Título: Voto contra a insegurança
Autor: de Luna Thais
Fonte: Correio Braziliense, 01/07/2012, Mundo, p. 21

Cerca de 79,5 milhões de mexicanos vão hoje às urnas, em meio à violência ligada ao narcotráfico que já deixou pelo menos 50 mil mortos desde que Felipe Calderón assumiu o poder, em 1º de dezembro de 2006. A votação para presidente, seis governadores, prefeitos, senadores e deputados é realizada seis dias após três agentes da polícia federal terem sido assassinados no principal aeroporto da capital, Cidade do México, durante uma troca de tiros com supostos traficantes. Ainda assim, os quatro principais candidatos à presidência pouco falam de como vão combater os cartéis de narcotráfico e frear a criminalidade.

Após realizar campanhas marcadas pelo forte esquema de segurança — que inclui até detectores de metais nos estados mais violentos, como Veracruz —, o candidato do Partido Revolucionário Institucional (PRI), Enrique Peña Nieto, dispara na preferência dos eleitores, de acordo com as últimas pesquisas feitas no país. Caso as sondagens se confirmem, o PRI retomará o poder, 12 anos depois do fim de um domínio de sete décadas.

A enquete do jornal mexicano Reforma indica que o favorito conta com 41% das intenções de votos válidos, 10 pontos percentuais acima do segundo lugar, Andrés Manuel López Obrador, do Partido da Revolução Democrática (PRD). Josefina Vázquez Mota, do governante Partido Ação Nacional (PAN), teria a preferência de 24% dos eleitores. Apenas 4% dos mexicanos escolheriam como líder Gabriel Quadri, do Partido Nova Aliança (Panal). Outra análise, do instituto Buendía&Laredo, coloca Nieto como a preferência de 45% dos eleitores, seguido por López Obrador, com 27,9%.

Desse modo, o político carismático de 45 anos, casado com a famosa atriz de telenovelas mexicanas Angélica Rivera — que fez a versão original de Pícara sonhadora — deve ocupar a sede da Presidência, já que não há segundo turno na votação. De acordo com o pesquisador Rafael Loyola Díaz, da Universidad Nacional Autónoma de México (Unam), o provável novo presidente falou, de modo breve, que pretende retomar a tranquilidade das famílias mexicanas com a ajuda do Exército e da Polícia Federal. A candidata Josefina Mota quer aplicar as mesmas medidas, mas Díaz adverte que "ela sempre ressalta a relação entre o PRI com o narcotráfico e o crime organizado", que estariam diretamente interligados. "A postura de López Obrador, por sua vez, é de que a pobreza e a falta de oportunidades são as origens da violência. Por isso, ele quer atacar a desigualdade social, enquanto recorre ao Exército e a uma polícia profissionalizada para combater o crime", disse o analista ao Correio.

Para Díaz, o pleito não está tão decidido como se imagina. "A margem dos indecisos é muito alta (12,4% na pesquisa do Buendía&Laredo e 19% na do jornal Reforma). Além disso, as mobilizações de repúdio ao candidato favorito, feitas pelo movimento Yo Soy 132 (Eu sou 132, em espanhol, leia nesta página) são crescentes. Como se explica que isso não o afeta nas urnas?", indagou. Em meio a temores de manipulação dos resultados e das pesquisas de opinião, o Instituto Federal Eleitoral (IFE) busca um acordo entre os partidos para evitar conflitos como o das eleições de 2006, quando Calderón se tornou presidente com uma diferença de 0,56 ponto percentual para o segundo colocado, novamente López Obrador. O esquerdista não reconheceu o resultado e seus partidários fizeram vários protestos.

Observadores No México, cada seção eleitoral pode abrigar observadores, que analisam tentativas de fraude. Embora esses monitores não possam agir imediatamente, caso flagrem alguém infringindo as regras, há pessoas que creem que essa simples ação faça a diferença em um pleito. É o caso do empresário Alberto Negrete, 38 anos, morador da cidade de Queretaro. Segundo ele, o observador tem a condição de avaliar o sistema eleitoral. "Sinto que estamos muito atrasados em relação a outros países. No pleito passado, fui observador e, em algumas seções, foi registrado que 400 pessoas haviam votado, mas só havia 300 votos dentro da urna", disse à reportagem. Ele criticou o uso de cédulas eleitorais. "Nos últimos seis anos, as coisas não mudaram no país, nem na política nem no sistema de votos. Não há transparência."

