O Estado de São Paulo, n. 45679, 10/11/2018. Política, p. A8

 

PF diz que Joesley 'mentiu e ocultou fatos' em delação

Leonardo Augusto

10/11/2018

 

 

Segundo o delegado Mario Veloso, objetivo era ‘tirar a polícia da linha de investigação correta’; defesa de empresário nega omissões

Prisão. Ricardo Saud

A Polícia Federal afirmou que as investigações da Operação Capitu, deflagrada ontem em cinco Estados e no Distrito Federal, mostraram que o empresário Joesley Batista, do Grupo J&F, “mentiu e ocultou fatos” na delação premiada que firmou no âmbito da Operação Lava Jato. O objetivo de Joesley, segundo os delegados responsáveis pelo caso, era “tirar” a PF “da linha de investigação correta”.

A Operação Capitu, desdobramento da Lava Jato, investiga pagamento de propina a representantes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento em 2014 e 2015. Entre os presos, além do empresário, está o vice-governador de Minas Gerais, Antônio Andrade, que foi ministro da pasta no governo Dilma Rousseff (PT).

O delegado da PF Mario Veloso disse que a colaboração tinha a tendência de direcionar a investigação da PF e “tirar a Polícia Federal da linha de investigação correta”. Para ele, a nova operação “prejudica a legitimidade dessa colaboração, embora muitas das provas apresentadas e declarações dos colaboradores sejam válidas, independente de essa colaboração ser invalidada futuramente ou não”.

Delação. O acordo de delação de Joesley, assinado em maio de 2017, foi rescindido pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em setembro do mesmo ano, ainda na gestão de Rodrigo Janot, sob a alegação de que o delator mentiu sobre fatos que tinha conhecimento e também teria sonegado informações à época. Para que a rescisão tenha validade jurídica, é preciso que o relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Edson Fachin, homologue a decisão. O processo ainda está sendo instruído, com depoimento marcado para a próxima segunda-feira de Janot na condição de testemunha. Não há data para o julgamento do caso.

Saud. Na decisão que autorizou a Operação Capitu, a desembargadora Mônica Sifuentes, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, citou interceptação telefônica feita em 12 de dezembro de 2014, em que o executivo da J&F Ricardo Saud conversa com o ex-ministro Neri Geller, da Agricultura, pergunta sobre possível boato de revogação do “negócio lá que veio da Casa Civil, da Ivermectina”.

Na ocasião, de acordo com a investigação, Geller disse que não iria revogar. “Tal declaração, no entanto, parece não corresponder ao que foi apurado na investigação policial, por meio dos diálogos interceptados durante a Operação ‘O Quinto’, nos quais se vê claramente que Ricardo Saud mantinha relacionamento de proximidade com o então ministro Neri Geller e as negociações em torno da utilização da Ivermectina”, apontou a magistrada.

A desembargadora acrescentou que, em 7 de janeiro de 2015, “conforme os áudios da operação O Quinto, foi possível tomar conhecimento da possível eliminação de documentos ocorrida na sede da empresa J&F”. “Nos diálogos, Ricardo Saud se mostra inicialmente surpreso com a notícia dada por sua secretária, Gisele, e depois fala como se soubesse o motivo pelo qual Joesley Mendonça Batista teria tomado tal atitude. Joesley e Demilton estão fazendo ‘uma limpeza na sala’, segundo fala da secretária Gisele, o que desmente a afirmação feita por Joesley perante a autoridade policial.”

Na avaliação da magistrada, “as declarações são, portanto, recentes, e não correspondem ao que foi até o momento apurado pela autoridade policial, revelando que os indiciados continuam a ocultar os fatos”.

Segundo o delegado Veloso, quando as investigações foram confrontadas com as delações feitas dentro da Lava Jato houve quatro oportunidades para que os colaboradores fornecessem informações, o que não ocorreu. “A PF descobriu omissões intencionais e contradições graves que colocam em xeque a credibilidade da delação. Isso caracterizou obstrução de Justiça e prejuízo à instrução criminal do inquérito. Mentiram e omitiram sobre pontos.”

A defesa de Joesley diz que não houve omissão do empresário na sua delação. “Os pontos trazidos pelo delegado nessa sexta-feira (ontem) constam em diversos anexos que fazem parte da colaboração de Joesley Batista feita em maio de 2017 com o Ministério Público.”

 

'Omissões'

“A PF descobriu omissões intencionais e contradições graves que colocam em xeque a credibilidade da delação. Isso caracterizou obstrução de Justiça e prejuízo à instrução criminal do inquérito.”

Mario Veloso

DELEGADO DA POLÍCIA FEDERAL QUE PARTICIPOU DA OPERAÇÃO CAPITU