Título: A miscelânea ideológica do PSD
Autor: Caitano, Adriana
Fonte: Correio Braziliense, 01/07/2012, Política, p. 3

No ano passado, quando a movimentação do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, para criar uma legenda ganhou corpo, o Partido Social Democrático (PSD) foi a solução perfeita para incorporar quem estava descontente com a sigla de origem ou precisava negociar as próprias dívidas políticas. Com a legitimação da agremiação pela Justiça Eleitoral, as faturas estão sendo pagas na disputa deste ano. E as alianças firmadas demonstram que coerência ideológica não é o forte do partido: nas capitais, há coligações com legendas comunistas, governistas, de oposição e de extrema direita.

Em Salvador, por exemplo, o PSD está ao lado do PT para pagar a conta de 2010. Para viabilizar a eleição de Jaques Wagner (PT) ao governo do estado, o vice na chapa, Otto Alencar (ex-PP, hoje no partido de Kassab), conseguiu o apoio de diversas legendas. Ao alinhar-se a partidos adversários, porém, ele acabou se desgastando com o PP e precisou trocar de sigla para não ficar isolado internamente. O PSD foi a saída mais fácil. Agora, na eleição municipal, apoia Nelson Pelegrino (PT), indicado por Wagner.

O mesmo acontece em São Paulo, mas no lado partidário oposto, comenta o cientista político e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Marco Antonio Teixeira. "O Kassab é umbilicalmente ligado ao José Serra, mas até o nome do tucano ser confirmado como candidato a prefeito de São Paulo, o PSD ia fechar aliança com o PT na cidade", relata. Em Porto Alegre (RS), a nova legenda ganhou o posto de vice na chapa de Manuela D"Ávila (PCdoB).

Pelo país, o PSD fechou alianças com PMDB, PDT, PP, PSB e até DEM, partido que mais perdeu filiados com a criação da sigla. O secretário-geral do PSD, Saulo Queiroz, não esconde a real motivação das coligações deste ano. "O que vale é o compromisso, estamos devolvendo o apoio a quem nos apoiou na criação do partido", argumenta. "Ninguém vai poder dizer que somos maus pagadores."

Heterogeneidade Marco Antonio Teixeira destaca que, em eleições municipais, a heterogeneidade é mais frequente. "Mas, obviamente, a questão do PSD não segue lógica nenhuma", critica. Ele compara o comportamento pessedista ao do PMDB, que fez parte tanto do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) quanto os de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT). "A diferença é que o PMDB já tinha uma história de divisão e é composto por lideranças regionais, mas tem se unificado recentemente", diz.

Para o professor, o PSD pode estar "fadado ao insucesso" caso siga apenas voltado para interesses estaduais ou municipais. "Essa falta de identidade, que é só pragmaticamente eleitoral e não tem uma marca, demonstra que o partido que diz ter nascido como alternativa, uma terceira via, ainda não disse a que veio", completa. "Se ele quiser chegar ao nível presidencial em 2014, não vai poder ficar brincando de apoios regionais, será preciso definir a natureza do partido."