O globo, n. 31110, 10/10/2018. País, p. 8

 

Maioria dos partidos libera filiados para decidir apoios

Cristiane Jungblut

Catarina Alencastro

Patrik Camporez

Amanda Almeida

10/10/2018

 

 

PTB de Roberto Jefferson adere a Bolsonaro; PSB fecha com Haddad, mas deixa livres seus candidatos em SP e DF

Em disputa marcada pelo choque de forças entre o antipetismo e o “ele não”, alguns dos principais partidos do Congresso decidiram ontem manter neutralidade no segundo turno, liberando seus filiados para optar entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT). Com a exceção do PTB, que declarou apoio formal ao ex-capitão e ao PSB, que fechou com Haddad, siglas do campo moderado — como PSDB, PP, PR, Novo e DEM —optaram por “manter o silêncio e deixar o palco vazio” para que o eleitor faça sua escolha, como justificou, em nota, uma das siglas ao isentar-se de escolher um lado no dia 28.

Em 2014, em uma eleição marcada pela velha polarização entre PT e PSDB, apenas o PSOL, que teve Luciana Genro como candidata, optou por ficar neutro no segundo turno entre Dilma Rousseff e Aécio Neves.

A onda conservadora, representada por Bolsonaro, que promoveu uma ampla renovaçãona política brasileira, provocou traições e adesões ao presidenciável do PSL antes mesmo do primeiro turno e foi ampliada coma sua vitória. Pressionados por candidatos nos estados, PP e PSD B anunciar amontem aposição de liberar seus filiados.

—Os nossos candidatos estão todos liberados. Quem quiser pode apoiar o Bolsonaro, quem quiser não apoia ninguém, se alguém quiser apoiar o PT, nós liberamos — disse Geraldo Alckmin.

Em reunião marcada para hoje, o DEM deve divulgar posição semelhante. O MDB também faz reunião hoje para decidir seu futuro. Único partido a aderir a Bolsonaro abertamente, o PTB do mensaleiro Roberto Jefferson, divulgou nota ontem elogiando as propostas do ex-capitão. Com diferentes quadros apoiando Bolsonaro desde o início da campanha, PP e PR liberaram suas bancadas. “O eleitor claramente enviou um recado ao país: quer tomar sua decisão sem que qualquer outro aspecto, que não os candidatos, sejam levados em consideração como critério de escolha. Isso significa que o eleitor quer o silêncio e o palco vazio de qualquer ruído ou informação que interfira na sua reflexão sobre qual candidato escolher”, disse o PP em nota.

Declaradamente contrários ao PT, o Novo, de João Amoedo, e o Podemos, de Alvaro Dias, descartaram ontem apoiar Haddad. O partido de Amoedo divulgou nota afirmando que não apoiará nenhum candidato. Dias avisou na internet que não vai apoiar os petistas, mas disse que o Podemos fará uma consulta popular sobre o caminho a seguir.

A candidatura de Haddad, que já tinha obtido o apoio do PSOL, conquistou ontem a adesão do PSB, mas não da forma como o partido de Lula desejava. A direção nacional do PSB declarou apoio ao petista, mas liberou os candidatos que estão no segundo turno em São Paulo e no Distrito Federal para decidirem quem apoiar. O PT esperava contar com os palanques nesses redutos para ampliar a campanha de Haddad, mas nem Márcio Franca, em SP, nem Rodrigo Rollemberg, no DF, pretendem levar o petista em suas campanhas.

No PDT, deve sair hoje a confirmação do apoio de Ciro Gomes a Haddad. Enquanto o PT espera uma ampla participação de Ciro na campanha, no entorno do pedetista a ideia é que ele faça atos defendendo que entre Bolsonaro e Haddad, o petista é a opção “menos pior”. Ciro tem dito a interlocutores que não deve se omitir neste momento e dará suas opiniões, entretanto não quer se envolver com a campanha petista, nem participar das decisões. Hoje será submetida à Executiva do PDT e às bancadas eleitas a sugestão de que o partido dê “apoio crítico” a Haddad.

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Legendas perdem força e poder de barganha

Maiá Menezes

10/10/2018

 

 

Os votos do primeiro turno das eleições indicaram a pulverização de pequenos partidos, que se ampliou em igual proporção ao enfraquecimento de legendas tradicionais como o MDB e o PSDB.

Com derrotas regionais inesperadas, parte dos partidos tradicionais decidiu, então, liberar seus deputados para escolher como se posicionar na segunda fase da disputa. O que em português claro corrobora o recado das urnas: perderam poder de barganha. As conversas no varejo, ao que parece, ditarão a nova lógica da relação ente o Legislativo e o Executivo.

