Título: Tudo rosa para Hollande
Autor: Traches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 17/06/2012, Mundo, p. 22
Estão em jogo hoje na França, no segundo turno das eleições legislativas, os contornos políticos definitivos nos quais François Hollande começará efetivamente o seu mandato no Palácio do Eliseu, onde tomou posse há um mês. A expectativa é de que o Partido Socialista (PS) garanta a maioria parlamentar, dando tranquilidade ao novo presidente para implementar suas prometidas reformas. Mas a sigla governista trata de assegurar o maior número possível de cadeiras, e assim dispensar acordos com forças à sua esquerda no espectro político, ao preço de concessões programáticas. O cenário captado nas últimas pesquisas sugere que Hollande não precisará renegociar a composição do ministério para reacomodar aliados.
Na sexta-feira, uma sondagem do instituto Ifop previu que o PS deve obter entre 284 e 313 deputados para a Assembleia Nacional, assegurando assim as 289 cadeiras necessárias para a maioria absoluta. Analistas e especialistas em política francesa consultados pelo Correio também apostam em um resultado dessa ordem. "O PS deve garantir a maioria por conta própria ou com o apoio dos verdes, mas o mais importante é que parece que não dependerá de acordos com o radical Jean-Luc Mélenchon, da Frente de Esquerda", afirmou James Shields, professor de política francesa e história moderna da Aston University (Birmingham, Reino Unido).
Para Hollande e o premiê Jean-Marc Ayrault, um dos 36 deputados eleitos no domingo passado, a última dúvida maior que restava era quanto à sobrevida política dos ministros candidatos. Os dois anunciaram no início da campanha que os eventuais derrotados deixarão o gabinete. Dezoito dos 34 titulares de pastas terão o nome nas cédulas, hoje, mas apenas Marie-Arlette Carlotti, responsável por temas ligados aos portadores de deficiência, corria risco real de perder.
Candidatos da chamada "direita republicana", como Muselier, lutam para reduzir os danos da UMP após a fracassada campanha do presidente Nicolas Sarkozy à reeleição. Apesar de alguns dos políticos da sigla já terem vivido essa experiência, durante os dois mandatos do socialista François Mitterrand (1981-1995), a UMP vai sentar-se no lugar reservado à oposição pela primeira vez que foi fundada, resultado da convergência de diversos partidos de centro e direita. Na campanha para as legislativas, os herdeiros de Sarkozy enfrentaram o dilema de aliar-se ou não à Frente Nacional (FN), de extrema direita, que colecionou bons resultados desde o primeiro turno da presidencial e nunca esteve tão próxima de voltar à Assembleia Nacional, após 24 anos de ausência.
A orientação da cúpula da UMP, como explicou o analista Jocelyn Evans, da Universidade de Salford (Inglaterra), é a do "nem, nem", desaconselhando apoio a candidatos da FN ou do PS no segundo turno. "Alguns respeitarão essa regra, outros não, o que não é surpresa, dada a desordem dentro do partido após a derrota de Sarkozy", ponderou Evans.
Direita esperançosa As esperanças maiores da extrema direita recaem sobre sua líder, Marine Le Pen, que saiu do primeiro turno da disputa presidencial com 17,9% dos votos e venceu a primeira rodada em um distrito industrial do norte do país com 42% dos votos. Com essa votação, ajudou a FN a cravar 14% no domingo passado, resultado que confirma a legenda na posição de terceira força política do país. Mas a própria Marine e os correligionários que seguem na disputa enfrentam a tradicional rejeição dos demais partidos, e por isso as projeções apontavam de zero a três eleitos para a sigla.
"Em termos numéricos, é insignificante. Mas em termos simbólicos contará como uma vitória o retorno da extrema direita à assembleia", observa Shields. A própria UMP poderia ser empurrada a reconsiderar o "cordão sanitário" imposto à FN, sob pena de sucumbir à maré favorável vivida pelo PS. Na opinião do professor de política Philippe Marliere, da University College, de Londres, essa recomposição do espectro político francês no campo da direita não parece mais improvável. "Apesar do acordo de não aliança com a FN, a UMP já está muito mais próxima da extrema direita do que em 2007", pondera o analista.