Título: Obama corteja latinos
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 16/06/2012, Mundo, p. 26

De olho nos votos dos latinos em novembro — eles já somam 29% do eleitorado norte-americano —, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, fez ontem um anúncio que pegou a nação de surpresa. Por meio de uma ordem executiva, ele determinou a suspensão imediata da deportação de imigrantes ilegais que entraram no país com menos de 16 anos. A medida deve beneficiar 1,4 milhão de pessoas e terá uma validade de dois anos, com possibilidade de renovação. Durante esse período, elas ficarão livres de serem expulsas dos EUA. Os candidatos que atenderem aos critérios exigidos pelo governo (veja o quadro ao lado) poderão solicitar autorização para trabalhar no país.

Considerada histórica por especialistas, a guinada na política migratória destoa das ações do próprio governo Obama. Nos primeiros dois anos da atual gestão, 400 mil estrangeiros não documentados foram expulsos do país. O número excede a média anual de deportados durante o segundo mandato de seu antecessor, George W. Bush. Em pronunciamento na Casa Branca, Obama fez questão de avisar: "Isso não é anistia, não é imunidade, não é um caminho para a cidadania (...), é um quebra-galho provisório".

Obama reconheceu uma espécie de dívida da nação para com esses jovens. "Eles estudam em nossas escolas, atuam em nosso bairros, são amigos de nossas crianças e juram lealdade à nossa bandeira. São americanos de coração, de mentalidade, de todas as formas. Menos em uma: nos documentos", comentou. "Eles foram trazidos a este país por seus pais, algumas vezes quando bebês, e frequentemente não têm ideia de que são ilegais, até se registrarem para um emprego, uma carteira de motorista ou uma bolsa escolar", acrescentou. Segundo o presidente, "não faz sentido expulsar jovens talentosos que, para todos os intentos e propósitos, são americanos". "A partir de agora, o Departamento de Segurança Interna está tomando os passos para suspender a sombra de deportação desses jovens", avisou.

Para cortejar o eleitorado hispânico, Obama precisou se indispor com a ala republicana do Capitólio — os opositores têm a maioria na Câmara dos Deputados — e com os ativistas anti-imigrantes. "Foi uma manobra audaciosa. O presidente passou por cima do Congresso e implementou uma política que os latinos amarão. Trata-se de uma jogada esperta, pois o voto latino está concentrado em swing states (estado onde nenhum candidato possui maioria absoluta), como o Colorado, o Novo México, Nevada e Flórida", afirmou ao Correio Darrell West, diretor de estudos de governança da Brookings Institution (em Washington).

Terri Givens, professora do Departamento de Governo da Universidade do Texas em Austin, concorda com West e explica que a decisão de Obama atende a demandas dos defensores da aprovação do chamado Dream Act — o projeto legislativo abriria caminho para a concessão de cidadania aos estudantes não documentados. "O Congresso foi incapaz de aprovar essa legislação, respaldada por Obama", disse à reportagem. Apesar de reconhecer a importância da medida, Terri explica que isso não alivia a necessidade de uma reforma migratória compreensiva. Em seu discurso, Obama enviou um recado aos parlamentares. "Digo repetidas vezes para o Congresso: enviem-me o Dream Act, coloquem-no na minha mesa, e eu vou passá-lo adiante imediatamente."

Os opositores não economizaram críticas à ordem executiva, considerada eleitoreira. O senador republicano John McCain, derrotado por Obama nas eleições de 2008, admitiu que o anúncio tem "motivações políticas que nada fazem para avançar o debate, mas, em vez disso, causam confusão e incertezas". Rick Perry, governador do Texas, classificou-o de um exemplo do "escandaloso descaso" de Obama pela Constituição, pelo estado de direito e pelo processo democrático.

"Não faz sentido expulsar jovens talentosos, que, para todos os intentos e propósitos, são americanos. (...) Eles são americanos de coração, de mentalidade, de todas as formas. Menos em uma: nos documentos" Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, ao anunciar a nova política migratória, em discurso realizado na Casa Branca

Brasileiros A expectativa é de que a medida beneficie milhares de brasileiros. A estudante mineira Carolina Costa, 17 anos, vive há 12 anos em Bridgeport (Connecticut) e deve ser contemplada pela nova política. "Eu estava ficando preocupada, pois farei o último ano do segundo grau e não poderia pegar o diploma. Fiquei muito feliz em saber disso", disse ao Correio, por telefone. Ela afirmou esperar que a medida seja prorrogada. A paranaense Heloise Srehner, 18 anos, já estava pensando em voltar ao Brasil. Com a decisão, a garota, que chegou aos EUA quando tinha 10 anos, agora começa a sonhar com um trabalho. "É como se fosse um milagre. Tínhamos sempre que esperar por uma oportunidade aqui. Soube da notícia por um amigo, que me mandou um e-mail. Liguei correndo para a minha mãe. Agora, vou ficar por aqui, estudar e arrumar um trabalho", comemorou Heloise, que também mora em Bridgeport.

1,4 milhão Número de imigrantes ilegais que deverão ser beneficiados com a medida anunciada por Obama.

400 mil Total de imigrantes deportados durante os dois primeiros anos de mandato do governo Obama.

Quem pode ser contemplado Para serem beneficiados pela medida, os imigrantes ilegais devem cumprir os seguintes requisitos:

» Terem chegado aos Estados Unidos quando tinham menos de 16 anos. » Terem vivido em território norte-americano por pelo menos cinco anos seguidos. » Estarem frequentando a escola, terem se graduado em universidade ou terem sido dispensados do Exército norte-americano. » Não ter ficha criminal. » Ter menos de 30 anos de idade.

Visita às estrelas e calote em restaurante O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, visitou, na tarde de quinta-feira, a atriz Sarah Jessica Parker, em Manhattan. Na residência da estrela do seriado Sex and the City, Obama e sua mulher, Michelle, receberam 50 convidados que pagaram US$ 40 mil para ter direito ao encontro. Entre as celebridades presentes, estavam a atriz Meryl Streep, o ator Matthew Broderick, o designer Michael Kors e a editora da revista Vogue Anna Wintour. O evento serviu para arrecadar fundos para a campanha. Na tarde de ontem, Obama fez uma visita surpresa ao restaurante Kenny Kenny´s BBQ, no bairro de Capitol Hill, em Washington. Acompanhado de dois soldados e dois barbeiros, ele comeu, conversou muito e se esqueceu de pagar a conta de US$ 55,58. Depois de repararem o erro, assessores da Casa Branca voltaram ao local e deixaram o dinheiro.