O globo, n. 31116, 16/10/2018. Economia, p. 17

 

PF indicia Abilio e ex-dirigente da BRF por fraude sanitária

Gustavo Schmitt

João Sorima Neto

16/10/2018

 

 

Relatório da Operação Trapaça pede que 44 pessoas sejam processadas; executivos negam irregularidades

O empresário Abilio Diniz, ex-presidente do Conselho de Administração da BRF, e Pedro Andrade de Faria, exdiretor global da companhia de alimentos, foram indiciados ontem pela Polícia Federal por suspeita de terem cometido crimes de organização criminosa, falsidade ideológica e estelionato. O indiciamento é fruto da investigação da Operação Trapaça, desencadeada em março deste ano para apurar supostas fraudes em laudos sanitários cometidas por funcionários e executivos da empresa, detentora das marcas Sadia e Perdigão.

Conforme antecipado pelo colunista do GLOBO Lauro Jardim, outras 42 pessoas foram alvo do indiciamento, entre elas o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) e ex-ministro da Agricultura Francisco Turra. Faria e outras pessoas ligadas à empresa foram presos preventivamente em março deste ano. A Operação Trapaça é um desdobramento da Carne Fraca, de 2017.

O indiciamento não significa culpa. O material da PF será encaminhado ao Ministério Público Federal, que poderá oferecer ou não denúncia à Justiça, se entender que há provas suficientes contra os indiciados. Eles só se tornarão réus se a Justiça receber a denúncia.

As investigações sustentam que cinco laboratórios credenciados pelo Ministério da Agricultura e funcionários da BRF fraudavam os resultados dos exames de amostras de alimentos produzidos pela empresa. O objetivo seria contornar requisitos sanitários específicos de países importadores dos produtos.

Para o delegado Maurício Moscardi Grillo, que conduz o caso, trocas de mensagens de WhatsApp comprovam que a direção da empresa tinha ciência do esquema. Ele cita mensagens trocadas entre Abilio e outros executivos da BRF, cujo teor revelaria “participação ativa”da cúpula da empresa no caso que envolveu a detecção de resíduo tóxico em carne de frango pelo governo chinês.

Na conversa entre Abilio e Pedro Faria, os executivos demonstram preocupação com o impacto da notícia de que a China havia suspendido a importação de carne contaminada da BRF. Faria defende uma posição mais reativa da empresa em relação à imprensa. Abilio responde que “enquanto pudermos não alimentar mais é melhor”.

Abilio rejeita acusação

A assessoria de Abilio informou, em nota, que o empresário não cometeu nenhuma irregularidade e que o relatório da PF não traz elementos que demonstrem qualquer desvio de conduta cometido por ele. A ABPA disse que está à disposição para esclarecer todos os fatos de forma transparente.

A BRF decidiu afastar preventivamente todos os funcionários citados no relatório da PF até que tudo seja esclarecido. Em nota, a companhia afirmou que é de interesse máximo da diretoria que os fatos relacionados às investigações das autoridades sejam esclarecidos em toda a sua profundidade e extensão.

A defesa de Faria informou que jamais houve determinação da diretoria da BRF para acobertar “quaisquer eventuais desconformidades relativas ao processo produtivo da companhia”. A gestora de recursos Tarpon, sócia da BRF e que tem Faria entre seus acionistas, não quis comentar.

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Ação policial acirrou disputa societária

16/10/2018

 

 

A chegada de policiais federais à casa do ex-presidente global da BRF Pedro de Andrade Faria, na manhã de 5 de março deste ano, agravou a crise societária que a empresa atravessava por causa de prejuízos de R$ 1,5 bilhão em dois anos. Os fundos de pensão Petros (dos funcionários da Petrobras) e Previ (do Banco do Brasil) pediram a saída do empresário Abilio Diniz da presidência do Conselho de Administração da empresa por ter indicado, juntamente com a gestora Tarpon, Faria e seu sucessor, José Aurélio Drummond, para a direção da companhia. As duas fundações têm 22% das ações da BRF, enquanto a Península, braço de investimentos de Abilio, tem 7%.

Após esticar o conflito com os acionistas, Abilio aceitou deixar o Conselho no fim de abril, para ser substituído por Pedro Parente. Este trocou o Conselho da Bolsa de São Paulo, a B3, pelo da BRF ainda acumulando a presidência da Petrobras. Na mesma época, Drummond pediu demissão. Em maio, em meio à greve dos caminhoneiros, Parente deixou a estatal e assumiu também a direção executiva da BRF, iniciando uma reestruturação.