Título: O infalível Lula se complica
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 18/06/2012, Política, p. 6

Conhecido no PT por ser visionário e detentor de grandes ideias, o ex-presidente vem se enrolando na indicação de chapas para disputar prefeituras este ano. Relações já estão desgastadas em três cidades: São Paulo, Recife e Fortaleza

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre foi considerado no PT um gênio político, alguém com sensibilidade e habilidade suficientes para enxergar além do que os demais correligionários poderiam perceber. Foi assim quando decidiu desprezar o PMDB, em 2002, para convidar Dilma Rousseff como ministra de Minas e Energia. Também foi considerado um mágico ao escolher a própria Dilma como candidata a presidente em 2009. Amparado em sua popularidade, elegeu a ex-chefe da Casa Civil e consolidou a percepção de que é infalível em suas análises. Essa infalibilidade, contudo, está em xeque e Lula, antes mítico, passou a ficar sobre pressão.

Três erros políticos foram identificados nos primeiros meses deste ano: em São Paulo, em Recife e em Fortaleza. Na capital paulistana, Lula impôs o ex-ministro da Educação Fernando Haddad como o candidato do PT à prefeitura. Atropelou as instâncias partidárias e pediu que a presidente Dilma convencesse a senadora Marta Suplicy a abrir mão de disputar as prévias internas. Marta concordou, mas não se engajou na campanha do colega.

Nas poucas vezes em que apareceu em público, criticou o pré-candidato petista. "Não basta apenas ser o novo", disse, durante cerimônia em que Lula recebeu o título de cidadão honorário de São Paulo. Durante uma grande festa organizada pelo PT para apoiar Haddad, no início deste mês, Marta nem sequer se deu ao trabalho de comparecer. "Estavam reunidos as 2, 3 mil pessoas, que tocam as campanhas do PT em São Paulo. Todo mundo ficou pasmo quando percebeu que Marta não iria", disse ao Correio um dos integrantes da campanha do ex-ministro.

Em Recife, o estrago pode ser ainda maior. Lula empenhou-se pessoalmente no cancelamento das prévias que deram a João da Costa o direito de concorrer à reeleição para prefeitura. Sob a alegação de que a disputa foi fraudada, partidários do secretário de Governo, Maurício Rands, pediram a anulação do pleito. A Executiva Nacional ratificou o pedido e escolheu o senador Humberto Costa como a terceira via.

O PT pernambucano sangrou de vez. Humberto Costa foi a São Paulo pedir a bênção de Lula para que a crise fosse estancada. Não deu certo. Como a cisão só aumenta, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, passou a analisar a possibilidade de lançar candidatura própria. "Estou fazendo tudo isso em respeito ao Eduardo, que é meu amigo, e em memória do avô dele. Mas as coisas nem sempre são fáceis", desabafou Lula recentemente a um petista próximo. "Estou fazendo isso para convencer o PSB a apoiar Haddad em São Paulo."

Na última sexta-feira, o PSB anunciou oficialmente o apoio a Haddad, com a indicação da deputada Luíza Erundina como vice. Mesmo assim, petistas acreditam que Lula não vai abandonar Humberto Costa depois do esforço para atropelar o partido. "Ele vai gravar mensagem de apoio para o horário eleitoral. A presença física está mais complicada por limitações de saúde", completou um petista.

Conciliador Considerado um dos fiéis escudeiros de Lula no PT, o deputado Devanir Ribeiro (SP) nega que o ex-presidente tome decisões de maneira precipitada. "Ele tem uma característica que mantém desde os tempos de sindicato: "ele ouve todas as partes envolvidas e, só depois disso, decide o que fazer. Mas, logicamente, Lula não é infalível", disse Devanir. O parlamentar recorda que Lula foi massacrado pela decisão de 1998, quando o partido descartou a candidatura de Vladimir Palmeira ao governo do Rio de Janeiro para apoiar Anthony Garotinho, hoje no PR, na época no PDT de Leonel Brizola.

Já em Fortaleza a prefeita Luizianne Lins, mais uma vez, desrespeitou o desejo da direção nacional e de Lula e lançou o secretário de Educação, Elmano de Freitas como pré-candidato, desagradando o governador Cid Gomes, que ameaça romper a aliança e lançar candidatura própria. Senador pelo Ceará graças ao apoio de Lula, José Pimentel espera que o ex-presidente reaja para conter a confusão no Estado. "O presidente Lula nunca se omite quando o PT precisa dele", declarou Pimentel.

Ele ouve todas as partes envolvidas e, só depois disso, decide o que fazer. Mas, logicamente, Lula não é infalível" Devanir Ribeiro (PT-SP), deputado