O globo, n. 31106, 06/10/2018. País, p. 10

 

Aliados apontam erros da campanha de Alckmin

Cristiane Jungblut

06/10/2018

 

 

Senador tucano afirma que ex-governador falhou ao deixar de se caracterizar como antipetista; falta de apoio no próprio partido em São Paulo também é apontada como motivo para resultado ruim nas pesquisas

A dois dias da eleição, em meio à debandada de aliados do presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB), a campanha tucana começa a fazer uma espécie de balanço dos erros cometidos ao longo da corrida ao Palácio do Planalto. Com o maior tempo de propaganda no horário eleitoral entre todos os candidatos, Alckmin terminou a campanha em rádio e TV estacionado em quarto lugar nas pesquisas, com 8% das intenções de voto no Datafolha. O fraco desempenho do tucano é visto por aliados como um resultado da radicalização deste pleito, marcado pela rejeição do eleitorado à política tradicional.

Para aliados próximos do ex-governador, a estratégia de comunicação não conseguiu apresentar o tucano como o grande candidato antipetista. Parte do tucanato acredita que a campanha errou ao atacar de forma contumaz o candidato do PSL, Jair Bolsonaro, e não apenas o PT de Fernando Haddad.

Um dos partidários dessa análise dentro do PSDB é o senador Cássio Cunha Lima (PB). Para ele, Alckmin tem as melhores qualidades para ser o presidente do país, mas pagou o preço pelo erro de estratégia.

— O erro de estratégia foi deixar de se caracterizar como o antipetista. Existe um sentimento de parcela significativa das pessoas sobre valores de família, da necessidade de redução de carga tributária que Alckmin também representa, mas as pessoas caracterizaram esse sentimento na candidatura de Bolsonaro, quando ele passou a ser o intérprete desse sentimento. E a campanha acabou batendo neste sentimento e não no candidato de carne e osso. E isso ofendeu os nossos eleitores —disse Cunha Lima. Ex-governador de São Paulo, Alckmin também teria sofrido, na avaliação de seus apoiadores, com o desgaste provocado por 16 anos de governo tucano no estado onde imaginava conseguir obter os votos necessários para chegar ao segundo turno. O desgaste da imagem do PSDB, provocado principalmente pelos episódios de corrupção envolvendo obras em São Paulo e o envolvimento do senador Aécio Neves na delação da J&F, também contribuíram para o mau desempenho. Dentro do núcleo da campanha, dirigentes como o presidente nacional do DEM, ACM Neto, incentivaram Alckmin a atacar Bolsonaro, a ser agressivo. O próprio ACM já teria admitido o fracasso da estratégia.

Fogo amigo

Integrantes de outros partidos da aliança também criticam o fraco desempenho de Alckmin em São Paulo. O PSDB, representado na disputa estadual na candidatura de João Dória, não teria se empenhado pela candidatura, que perdeu terreno para o voto “Bolsodoria”, dobradinha que o eleitor paulista indica fazer ao escolher o tucano e Bolsonaro amanhã. O deputado Guilherme Campos (PSD-SP), da direção do partido, disse que ficará com Alckmin até o fim, mas reconhece o movimento dos eleitores.

— O eleitor do PSDB em São Paulo está migrando para o 17. É um movimento do eleitorado — disse o deputado, em referência ao número de Bolsonaro.

Embora aliados já estudem o discurso a ser feito, caso o tucano fique realmente fora do segundo turno, Alckmin continua apostando no mantra de que a “eleição que vale é a de domingo". Sobre as traições de aliados, que declararam votos em Bolsonaro já no primeiro turno, o tucano repetiu, anteontem, a máxima de Mário Covas, ex-governador de São Paulo e seu mentor político, de que, “na política, não se obriga, se convence". —O eleitor que vai decidir o seu voto. Eu não mudo. O que vai valer é o domingo, a eleição. Política não se obriga, se conquista — disse Alckmin. Alckmin sempre acreditou no discurso de que uma virada aconteceria na campanha, mas o seu entorno tinha dificuldades para acreditar na hipótese. O ex-governador decidiu focar essa reta final no discurso de que tem experiência para governar.

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Marina chega ao fim da disputa com futuro incerto

Maria Lima

Jeferson Ribeiro

06/10/2018

 

 

Isolada, ex-senadora soma 4% das intenções de voto; para companheiros de partido, candidata se viu obrigada a concorrer

Os marineiros bem que tentaram convencer Marina Silva (Rede-PV) que essa não seria uma eleição para ela. Mas, determinada e acreditando que podia ter chegado sua hora como terceira via de um país dividido, ela insistiu em se candidatar à Presidência pela terceira vez. Ousou até mesmo investir na suavização da imagem e do figurino: abandonou o xale, arriscou um penteado mais moderno com um cabeleireiro argentino, fez tratamento com fonoaudiólogo para empostar a voz, mas não foi capaz de criar um novo discurso para enfrentar a radicalização da disputa de extremos e ficou no limbo entre a esquerda e o centro. Completamente isolada junto com seu vice, Eduardo Jorge (PV), e com seu capital eleitoral derretendo, a derrota, desta vez, poderá ter um gosto mais amargo. Na reta final entre os nanicos com 4% de intenções de voto, Marina arrisca até mesmo o futuro de seu partido, a Rede Sustentabilidade, e sai desta disputa com um futuro incerto, muito enfraquecida, para uma quarta candidatura ao Planalto. Listada como uma das 50 mulheres mais importantes do Mundo, Marina conseguiu votações surpreendentes em 2010, pelo PV, com 19,6 milhões de votos, e, embalada pela comoção da morte de Eduardo Campos, no PSB, atingiu seu ápice, com 22,1 milhões de votos em 2014. Mas com cerca de 4% das intenções de votos este ano, estreando na Rede em quinto lugar nas pesquisas, Marina já perdeu cerca de 15 milhões de eleitores, desidratou o apoio entre evangélicos e caminha para sair dessa disputa com sua pior campanha .

