O globo, n. 31101, 01/10/2018. País, p. 10

 

Em 22 anos, nunca houve violação da urna, diz TSE

Patrik Camporez

01/10/2018

 

 

Seis meses antes da eleição, equipamentos passam por 30 procedimentos de auditagem e contra fraudes. Na hipótese remota de invasão de uma urna, conjunto não seria acessado porque não há conexão à internet

Durante 22 anos de utilização das urnas eletrônicas no Brasil, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não identificou nenhuma invasão de hackers ou qualquer tipo de fraude nos mais de 461 mil pontos de votação espalhados pelo país. A constatação é do secretário de Tecnologia da Informação (TI) do tribunal, Giuseppe Janino, que comanda uma equipe de 300 especialistas e engenheiros que atua exclusivamente na garantia da segurança das urnas durante a eleição.

Em entrevista ao Globo, o secretário lamenta que alguns integrantes da classe política, que colocam sob suspeita a segurança da urna, não aparecem para participar do processo, aberto pelo TSE, para fiscalizar a preparação das urnas.

Segundo Giuseppe, para assegurar a inviolabilidade da urna, o TSE realiza, a cada eleição, pelo menos 30 procedimentos de auditagem e verificação, que tornaram o sistema de urnas eletrônicas brasileiro reconhecido internacionalmente como um dos mais seguros. Todos os sistemas utilizados na eleição são desenvolvidos pelas equipes do tribunal. Seis meses antes da eleição, o TSE abre esses programas para que entidades, partidos políticos e universidades possam analisar cada um dos programas utilizados no pleito. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Polícia Federal (PF) e o Supremo Tribunal Federal (STF) também participam do processo.

Cada uma dessas entidades pode tirar dúvidas com a equipe técnica e, até mesmo, caso encontrem qualquer funcionalidade “obscura”, solicitar a impugnação do software caso seja encontrada evidência de risco. Os políticos, mais críticos ao sistema da urna, que poderiam conferir com os próprios olhos o procedimento, diz o secretário do TSE, se ausentam nesta fase.

—O frustrante é que os maiores interessados, os partidos políticos, não aparecem nesse processo. Não aparecem para verificar os programas, não aparecem nos testes públicos de segurança e, posteriormente, o questionam, sem nenhum fundamento, sem ter sequer conhecimento daquilo que estão questionando.

Mesmo que conseguisse romper o lacre e adulterar um programa — possibilidade altamente remota, segundo o TSE —, um hacker teria pela frente outras 30 barreiras digitais que garantem a segurança do sistema. Segundo o TSE, o Brasil é o único país do mundo que abre esse sistema para que hackers tentem quebrar as barreiras de segurança e mostrem onde ainda existem possíveis fragilidades.

— Até hoje nenhuma das equipes, em quatro edições, conseguiu quebrar o sigilo do voto nem tampouco mudar os resultados.

Na internet e nas redes sociais, porém, o próprio TSE já verificou notícias falsas que dão conta que hackers que invadem o FBI e o Pentágono, nos Estados Unidos, poderiam facilmente alterar as urnas eletrônicas.

— É simples de explicar porque esse é um mito. A urna eletrônica foi projetada para não estar ligada a nenhum dispositivo de rede, muito menos à internet.

Na hipótese remota de alguém invadir uma urna, explica o tribunal, não haveria como acessar o conjunto das outras. A urna eletrônica também conta com um sistema que permite que ela funcione só no dia e no horário previsto da votação.

Boatos

Nos últimos dias, o presidenciável do PSL, Jair Bolsonaro, tem dito em entrevistas que não aceitará outro resultado da eleição que não seja a sua vitória. Esse discurso, segundo técnicos do TSE, tem influenciado a propagação de boatos nas redes sociais a respeito das urnas eletrônicas.

Para Giuseppe, a tentativa de desqualificar as urnas eletrônicas e falar de possibilidade de fraude, “sem nenhum fundamento na realidade”, significa uma “demonstração de desconhecimento do processo”. Um dos boatos mais frequentes, de que as urnas viriam violadas já da fábrica, é rebatido com veemência pelo secretário.

—Esse tipo de informação que se propaga, quanto mais falaciosa, mais é multiplicada. A orientação para o cidadão brasileiro é que ele verifique a realidade, confronte os fatos. Muitas vezes se fala que uma empresa venezuelana é dona da urna. Isso é mentira. O projeto da urna é do TSE. Todo o projeto de engenharia é de técnicos da Justiça Eleitoral. Quando se publica um edital para contratação da urna, a empresa que venceu simplesmente materializa projeto nosso. A urna é do TSE e não da empresa —afirma Giuseppe.

Ele diz ainda que uma equipe do TSE acompanha no “chão de fábrica” o processo de materialização da urna.

Sistema seguro

Urnas passam por processo rigoroso de verificação

Especialistas

Uma equipe de 300 especialistas e engenheiros atua exclusivamente na segurança das urnas durante a eleição

Inviolabilidade

A cada eleição, o TSE realiza pelo menos 30 procedimentos e auditagem e verificação, o que leva o sistema brasileiro de urnas eletrônicos a ser reconhecido como um dos mais seguros do mundo

Exclusividade

Todos os sistemas utilizados na eleição são desenvolvidos única e exclusivamente pelas equipes do TSE e abertos para que entidades, partidos e universidades possam analisá-los

Integridade

Consiste numa espécie de blindagem dos programas. Por meio de cálculos matemáticos, os técnicos extraem um dígito verificador desses programas, o que garante integridade ao sistema

Lacração

O sistema da urna eletrônica possui uma barreira de lacres físicos, desenvolvidos pela Casa da Moeda do Brasil, e um mecanismo que muda de cor em caso de tentativa de manipulação

Imunidade

Um princípio básico da urna eletrônica é que ela não tem nenhuma conexão com a internet. Mesmo que um hacker conseguisse invadir uma urna. não teria como acessar o conjunto das outras urnas

Como funciona a urna

Desde a eleição de 1996, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) usa urnas eletrônicas para registrar os votos da população brasileira

1. A urna é composta por dois terminais: odo mesário, onde o cidadão é identificado, e o do eleitor, onde ele digita os números de seu candidato. Segundo o TSE, a urna eletrônica registra todos os votos nela computados e os embaralha de forma a tornar impossível a identificação de quem votou em quem

2. Após o encerramento da eleição, a urna imprime cinco cópias de um boletim que revela o resultado da votação naquela seção eleitoral. Uma via é fixada no próprio local. Três são encaminhadas ao cartório eleitoral, e a última, entregue aos fiscais dos partidos para conferência

3. Em seguida, um dispositivo móvel chamado mídia de resultado (pendrive) é levado a um dos polos de transmissão (zona eleitoral ou TRE), e as informações, registradas em seus cartões de memória de forma criptografada, começam a ser transmitidas