O globo, n. 31107, 07/10/2018. País, p. 14

 

No trio ‘Alcirina’, Ciro é o único com ânimo

Catarina Alencastro

Silvia Amorim

Jeferson Ribeiro

07/10/2018

 

 

Na reta final, o pedetista mantém a expectativa de uma virada. Para o marqueteiro de Alckmin, o “eleitor está votando com a indignação e não com a razão”. Os aliados de Marina dizem que ela definhou pela discrição numa campanha radicalizada

Entre os três candidatos presidenciais que fizeram campanha para evitar um segundo turno entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT), Ciro Gomes, do PDT, chega ao dia da eleição com maior ânimo do que Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede). O trio foi apelidado de “Alcirina”, a partir de um movimento lançado por estudantes do Rio de Janeiro no Twitter a favor da união dos três candidatos em uma chapa com o intento de barrar Bolsonaro e Haddad. A união não foi à frente, mas entrou nos assuntos mais comentados do Twitter e ajudou a dar fôlego à campanha do candidato do PDT que, pela proposta dos estudantes, encabeçaria a chapa “Alcirina”. Enquanto o desalento reinava nas campanhas de Alckmin e Marina e alguns de seus integrantes já faziam um inventário da derrota, Ciro manteve na reta final um ritmo frenético e percorreu nove cidades em menos de uma semana.

Às vésperas da eleição, o núcleo da campanha mantinha o otimismo e a crença numa arrancada final para ir ao segundo turno. Empenhado em mobilizar a militância, Ciro passou a bater na tecla de que “a virada é completamente provável”. No Twitter, a campanha do pedetista lançou o #TsunamiCiro e #ViraViraCiro na expectativa de criar uma onda de adesão ao candidato. Para capturar o voto contra Bolsonaro, Ciro passou a mirar sobretudo o eleitorado simpático à esquerda. Para atrair esse público, usou como argumentos a estagnação de Fernando Haddad, a alta rejeição ao PT e as pesquisas que mostram que ele venceria o candidato do PSL no segundo turno. Na reta final, Ciro centrou fogo nas fraquezas e “falta de energia” do ex-prefeito de São Paulo para enfrentar um embate com Bolsonaro. Para manter o ânimo alto, dentro e fora da campanha, os aliados de Ciro lembram os casos recentes de candidatos que estavam em terceiro lugar até às vésperas da eleição e conseguiram uma ultrapassagem na última hora. Em 2014, até a reta final, Marina estava em segundo lugar atrás de Dilma Rousseff e acabou ficando em terceiro no primeiro turno da eleição presidencial, atrás da petista e de Aécio Neves (PSDB).

Um correligionário de Ciro, o líder do PDT na Câmara, André Figueiredo, espalhou nas redes um vídeo em que conta um caso na disputa pela prefeitura de Fortaleza em 2012. O candidato do PDT à época, Heitor Ferrer, aparecia no dia da eleição com apenas 12% nas pesquisas. Nas urnas, teve 22% dos votos. Ficou fora do segundo turno porque muitos achavam que ele não tinha chance. No vídeo, Figueiredo pede para os eleitores não desistirem de votar em Ciro.

“Há um receio coletivo com relação à polarização entre Haddad e Bolsonaro. Temos realmente a esperança de que a coisa vai _ virar ” Nelson Marconi, Coordenador do programa de Ciro

Ideia para união dos três candidatos surgiu para tentar barrar Bolsonaro e Haddad

— Só agora é que uma grande parte das pessoas está decidindo seu voto. Está caindo a ficha de que é preciso escolher bem. Há um receio coletivo com relação à polarização Haddad/Bolsonaro. Estamos trabalhando como loucos e temos realmente a esperança de que a coisa vai virar — disse o economista Nelson Marconi, da FGV, um dos coordenadores do programa de governo de Ciro. Enquanto a adrenalina se mantinha alta na campanha do PDT, o desânimo dominava a campanha do PSDB que chega ao dia da eleição com a perspectiva de um dos piores desempenhos do partido em eleições presidenciais da história. Às vésperas da votação, o discurso na campanha era que o PSDB não tinha o candidato que o eleitor queria.

Divisor de águas

O desgaste do PSDB, resultado de lideranças atingidas pela Lava-Jato e da aproximação com o governo Michel Temer, também era apontado como um dos culpados pela iminente derrota nas urnas. Alckmin não conseguiu convencer o tradicional eleitor do partido de que ele era o melhor caminho para renovar a política e derrotar o PT.

Pela primeira vez, o marqueteiro de Alckmin, Lula Guimarães, fez uma análise da disputa.

— As qualidades dele não foram reconhecidas pelo eleitor que está votando com a indignação e não com a razão —disse ao GLOBO. O atentado contra Bolsonaro foi tratado pelo marqueteiro como um divisor de águas na disputa.

— A gente sempre teve a dimensão de que a campanha era muito difícil, mas estávamos no caminho certo. Assim que começou o horário eleitoral conseguimos fazer com que a rejeição ao Bolsonaro aumentasse significativamente com a nossa propaganda. A facada mudou tudo e, quando retomamos, era uma outra eleição —afirmou Guimarães. Alckmin nunca admitiu uma derrota mesmo a seus auxiliares. Para o time tucano, a ficha da derrota começou a cair quando pesquisa Ibope mostrou que, em São Paulo, Bolsonaro abria larga vantagem sobre o tucano. No estado, Alckmin tinha a meta de chegar a 30% para sonhar com um segundo turno.

— Um dos sinais amarelos foi quando, após a subida de Haddad, Bolsonaro abriu vantagem em São Paulo e chegou a 20 pontos — afirmou o marqueteiro. Marina viu suas intenções de votos derreterem a partir do momento em que Fernando Haddad entrou na disputa e a campanha foi polarizada por ele e Bolsonaro. Durante a semana, os marineiros faziam o diagnóstico de que a candidata da Rede não tinha o perfil adequado para disputar uma eleição marcada pela indignação dos eleitores com o sistema político. Sem estrutura partidária para fazer campanha, seu discurso moderado a favor do diálogo não encontrou eco numa campanha travada em meio à radicalização dos ânimos políticos.

— A Marina não é uma pessoa exibicionista, tem procedimento muito discreto. Ela acabou sendo definhada por isso —disse o deputado federal Miro Teixeira, candidato da Rede ao Senado no Rio de Janeiro e um dos conselheiros da presidenciável. — Marina é o grande personagem que entra em cena no começo da ópera. Depois que os tenores e os barítonos começam a se exibir e a música começa a tomar conta do ambiente, aquela voz acaba sumindo, que era a voz da sensatez.