Quadro fragmentado

O coordenador de programa de governo da Rede, João Paulo Capobianco, diz que quando a ex-senadora estava debatendo a candidatura alguns companheiros recomendaram que ela não concorresse. Esses marineiros argumentavam que pragmaticamente esta eleição não tinha o perfil para Marina ser bem-sucedida, porque haveria um quadro fragmentado de candidaturas, principalmente no centro. — Ela considerou que era uma questão de responsabilidade política concorrer. Não era uma questão pragmática. Se ela se abstivesse neste momento, significaria algo que ninguém perdoaria — contou Capobianco.

Para ele, mesmo tendo do seu lado ativos que, pelo menos em teoria, deveriam atrair os eleitores, Marina enfrentou uma “conjuntura política” adversa, porque o eleitorado está “com raiva” e em busca de soluções imediatistas e propostas populistas, traços que a candidata da Rede não tem. — E o Bolsonaro conseguiu se colocar como defensor da Lava-Jato e antipolítico, o que criou esse fenômeno e construiu esse quadro eleitoral que temos —argumentou. Marina , entretanto, não joga a toalha e acredita numa virada com sua campanha de “Davi contra Golias” ou do “tostão contra o milhão”. Os poucos aliados ficaram ao lado de Marina até o fim , mas não arriscam a apostar se ela teria fôlego para uma quarta candidatura a presidente em 2022. —Se Marina não se eleger, o futuro será ditado pelo desempenho do eleito. A próxima eleição poderá ter um presidente candidato à reeleição. Até agora, todos se reelegeram —avalia o deputado Miro Teixeira, candidato ao Senado. Marina se colocou como opção de esquerda para disputar com Haddad e Ciro Gomes (PT), parte do espólio de Lula. Investiu no Nordeste, mas com poucos recursos e estrutura partidária, isso não aconteceu. Um dos pontos fracos de Marina, criticado por eleitores e especialistas, é sua ausência nos debates políticos entre uma eleição e outra. A falta de base política e a imagem de frágil para assumir as rédeas do governo num momento de crise também ajudar na debandada dos eleitores. Para o cientista político Carlos Melo, professor do Insper, o futuro de Marina é incerto e não crê em uma quarta candidatura ao Planalto.

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Ministério Público planeja pedido de resposta por mentira no Whatsapp

Vinicius Sassine

06/10/2018

 

 

Ministério da Justiça afirma ser possível impedir propagação de arquivos que contenham ‘fake news’; PT já pediu providências por ataque a Haddad

O Ministério Público Eleitoral planeja para o segundo turno da eleição presidencial — caso a disputa não se encerre já no primeiro turno, no domingo — acionar o WhatsApp para que adote procedimentos que permitam um direito de resposta a “fake news” propagadas pela plataforma. A iniciativa seria totalmente inédita nesta disputa, uma vez que, até agora, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não deliberou sobre nenhum caso envolvendo notícias falsas espalhadas pelo WhatsApp, segundo fontes ouvidas pela reportagem. O aplicativo tem uso maciço no Brasil, com 120 milhões de usuários, e é a ferramenta mais usada para compartilhar notícias sobre política e eleições, segundo o Datafolha. Nesta eleição presidencial, as mentiras espalhadas pelo WhatsApp vêm dando o tom da disputa. O primeiro caso que pode levar o Ministério Público a cobrar um direito de resposta via WhatsApp é o que envolve o candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad. Na última quarta-feira, Haddad acusou a campanha de Jair Bolsonaro (PSL) de espalhar “fake news” a respeito de sua família e de sua atuação no Ministério da Educação (MEC), quando foi ministro. O entendimento na Procuradoria Geral Eleitoral, que atua junto ao TSE, é que o WhastApp pode rastrear a distribuição desse tipo de material, apesar da criptografia que garante o sigilo dos arquivos compartilhados. Quando um vídeo viraliza, por exemplo, o WhatsApp registra o arquivo numa espécie de biblioteca virtual, segundo informações levadas ao Ministério Público. Por isso, o entendimento é que seria possível um rastreamento da “fake news” espalhada pelos milhares ou milhões de celulares.

Rastramento

Um documento elaborado pelo Ministério da Justiça, com a finalidade de servir de base para a suspensão do envio de “fake news" pelo WhatsApp, concluiu ser possível impedir a propagação desses arquivos. Conforme o documento, “é possível interromper o encaminhamento sucessivo de um arquivo de mídia mesmo sem haver acesso ao conteúdo".

O WhatsApp costuma argumentar que as conversas entre os usuários têm “criptografia ponto a ponto", como lembra o documento do Ministério da Justiça, mas “basta apenas identificar a URL do arquivo encriptado e não o valor ‘hash’ da mídia propriamente dita". O documento sugeriu a criação de um grupo no aplicativo exclusivamente para o encaminhamento de “fake news".