A prima de Alberto, a universitária Anthea Sansores, 24 anos, trabalhará como observadora na Cidade do México. A estudante de letras clássicas da Unam sempre esteve envolvida com a política e quer, com a câmera na mão, prevenir fraudes. "Creio que nunca tivemos eleições democráticas. Dizem que o primeiro pleito que valorizou a democracia foi o de 2000, quando o PRI não venceu", contou. Ela lamenta que nenhum candidato tenha abordado o tema do narcotráfico durante a campanha. "Chegamos a índices de insegurança insólitos. As pessoas não podiam sair de suas casas. Estamos quase que em uma guerra, não entre o Exército e os traficantes, mas que abrange a sociedade civil."

» Enrique Peña Nieto (Partido Revolucionário Institucional – PRI)

Candidato à Presidência do México pelo partido que comandou a nação por 71 anos, Peña Nieto promete respeitar a democracia, as leis e as instituições. Além de levantar a bandeira do combate à pobreza, ele terá a missão de acabar com a imagem de partido autoritário e intolerante que marca o PRI. Seu compromissos são: frear a alta do preço dos alimentos, criar um sistema universal de seguro social e fornecer eletricidade à população com preços menores. O favorito a ser o novo líder mexicano ingressou no PRI em 1984, partido pelo qual foi eleito deputado do estado do México em 2003. Em 2005, tornou-se governador. No ano seguinte, protestos na cidade de San Salvador Atenco — durante os quais duas pessoas foram mortas — levantaram suspeitas de violação dos direitos humanos por parte do governo. Graduado em direito e mestre em administração de empresas, nasceu em uma família de tradição política em Atlacomulco. Tem como parentes dois ex-governadores e um ex-prefeito. O político de 45 anos é casado com a atriz Angélica Rivera e pai de quatro crianças. Três delas são do primeiro casamento, com Mónica Pretelini, que morreu em 2007. O outro é fruto de um caso durante a campanha para governador. Peña Nieto chegou a ter um quinto filho, também de um affair ao longo da campanha, mas o jovem morreu de câncer.

» Andrés Manuel ópez Obrador (Partido da Revolução Democrática – PRD)

Pela segunda vez na corrida presidencial — em 2006, ele perdeu por 0,56 ponto percentual para Felipe Calderón —, o esquerdista López Obrador tenta apresentar um discurso mais moderado. Com imagem de populista, tem como propostas combater a corrupção e impor a austeridade. Também pretende fazer uma reforma fiscal. O cientista político já foi diretor do Instituto Indigenista do Estado de Tabasco e diretor de Promoção Social do Instituto Nacional do Consumidor. Ambos os cargos foram ocupados por ele antes de ingressar na política, como militante da Corrente Democrática do Partido Revolucionário Institucional (PRI), partido do qual saiu para criar um grupo de esquerda, que originou o Partido da Revolução Democrática (PRD). Em 2000, tornou-se prefeito do Distrito Federal, onde implantou programas de assistência a idosos, mães solteiras e estudantes. López Obrador, 58 anos, é casado com Beatriz Gutiérrez Müeller. Ambos têm quatro filhos, sendo três do casamento anterior, com Rocío Beltrán.

50 Mil Total de mortos na guerra ao narcotráfico desde 1º de dezembro de 2006, quando Felipe Calderón assumiu o governo.

"Nos últimos seis anos, as coisas não mudaram no país, nem na política nem no sistema de votos" Alberto Negrete, 38 anos, morador da cidade de Queretaro

Celebridade nacional Peña Nieto casou-se com Angélica Rivera (foto) em 2010. A atriz, apelidada de "A Gaivota", por causa da personagem que viveu na novela mexicana Destilando Amor (2007), é uma celebridade no país. Já ganhou dois prêmios de "melhor protagonista" e um de "atriz revelação" pelas atuações na emissora Televisa, a mais conhecida do México. Ex-modelo, Angélica tem três filhas do casamento anterior, com o produtor José Alberto Castro. Na segunda-feira passada, a atriz Laura Zapata divulgou, por meio do microblog Twitter, que Peña Nieto havia espancado a mulher. "(O golpe) foi de tal magnitude que ela está reclusa no Hospital Ángeles, se recuperando das feridas infligidas pelo candidato", contou. A notícia foi publicada em diversos jornais, mas o candidato e sua assessoria não falaram sobre o assunto.