É no varejo que Jair Bolsonaro (PSL) vem traçando sua estratégia de costura política, desde a escolha de seu candidato a vice, general Hamilton Mourão, às vésperas do início da campanha eleitoral em agosto. “No varejo temos aproximadamente 350 parlamentares que querem estar conosco”, disse, no dia seguinte ao primeiro turno, reiterando que não fará negociação partidária.

Por fora da estrutura tradicional das grandes legendas, e sem esclarecer o que se debate neste varejo, o candidato que chegou ao segundo turno com 46,03% dos votos válidos, turbinou um partido que era nanico, e sinaliza estar disposto a um beija-mão individual de novos aliados, unidos por ora pelo recrudescimento do discurso de segurança e por uma agenda conservadora de costumes.

Fernando Haddad (PT) agora começa a rever posicionamentos históricos de seu partido para atrair também nomes: Ciro Gomes (PDT), adversário no primeiro turno, e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, como informa nesta edição o colunista Bernardo Mello Franco. Tenta mostrar alguma solidez, diante da diferença de votos com que chegou ao segundo turno (29,28%) contra Bolsonaro.

A governabilidade em 2019 tende, pelo visto, a ser construída em torno de pessoas. Não mais de grandes estruturas partidárias. Num plebiscito inesperado, as urnas deram um sonoro não a elas.

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Entidades empresariais cobram clareza sobre ajuste

João Sorima Neto

10/10/2018

 

 

Para setor produtivo, Bolsonaro e Haddad precisam esclarecer propostas de reformas e de redução de gastos públicos

Definido o segundo turno da eleição presidencial, entidades que representam o setor produtivo avaliam que os dois candidatos mais votados precisam tornar suas propostas mais claras. Há dúvidas, por exemplo, sobre como vão conduzir o ajuste fiscal ou como vão levar adiante a reforma da Previdência, considerada essencial para reduzir os gastos públicos. Algumas dessas entidades pretendem se reunir com Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), ou com seus assessores econômicos, para entender melhor os detalhes dos programas de governo.

— O diabo agora mora nos detalhes. As agendas dos dois candidatos convergem em temas como retomada do crescimento econômico, ajuste fiscal e investimento em infraestrutura. Mas como é o ajuste fiscal de cada um? Como pretendem retomar o investimento público em infraestrutura com o ajuste em curso? Queremos esclarecer essas dúvidas — diz Venilton Tadini, presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib).

A associação já se reuniu com os vices de Bolsonaro, general Hamilton Mourão, e de Haddad, Manuela D'Ávila, antes do primeiro turno. A ideia agoraé marcar um encontro com os próprios candidatos ou com representantes de ambos para esmiuçar os detalhes de cada proposta. A Abdib é apartidária e não declarou apoio a nenhum deles, mas entregou uma agenda a ambos com sugestões para aumentar o investimento privado em infraestrutura (que atualmente fica em 0,8% do Produto Interno Bruto), garantia de segurança jurídica nos contratos assinados pela iniciativa privada, agências reguladoras independentes e maior celeridade nas questões ambientais quando se trata de desapropriações.

— Países como Colômbia, Peru e México destinam uma parte maior de seu orçamento para infraestrutura do que o Brasil. No ano passado, por exemplo, o investimento público ficou em apenas 0,7% do PIB. Temos a carga tributária mais alta do mundo, então é preciso mudar. É preciso aumentar o investimento privado na infraestrutura, mas também o público — diz o presidente da Abdib.

Para José Velloso, presidente executivo da Abimaq, que reúne empresas do setor de máquinas e bens de capital, falta clareza tanto nas propostas de Haddad quanto nas de Bolsonaro. A prioridade, na opinião de Velloso, é equacionar o desequilíbrio fiscal, o que está ligado a uma reforma da Previdência. Além disso, diz, é necessário implementar uma agenda de competitividade, o que exigiria tanto reforma tributária como abertura comercial, além da redução de juros para os clientes que estão na ponta, empresas e consumidores.

— A reforma tributária é outra incógnita. Aumentar ou reduzir alíquota não é reforma. O sistema tributário continuará complexo — afirma Velloso.

O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale, diz que o setor produtivo tem tido pouco contato com as campanhas de Bolsonaro e Haddad e que há muita incerteza sobre as políticas que ambos preveem implantar.

— É uma incógnita. Esperamos que nos debates do segundo turno a gente tenha mais tempo para entender e possa aprofundar mais. A coisa que é convergente é que os dois programas estão preocupados com a geração de empregos no país.

O setor automotivo teve conversas reservadas, e esparsas, com ambas as campanhas durante o primeiro turno. No caso de Bolsonaro, elas teriam sido superficiais, segundo o executivo.