O globo, n. 31108, 08/10/2018. País, p. 19

 

Apoio de ex-colega de farda impulsionou ex-juiz

Chico Otavio

Vera Araújo

08/10/2018

 

 

Apontado por colegas de magistratura como ‘figura polêmica’, que sempre buscou papel maior que o cargo, Wilson Witzel contou com a força de Bolsonaro para a arrancada de última hora que o levou à disputa com Paes

O assalto anfíbio é a mais complexa manobra da Marinha brasileira. Batizada de “Operação Dragão”, simula um cenário de conflito com o desembarque da tropa em Marataízes, no Espírito Santo, com o objetivo de neutralizar aforça adversária e conquista ruma porção do litoral do país inimigo. Como tenente dos Fuzileiros Navais, Wilson Witzel, de 1988 a 1992, participou de quatro edições da operação. Ontem, quando a Justiça Eleitoral começou a totalizar os votos, Witzel recordou os velhos tempos. Sua ida ao segundo turno é uma espécie de desembarque anfíbio na política tradicional.

Aos 50 anos, esse ex-militar teve o apoio decisivo de um ex-colega de farda, o presidenciável Jair Bolsonaro, para uma arrancada de última hora que o levou à disputa com o ex-prefeito Eduardo Paes (DEM) no próximo dia 28. A experiência política deste paulista de Jundiaí, de sobrenome alemão, não chega ater oito meses, desde que abandonou a toga para filiarse ao PSC e disputar o governo fluminense.

Como não tinha a opção de afastar-se, Witzel foi obrigado a pedira exoneração da carre irade juiz federal, em fevereiro, para concorrer no Rio. Um caminho sem volta, após 17 anos de carreira estável. Mais do que enfrentar adversários experientes, o ex-magistrado disse que o momento mais difícil da campanha foi contar à mulher, Helena, que abandonara o Judiciário. Aflito, preferiu dar a notícia só depois de entregar a carta de exoneração.

Aprovado no sétimo concurso para a magistratura federal, em 2001, Witzel cumpriu um discreto papel na Justiça. Passou por uma vara de Execuções Fiscais em Vitória, foi substituto na 8ª Vara Federal Criminal do Rio, da juíza Valéria Caldi, atuou em turmas recursais de juizados especiais — causas estimadas em até 60 salários mínimos —e foi titular da 6ª Vara Cível no Rio, seu último cargo.

Colegas do Judiciário e outros operadores do Direito que conviveram com Witzel classificam o ex-juiz como “figura polêmica”, que sempre buscou um papel maior do que o oferecido pelo cargo. Pelo menos duas fontes contam que Witzel fazia questão de que as pessoas ficassem de pé quando entrava de toga nas sessões. Vez por outra, contam os ex-colegas, ele “soltava algumas frases controversas” nestas audiências. Nada, porém, que causasse questionamentos quanto à sua conduta.

Na carreira como juiz, uma das decisões de que mais se orgulha foi autorizara infiltração de uma gente no esquema de corrupção na Polícia Rodoviária Federal, no Rio, em 2004, para colher provas que desencadearam a operação “Poeira do Asfalto”, que prendeu quase metade dos policiais da corporação no estado. Embora tenha passado pouco tempo em varas criminais, Witzel elenca as decisões na área penal como as mais relevantes da carreira, entre elas a prisão de uma quadrilha de fraudadores da Previdência em Itaperuna, no Noroeste do estado.

Doutorando em política

Além da carreira militar, Witzel trabalhou para uma empresa de tecnologia educacional, a Prend, atuou como servidor da prefeitura carioca e foi defensor público por quatro anos (19982001), atuando no Tribunal do Juri em Nilópolis. É doutorando em Ciência Política, e mestre em processo Civil e professor de Direito Penal Econômico.

De duas semanas para cá, amigos do candidato montaram uma rede de apoio pelo WhatsApp. Desembargadores, juízes e policiais, numa espécie de corrente, enviaram uma enxurrada de mensagens coma apresentação do novato, estimulados pela pesquisa do Data folha feita no último dia 5, em que o ex-juiz Witzel e Romário aparecem empatados com 17%.

Naquela altura, os organizadores já imaginavam que seria possível ultrapassar o ex-prefeito do Rio.

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Contra azarão não há discurso formado

Thiago Prado

08/10/2018

 

 

O governador Luiz Fernando Pezão (MDB) recebeu o pedido de um amigo pouco antes do início da campanha eleitoral: um juiz que gostaria de se candidatar este ano ao seu cargo queria conhecê-lo. Portas abertas do Palácio

Guanabara, Wilson Witzel explicou ao emedebista que largara a magistratura para realizar o sonho de entrar na política. Pezão ressaltou não entender o motivo de deixar uma carreira estável para entrar em uma eleição incerta.

