O Estado de São Paulo, n. 45689, 20/11/2018. Política, p. A4

 

Moro convida chefe no PR para direção-geral da PF

Eliane Cantanhêde, Breno Pires e Ricardo Brandt

20/11/2018

 

 

Delegados. Maurício Valeixo deve ser continuado ainda nesta semana; ex-juiz integra os policiais federais Erika Marema e Rosalvo Franco na equipe que articula futuro ministério

 

Mesa. Sérgio Moro almoça, em Brasília, com Fabiano Bordignon, Érika Marena e outros integrantes da equipe de transição

Atual superintendente da Polícia Federal no Paraná, Maurício Valeixo foi convidado pelo futuro ministro da Justiça, Sérgio Moro, para ocupar o cargo de diretor-geral da corporação. Valeixo, descrito como “profundamente operacional”, deve substituir o também delegado Rogério Galloro, mais respeitado como intelectual do que operacional.

Ex-diretor de Inteligência da PF, Valeixo foi antes diretor de uma outra área-chave para a gestão do futuro ministro da Justiça: a de Combate ao Crime Organizado. Moro só não anunciou oficialmente o nome de Valeixo – com quem mantém boa relação desde a década de 90 – porque ainda monta o quebra-cabeça do ministério e o delegado, apesar de praticamente definido para a PF, é uma peça que se encaixaria em mais de uma posição. O anúncio deve sair nesta semana.

Em outro movimento, Moro confirmou ontem os delegados da PF Érika Marena e Rosalvo Ferreira Franco – pioneiros da Lava Jato – como os primeiros nomes na equipe de transição. Ambos ajudaram a construir e consolidar o modelo de apuração adotado na operação, com forças-tarefa para assuntos prioritários. No início do mês, Moro disse que pretende adotar esse estilo para combater o crime organizado em todo o País. Deflagrada em março de 2014, a Lava Jato é considerada a maior investigação contra a corrupção já realizada no País.

Segundo fontes ouvidas pelo Estado, Érika pode ser escolhida por Moro para comandar órgão estratégico para investigações internacionais no ministério: o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI).

Um terceiro indicado para integrar a equipe de Moro na transição é Fabiano Bordignon, chefe da PF em Foz do Iguaçu (PR), que não atuou na Lava Jato. Cotado para assumir o Departamento Penitenciário Nacional (Depen), ele já foi diretor da Penitenciária Federal de Catanduvas, no Paraná, e em Foz do Iguaçu investigou a rota do crack no Brasil – a cidade se tornou um ponto de entrada da droga no País nos últimos anos.

Com a exoneração publicada no Diário Oficial da União, Moro chegou ontem a Brasília e almoçou com Érika, Rosalvo e Bordignon, além de Flávia Blanco, que pode ser chefe de gabinete, e o agente Marcos Koren, que supervisiona a sua segurança na capital federal. Aos jornalistas, Moro afirmou que está cuidando da formação do ministério e do organograma de atividades na transição. “No momento certo os anúncios públicos serão feitos.”

Rosalvo afirmou que está colaborando na transição e que continuará à disposição do futuro ministro. Os outros dois delegados não falaram com a reportagem ontem. Até quinta-feira, Moro poderá se reunir com os ministros Torquato Jardim, da Justiça, e Raul Jungmann, da Segurança Pública – pastas que serão fundidas na sua gestão.

Histórico. Atual superintendente da PF em Sergipe, Érika Marena participou da origem da Lava Jato ao lado do delegado Marcio Anselmo – outro nome especulado como possível integrante da equipe de Moro. Na época, a Superintendência do órgão no Paraná era comandada por Rosalvo, que deixou o posto no fim do ano passado após quatro anos.

A possível ida de Érika para a pasta foi informada pela Coluna do Estadão na sexta-feira passada. A delegada também comandou a Operação Ouvidos Moucos, que ficou marcada pela prisão e posterior suicídio do reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Luiz Carlos Cancellier .

Érika foi quem batizou a operação, da qual fez parte até o fim de 2016. A partir de então, atuou nos casos de Santa Catarina e, em dezembro de 2017, ocupou a Superintendência da PF em Sergipe.

Antes da Lava Jato, havia trabalhado no caso Banestado, nos anos 2000, no qual também atuou Moro. Foi procuradora do Banco Central e técnica da Justiça Eleitoral.

A conduta da delegada foi questionada na Operação Ouvidos Moucos, deflagrada em setembro de 2017 para combater supostos desvios de dinheiro em programas de ensino a distância da UFSC. No mês da morte de Cancellier, a família apresentou uma queixa-crime ao Ministério da Justiça contra a delegada pedindo instauração de procedimento administrativo para apurar a responsabilidade por eventuais abusos e excessos. Uma sindicância da Corregedoria da PF sobre a conduta da delegada concluiu que não houve irregularidade nos procedimentos adotados na Operação Ouvidos Moucos.

Os ministérios da Justiça e da Segurança Pública não responderam à reportagem se houve arquivamento da queixa-crime.

A delegada tem, porém, bastante prestígio na PF. Chegou a ser eleita como primeiro nome em lista tríplice da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal, em maio de 2016, para apresentar ao governo Temer, como sugestão para indicação à Diretoria-Geral. Érica teve 1.065 votos. Naquele ano, o presidente Michel Temer escolheu como diretor-geral Fernando Segóvia.

 

PARA LEMBRAR

A delegada da Polícia Federal Érika Marena atuou, em setembro de 2017, na Operação Ouvidos Moucos, deflagrada para apurar supostos desvios de dinheiro em programas de ensino a distância na Universidade Federal de Santa Catarina. A operação ficou marcada pelo suicídio do então reitor da UFSC Luiz Alberto Canciller, que se matou menos de três semanas após ser preso pela PF. Canciller deixou um bilhete no qual escreveu: “Eu decretei a minha morte no dia da minha prisão pela Polícia Federal”. Na época, houve críticas na comunidade acadêmica e entre autoridades, como o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal. Para o magistrado, o ocorrido “serve de alerta sobre as consequências de eventual abuso de poder por parte das autoridades”. Por outro lado, delegados da PF saíram em defesa da conduta da delegada.