Título: Caixa dois irrigado por Cachoeira
Autor: Valadares, João
Fonte: Correio Braziliense, 28/06/2012, Política, p. 3

A situação do governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), ficou ainda mais complicada após depoimento, na CPI do Cachoeira, do jornalista Luiz Carlos Bordoni, que trabalhou para o político goiano durante a campanha eleitoral de 2010. O depoente, demonstrando desenvoltura e ironia em alguns momentos, chamou Perillo de "mentiroso" diversas vezes e afirmou categoricamente que o governador utilizou dinheiro sujo de caixa dois, proveniente de empresas fantasmas ligadas ao esquema do bicheiro Carlinhos Cachoeira, para pagar o serviço prestado. Insistindo que queria uma acareação com Perillo e seus assessores para provar que estava falando a verdade, Bordoni ressaltou que os primeiros R$ 40 mil foram recebidos das mãos do próprio governador no seu gabinete. "Ele retirou o dinheiro de um frigobar. Estava num envelope amarelo."

O jornalista, que disparou contra integrantes da CPI ao afirmar que muitos não queriam esclarecer os fatos, não apresentou provas de que Perillo o teria pago pessoalmente. "Só estava eu e ele no gabinete. É a minha palavra contra a dele." Bordoni assegurou que o governador chegou a escrever um bilhete com o valor. "Passei dois dias procurando esse pedaço de papel, mas não achei", informou.

Bordoni conseguiu provar que duas parcelas de R$ 45 mil, recebidas em abril e maio do ano passado, foram pagas por empresas envolvidas no escândalo. "O que existiu de fato, senhoras e senhores, foi um pagamento a mim feito com caixa dois. Alberto e Pantoja, comprovadamente empresa ligada ao senhor Carlos Cachoeira, e o segundo pagamento também feito por Adecio & Rafael Construção e Terraplanagem também empresa fantasma ligada ao senhor Cachoeira", garantiu. Ele ainda recebeu R$ 30 mil em cheque do comitê de campanha e mais R$ 10 mil em dinheiro que teriam sido repassados por Jayme Rincón, tesoureiro da campanha de Perillo, que apresentou atestado médico para não depor ontem na CPI.

O depoente salientou que o contrato com Perillo foi "verbal" e disse não ter declarado alguns dos valores recebidos à Receita Federal. "Não existe contrato quando você é amigo. Conheço o governador desde os tempos da juventude do PMDB. Ele era meu ídolo, meu herói. Por ele, topava qualquer parada." Bordoni assegurou que repassou o número da conta da sua filha para Luiz Fiuza, assessor do governador, realizar o depósito. "O número da conta da minha filha foi parar lá. O senhor Luiz Fiuza Gouthier pode explicar. Podia ter explicado aqui ontem. Preferiu ficar em silêncio, pois o número foi passado a ele, o homem de estreita confiança do governador Marconi Perillo. Só a ele e a mais ninguém. Por pedir esses esclarecimentos, de repente eu deixei de ser o cara, o bom, o talento, o pé quente, para ser figura controversa. Como ele disse aqui, mentiroso, irresponsável, desequilibrado mental."

Outro lado Bordoni, que trabalhava havia 14 anos para Marconi Perillo, rebateu as afirmações da mulher de Cachoeira, Andressa Mendonça, de que estaria tentando extorqui-lo e, por isso, teria recebido os R$ 45 mil da Alberto & Pantoja. "Quem sou eu para achacar o rei do achaque? E, como Cachoeira gosta de filmar todo mundo, não teria, então, alguma filmagem comigo?", questionou. Durante o depoimento, Bordoni chamou Cachoeira de "Al Capone" do cerrado.

No fim da tarde de ontem, o governador Marconi Perillo, por meio da assessoria de imprensa, encaminhou nota oficial rebatendo as acusações. No comunicado, Perillo classificou as declarações do jornalista como "falsas, levianas e fantasiosas, sem nenhuma conexão com a realidade dos fatos." Informou que "a comparação das diversas versões sobre valores pagos pelos serviços prestados pelo jornalista durante a campanha revela flagrantes contradições com o único intuito de agredir, certamente por motivações espúrias, a honra do governador." Por fim, Perillo declara que Bordoni terá que responder todas acusações na Justiça.

Como funciona Confira o que disse à CPI o jornalista Luiz Carlos Bordoni sobre o esquema de caixa dois Bordoni afirmou que recebeu R$ 170 mil por serviços prestados à campanha de Perillo, divididos da seguinte forma:

R$ 40 mil em espécie teriam sido pagos pelo próprio governador. Bordoni afirma que Perillo retirou o dinheiro, num envelope amarelo, de dentro de um frigobar

R$ 30 mil teriam sido pagos em cheque pelo comitê de campanha do governador. Este foi o único pagamento declarado. O jornalista alega que utilizou para recebimento uma nota fiscal da empresa Art Mídia

R$ 10 mil em espécie foram pagos pessoalmente pelo tesoureiro da campanha de Perillo, Jayme Rincón

R$ 45 mil foram depositados na conta de Bruna Bordoni, filha do jornalista, em 14 de abril do ano passado. O dinheiro teria sido repassado pela Alberto e Pantoja, empresa fantasma do esquema de Cachoeira que recebeu cerca de R$ 30 milhões da empreiteira Delta

R$ 45 mil foram depositados na mesma conta em 18 de maio do ano passado. O pagamento teria sido feito pela empresa fantasma Adércio e Rafael

"Quem sou eu para achacar o rei do achaque? E, como Cachoeira gosta de filmar todo mundo, não teria, então, alguma filmagem comigo? Luiz Carlos Bordoni, jornalista, em depoimento à CPI

Habeas corpus rejeitado de novo O ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), rejeitou ontem mais um pedido de habeas corpus apresentado pela defesa do bicheiro Carlinhos Cachoeira. Ao analisar o recurso proposto contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que, na última quinta-feira, manteve o contraventor preso pelas irregularidades apuradas na Operação Saint-Michel, Dipp avaliou que Cachoeira deve permanecer detido. Também ontem, a defesa do bicheiro entrou com novo pedido de liberdade, desta vez no Supremo Tribunal Federal (STF), contra decisão do STJ que manteve a prisão dele relativa à Operação Monte Carlo. Cachoeira está atrás das grades desde 29 de fevereiro. (Diego Abreu)

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