Ao fim do encontro, Witzel fez outro pedido: “Quero conhecer a minha futura residência oficial”, disse, em referência ao Palácio Laranjeiras, onde Pezão e sua mulher moram atualmente. Dias depois, levou a esposa e três filhos para conhecer o local em um jantar.

A confiança aleatória do ex-juiz também foi apresentada a Anthony Garotinho e Romário antes da campanha começar. Witzel chegou a propor que ambos largassem a disputa e declarassem apoio a ele.

A proposta inusitada — principalmente porque Garotinho e Romário sempre estiveram à frente de Witzel em todas as pesquisas da campanha —foi rechaçada.

Os episódios com Pezão, Garotinho e Romário foram tratados com ironia pelos três em conversas posteriores com interlocutores. Witzel foi claramente subestimado. Abertas as urnas ontem, ele agora está no segundo turno contra Eduardo Paes. Nos últimos dias, atropelou adversários e multiplicou por dez seu índice de intenção de votos. A verdade é que o discurso pró-Bolsonaro emplacou avassaladoramente.

Witzel passou a ser um oponente que Paes jamais imaginara enfrentar. O ex-prefeito havia direcionado toda a sua estratégia para ter Garotinho ou Romário como adversários em um segundo turno. Contra o ex-governador, exploraria a sua rejeição em metade do eleitorado e o fato de ter sido preso três vezes recentemente. Contra Romário, focaria na falta de preparo exibida em debates de TV e na incapacidade do endividado senador administrar as próprias finanças.

Contra o azarão não há discurso formado até o momento. Já Witzel tem a sua pegada pronta. No sábado, ao fechar seu último dia de campanha, o candidato disse que “os eleitores indecisos estão olhando quem são os candidatos e escolhendo um ex-juiz e não os réus'”. Ao GLOBO, em agosto, afirmou que em seu governo “bandido com fuzil será abatido”. Em tempos de Lava-Jato e de indignação com a violência, não será simples desconstruí-lo.

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Senado terá Flávio Bolsonaro e Arolde de Oliveira

Juliana Castro

08/10/2018

 

 

Filho de presidenciável do PSL somou 31,37 % dos votos válidos; candidato do PSD trava disputa acirrada com Cesar e leva segunda vaga

Na dianteira desde o início da apuração, o deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL), filho do presidenciável Jair Bolsonaro, obteve 31,36% dos votos válidos com 99% das urnas apuradas e foi eleito senador pelo Rio. A segunda vaga ficou com Arolde de Oliveira (PSD), que somou 17,06% .

Ao longo da apuração, Arolde travou uma disputa acirrada com o o vereador e ex-prefeito do Rio Cesar Maia (DEM), terceiro colocado, com 16,67%. Cesar Maia começou a apuração em segundo lugar, mas, com mais da metade das urnas apuradas, o candidato do PSD virou e ficou apenas 228 votos na frente do exprefeito. A partir de então, só foi aumentando a diferença. Arolde não aparecia nas primeiras colocações nas pesquisas de intenção de voto. No Datafolha de anteontem, seu percentual era de 9% e no Ibope, também de anteontem, somava 8%. Na boca de urna do Ibope, chegou a 14% contra 18% de Cesar Maia.

Apoio dos Bolsonaro

Arolde recebeu apoio da família Bolsonaro. Na campanha, Flávio e Jair pediam que seus eleitores dessem o segundo voto para o Senado para Arolde.

Um dos principais integrantes da linha de frente de articulações pró-Lula, o senador Lindbergh Farias (PT) não conseguiu a reeleição e ficou em quarto lugar, com 10,17% dos votos.

O deputado federal Chico Alencar (PSOL) ficou em quinto lugar, somando 9,17% dos votos válidos. Quem também buscava a reeleição era o senador Eduardo Lopes (PRB), que era suplente e assumiu depois que Marcelo Crivella (PRB) renunciou para assumir a prefeitura do Rio. Com 3,64% dos votos válidos, Lopes , ligado à Igreja Universal, ficou na sexta colocação, apesar dos pedidos de voto por parte de Crivella e de sua influência entre o eleitorado evangélico.

Aliado de Marina Silva, o deputado federal Miro Teixeira (Rede) recebeu 3,09% e ficou em sétimo lugar. Miro fazia campanha ao lado de Romário (Podemos), que chegou a gravar programas eleitorais com ele.

Pastor Everaldo (PSC) somou 2,58% dos votos válidos e ficou em oitavo. Ele não conseguiu embarcar no êxito do colega de partido Wilson Witzel, que surpreendeu e desbancou os favoritos, chegando ao segundo turno na disputa pelo governo do Rio.

José Bonifacio (PDT) obteve 2,24%, Aspasia (PSDB), 1,78%; e Mattos Nascimento (PRTB), 1,25 %. Com menos de 1% ficaram Marta Barçante (PCB), Cyro Garcia (PSTU), Gabrielle Burcci (PMB) e Samantha Guedes (PSTU). Os votos válidos somaram 13,96 milhões e os em branco e nulo foram 4,9 milhões.