O Estado de São Paulo, n. 45699, 30/11/2018. Política, p. A6

 

Raquel: ‘Continuam praticando crimes’

Breno Pires e Teo Cury

30/11/2018

 

 

 Recorte capturado

 

Procuradora-geral da República diz que esquema criado em 2007 continuou a ser operado no Rio mesmo após prisões de antigos líderes

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, afirmou ontem, após a prisão do governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão (MDB), que ele sucedeu ao ex-governador Sérgio Cabral (MDB) no comando da organização criminosa envolvida em esquema de corrupção e lavagem de dinheiro dentro do governo estadual fluminense. Em uma rara entrevista à imprensa, a procuradora-geral disse que os crimes tiveram início há 11 anos e continuavam a sendo praticados pelos “infratores”.

“Os fatos se iniciam em 2007 em sucessão de atos e participação de pessoas que incluem aquelas que são destinatárias da ordem de prisão de hoje. Há um indicativo de que houve sucessão de pessoas partícipes da organização criminosa mesmo depois das prisões já feitas. Infratores continuam praticando crimes, por isso, chegou-se à necessidade de requerer prisão preventiva para garantia da ordem pública”, disse Raquel na primeira entrevista que concedeu para falar de um caso específico de corrupção.

A investigação da PGR descreve Pezão não só como sucessor de Cabral, mas como alguém que tinha seu próprio esquema criminoso. Ele teria recebido ao todo R$ 25 milhões (R$ 39,1 milhões em valores atualizados), segundo o procurador Leonardo de Freitas, do MPF do Rio. Os valores são oriundos, em parte, de uma mesada que teria sido paga pelo operador de propinas de Sérgio Cabral e agora colaborador • da Justiça, Carlos Miranda. A outra parte seria de desvios de recursos públicos ligados ao setor de transporte.

Também presente à coletiva, Freitas afirmou que houve “uma dança das cadeiras espúria com uma sucessão de pessoas após a prisão do primeiro time”, de Cabral.

“O senhor Carlos Wilson (ex-secretário de gestão de Cabral) foi sucedido pelo Affonso Monnerat (secretário de Governo de Pezão). Hudson Braga, ex-secretário de obras de Cabral, foi sucedido por José Hiran, preso na data de hoje”, disse o procurador.

Coleta. Raquel afirmou que a operação teve o objetivo de coletar provas da lavagem de dinheiro. Ela não deu detalhes sobre uma das abordagens da investigação, que é sobre o envio de dinheiro para o exterior, mas falou que a operação ajudará a trazer mais detalhes.

Sobre provas já encontradas, Freitas afirmou que elas não se resumem a acordos de colaboração. “Posso destacar os bilhetes apreendidos ainda no bojo da Operação Calicute que faziam menção de alguma forma a ‘Pé’, ‘Pezão’ ou ‘P’, com anotações de valores do lado. Esses bilhetes são provas documentais apreendidas há cerca de dois anos e, com as colaborações e depoimentos, vieram a ser corroborados e autenticados.”

Além de Pezão e dos secretários estaduais Affonso Monnerat e José Hiran, foram presos Marcelo Santos Amorim, um sobrinho do governador, e cinco empresários.

Bolsonaro e Moro. Em sua conta no Twitter, o presidente eleito, Jair Bolsonaro, tratou indiretamente sobre a prisão de Pezão, elogiando o trabalho da Lava Jato. “Os que hoje se colocam contra ou relativizam a Lava Jato estão também contra o Brasil e os brasileiros. Todo apoio à operação que está tirando o país das mãos dos que estavam destruindo-o!”

Questionado sobre o assunto, o futuro ministro de Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, disse que a prisão de Pezão é “algo perfeitamente normal”. Sem opinar sobre os supostos crimes apontados contra o emedebista, ele elogiou o autor da ordem de prisão, o ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), relator da Lava Jato no tribunal.

“Um grande ministro. Tem todos os meus elogios e o reconhecimento de outras pessoas. Mas o assunto atinente (relacionado) à Justiça, algo perfeitamente normal”, afirmou Moro.

 

Sucessão

“Há um indicativo de que houve sucessão de pessoas partícipes da organização criminosa mesmo depois das prisões já feitas.”

Raquel Dodge​, PROCURADORA-GERAL DA REPÚBLICA