Título: Comissão da Verdade prioriza documentos
Autor: Filizola, Paula
Fonte: Correio Braziliense, 26/06/2012, Política, p. 5

Colegiado analisa material sobre a ditadura antes de definir o cronograma com os próximos depoimentos

O próximo passo da Comissão da Verdade será a criação de duas subcomissões de pesquisa, documentação e sistematização, além de uma específica para ajudar a promover audiências públicas. De acordo com o coordenador da Comissão da Verdade, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp, o grupo está debruçado sobre documentos e correspondências. Ainda assim, os integrantes, reunidos ontem durante todo o dia em Brasília, não têm cronograma definido sobre os próximos depoimentos que devem ser realizados. "Há uma gama muito grande de pessoas que poderão ser ouvidas, mas ainda não definimos nomes. No entanto, estamos redigindo um esboço do relatório final para não perder nada do que já temos até agora", relatou.

Na manhã de ontem, o ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops) Cláudio Antônio Nogueira Guerra foi ouvido na Comissão da Verdade. Durante cerca de duas horas, ele confirmou todos os casos de tortura e assassinatos políticos ocorridos durante a ditadura militar que detalhou em Memórias de uma guerra suja. No livro, o ex-delegado conta, por exemplo, que foi o responsável por incinerar os corpos de 10 presos políticos na fornalha de uma usina na cidade de Campos (RJ).

Na avaliação do advogado e ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, também integrante da Comissão da Verdade, o depoimento do ex-delegado do Dops se mostrou muito proveitoso. Segundo Dipp, entre as próximas providências está a busca de corpos e esclarecimentos com alguns agentes citados por Guerra. Após o lançamento do livro de Guerra, o Ministério Público Federal (MPF) abriu investigação para apurar as informações, em paralelo com o trabalho da Comissão da Verdade. No entanto, o ministro reafirmou que os dados colhidos pelo grupo não chegam ao MPF. "A comissão não tem papel de julgar e nem é perseguitiva", reiterou Dipp.

Resgate histórico Ao falar do trabalho da Comissão da Verdade, Dipp voltou a elogiar a série de reportagens publicadas pelo Correio/Estado de Minas. Segundo ele, as reportagens evidenciam um resgate do jornalismo investigativo. O material trouxe confissões da presidente Dilma Rousseff e da ministra Eleonora Menicucci, da Secretaria de Políticas para Mulheres, durante o período da ditadura. Ainda assim, os integrantes da Comissão da Verdade descartam chamar a presidente para depor. "Já temos tudo o que precisamos. Não temos um direcionamento para convocá-la", disse Dipp.

Apesar de o cronograma continuar indefinido, os integrantes da comissão pretendem ouvir o depoimento do tenente-coronel reformado Paulo Malhães, que relatou em recente entrevista torturas ocorridas na época da ditadura militar em uma casa em Petropólis, Região Serrana do Rio de Janeiro. O local, apelidado de Casa da Morte, era usado pelos militares como centro de detenção e tortura clandestino. Por lá passaram, e acabaram torturados e executados, pelo menos 22 presos políticos nos anos 1970. Dipp afirmou que o grupo quer ouvi-lo, mas isso depende das condições de saúde de Malhães. "A reboque dos acontecimentos, podemos mudar definições", disse o ministro do STJ.

"A comissão não tem papel de julgar e nem é perseguitiva" Gilson Dipp, ministro do STJ e coordenador da Comissão da Verdade