kirchner, presidente da Argentina

"Isso não é um jogo de banco imobiliário, com nações trocando territórios entre elas" David Cameron, primeiro-ministro do Reino Unido