Título: Documento ambiental é fechado e recebe críticas
Autor: Mascarenhas, Gabriel
Fonte: Correio Braziliense, 20/06/2012, Brasil, p. 10

Países concluem o texto que será apresentado aos chefes de Estado sem definir metas. Versão não agradou a sociedade civil Rio de Janeiro — Tudo combinado, quase nada resolvido. Essa foi a tônica do documento aprovado ontem pelos 193 países membros da Organização das Nações Unidas (ONU) que participam da Rio+20. A versão final, elaborada por embaixadores e que será entregue aos chefes de Estado hoje, não traz metas e proposições de desenvolvimento sustentável, como se esperava. A falta de consenso, estimulada pela crise econômica europeia e a inflexibilidade de parte dos países ricos, permitiu apenas um texto que reafirma compromissos acertados anteriormente, define conceitos relativos à sustentabilidade e estabelece prazos para novos debates, frustrando as expectativas da sociedade civil. A Presidência da República, entretanto, já acenou com possibilidade de mudanças no documento.

A conclusão dos trabalhos foi comemorada pela diplomacia brasileira, que esteve à frente das negociações desde sábado. Ministro das Relações Exteriores, o chanceler Antonio Patriota não escondeu que a versão final traduz o que foi possível fazer. "O resultado não deixa de ser satisfatório. Recebemos um texto (na sexta-feira)) com menos de 40% de consenso. Até ontem (anteontem), a expectativa era de ter um texto ou não ter um texto, e temos um texto fechado", argumentou.

O discurso otimista só fraquejou quando Patriota foi perguntado, durante a entrevista coletiva concedida ontem no Riocentro, sobre a exclusão do termo "direitos" reprodutivos das mulheres, que diz respeito a autonomia delas sobre gestação de filhos. "Há as ambições do Brasil e o papel do Brasil de buscar consenso, como negociador. Fiquei frustrado. Gostaria que o texto tivesse incluído (a expressão)", admitiu, sem aceitar, no entanto, expor outros pontos que desagradaram o governo.

O fato de o documento não conter determinações a serem cumpridas pelas nações e deixar para o futuro decisões importantes, como a origem do financiamento de medidas socioambientais, não incomodou a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira. "Estou satisfeita por não ter que negociar até domingo de manhã. É a primeira vez que vejo uma conferência cumprir seus prazos", afirmou, depois de parabenizar publicamente o staff brasileiro que participou das discussões.

Anunciado o acordo em torno do documento, ONGs especializadas em meio ambiente criticaram duramente o que enxergaram como falta de audácia dos negociadores. "O governo brasileiro considera um sucesso ter apresentado um documento vazio, ter feito o dever de casa. Para meu filho, eu digo que prefiro que ele não faça a lição de casa a entregar algo malfeito. Esqueceram que o papel que eles assinaram diz respeito à vida das pessoas que habitam este planeta. Não conseguiram dar uma resposta ao mundo que queremos e precisamos", disparou o diretor executivo do Greenpeace no Brasil, Marcelo Furtado.

O coordenador da WWF Brasil, Carlos Rittl, classificou o documento como "minguado". "Não definiu decisões e compromissos, criou apenas datas para novas discussões, numa velocidade bem inferior à urgência dos problemas. Enquanto na ECO-92, sabia-se a dimensão dos desafios e fechou-se acordos que vigoram até hoje, a Rio+20 não deu novos passos, mesmo estando diante de desafios ainda mais complexos", comparou.

Insatisfação O descontentamento da sociedade civil cairá no colo dos chefes de Estado, que se reunirão no Riocentro até sexta-feira, e têm autonomia para reabrir as negociações. Dizendo que os comandantes não virão ao Rio apenas participar de um ritual, o ministro da secretaria-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, acha que o texto pode ser sofrer mudanças. "Críticas da sociedade civil têm de ser consideradas. Não vamos dar esse texto por definitivo, as negociações continuam", sinalizou Carvalho. Ao chegarem, os líderes mundiais receberão sugestões vindas dos Diálogos do Desenvolvimento Sustentável, mesas de discussão formadas por especialistas em meio ambiente, e da Cúpula dos Povos.

"É a primeira vez que vejo uma conferência cumprir seus prazos" Izabella Teixeira, Ministra do Meio Ambiente