Título: Brasiguaios com Franco
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Fonte: Correio Braziliense, 25/06/2012, Mundo, p. 15

Agricultores brasileiros radicados no país pedem a Dilma que apoie o presidente empossado pelo Congresso

Para os mais de 500 mil brasileiros radicados no Paraguai, a maioria ligada ao agronegócio, o isolamento crescente do recém-instalado governo de Federico Franco é má notícia, mais ainda pelo endurecimento da posição da presidente Dilma Rousseff. Os brasiguaios, como são conhecidos, estão no centro do conflito fundiário que produziu o estopim para a destituição de Fernando Lugo — o presidente sofreu impeachment após o Congresso julgá-lo responsável por um confronto entre sem-terra e as forças de segurança, com saldo de 17 mortos. Convencidos de que Lugo contribuiu para o acirramento das disputas de terra, que resultaram nos últimos meses em invasões de fazendas, representantes dos brasiguaios reuniram-se ontem com o cônsul do Brasil em Ciudad del Este e entregaram um documento no qual manifestaram "surpresa e preocupação" com a decisão do Planalto e do Itamaraty de chamar para consultas o embaixador Eduardo dos Santos.

Na contramão da nota emitida pelo Itamaraty na noite de sábado, condenando o "rito sumário" no processo contra o presidente e caracterizando uma "ruptura da ordem democrática", o texto dos brasiguaios sustenta que o impeachment foi conduzido "com total transparência, com transmissão direta de todo o processo pelos meios de comunicação". Eles pedem ao governo brasileiro que "obtenha as informações reais e exatas" com o embaixador, Eduardo dos Santos, aguardado hoje em Brasília. Afonso Schuster, radicado no Paraguai há 39 anos, afirmou ao site G1 que, com a troca de governo, "essas ocupações de terra vão ter que terminar".

Reforma travada O incidente que culminou com o processo político contra Lugo reflete as dificuldades do ex-bispo, eleito em 2008, para levar adiante uma de suas principais bandeiras de campanha, a reforma agrária, em um país onde 80% da terra está concentrada com 2% dos proprietários. "Seja como for, ele não tinha o apoio necessário (no Congresso) para cumprir suas promessas", disse à agência de notícias France-Presse o agricultor Dario Acosta, 50 anos. Ele agora teme que os camponeses sejam os maiores prejudicados pelo isolamento externo do novo governo. "Em caso de represálias, os pequenos agricultores pagarão", lamentou.

Para o analista político Francisco Capli, diretor de um instituto de pesquisas, com a queda de Lugo os sem-terra perderam "um aliado estratégico, mas que não resolveu quase nada, principalmente por falta de apoio parlamentar". Circulam pelo Paraguai títulos de propriedade que totalizam de 530 mil km² de terras, embora a superfície do país seja de 410 mil km². O fenômeno "remonta à época da ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989), que distribuía títulos de propriedade para recompensar as pessoas de confiança", explica Capli.

Após tomar posse perante o Congresso, na última sexta-feira, o novo presidente, Federico Franco, do Partido Liberal, reconheceu que a situação fundiária no Paraguai é "terrível" e prometeu "novas soluções para antigos problemas" — mas não citou nenhuma iniciativa concreta.