O globo, n. 31140, 09/11/2018. País, p. 4

 

Um sanção por um auxílio

Karla Gamba

Amanda Almeida

Natália Portinari

Carolina Brígido

09/11/2018

 

 

Temer espera STF para decidir se veta reajuste

O presidente Michel Temer deve aguardar uma ação concreta sobre o que o Supremo Tribunal Federal (STF) pretende fazer com o auxílio-moradia da magistratura para, só depois, decidir se irá sancionar o projeto, aprovado pelo Senado na quarta-feira, que reajusta o salário dos ministros em 16,38%. Segundo auxiliares do presidente, ele deve usar os 15 dias a que tem direito para analisar os impactos do aumento e os planos do Judiciário para cortar gastos.

Dados de dois estudos da Consultoria de Orçamentos do Senado Federal, obtidos ontem pelo GLOBO, mostram que nem mesmo o corte total do auxílio-moradia de juízes federais compensaria o impacto do reajuste. Pago indiscriminadamente abo aparte dos juízes, o auxílio —no valor de R$ 4.377 — custa cerca de R $333 milhões anuais aos cofres da União, enquanto o aumento par ajuízes federais custará R $717 milhões.

Ao negociar o reajuste com o Executivo, em agosto, o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, comprometeu-se a limitar o benefício de modo a compensar parte do impacto do aumento. A promessa foi renovada na terça-feira, quando Toffoli pediu ao presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), que colocasse o projeto em votação.

Aprovado na quarta-feira, o reajuste do Supremo eleva o salário dos ministros de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil. Referência para outras carreiras do Judiciário, o aumento provocará um efeito cascata na folha de pagamentos de outras categorias de servidores da União e dos estados. O impacto estimado é de cerca de R$ 4 bilhões ao ano. Apenas para a União, a despesa estimada é de R$ 1,45 bilhão ao ano. No estados, que vivem em crise fiscal, estima-se um efeito anual de R$ 2,6 bilhões.

Na quarta, Toffoli agradeceu ao Congresso a aprovação do reajuste, limitandose a dizer que o Supremo enfrentaria a questão do auxílio-moradia.

— Em nome de todo o Poder Judiciário, eu gostaria de agradecer ao Congresso Nacional a aprovação desse projeto. Principalmente porque agora poderemos enfrentar a questão do auxílio-moradia. Vou conversar com o relator do caso, o vicepresidente do Supremo, Luiz Fux, para ver a melhor hora de nós deliberarmos a respeito —disse.

Benefício desde 1979

Mais de 17 mil juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores recebem auxílio-moradia no país. A manutenção do benefício deve ser julgada pelo Supremo. A questão chegou à Corte em 2013, a partir de ações movidas por entidades de classe que representam a magistratura.

A previsão de pagamento de auxílio-moradia a juízes foi estabelecida pela Lei Orgânica da Magistratura (Loman), de 1979. O artigo 65 diz que, além dos vencimentos, os magistrados têm direito a uma ajuda de custo para moradia “nas localidades em que não houver residência oficial à disposição”. O benefício, no entanto, acabou desvirtuado, sendo pago de modo indiscriminado a todos os juízes, até mesmo àqueles que tem residência própria na cidade onde trabalham.

Segundo levantamento da Consultoria Legislativa do Senado, atualizado em fevereiro, o auxílio-moradia é recebido por 88 ministros das cortes superiores, 14.882 juízes e 2.381 desembargadores. Além deles, recebem o benefício: nove ministros do Tribunal de Contas da União e 553 conselheiros dos tribunais de contas dos estados e municípios.

Entre os que recebem auxílio-moradia mesmo tendo imóvel próprio estão 26 ministros de tribunais superiores (STJ, STM e TST). Não pediram o benefício os ministros do STF e do Tribunal Superior Eleitoral.

Em Brasília, o governador eleito do Rio de Janeiro, o exjuiz Wilson Witzel (PSC), reconheceu que o reajuste nos salários dos ministros do Supremo terá um efeito cascata no estado. Mas, questionado se isso o preocupa, disse que não sabe ainda, uma vez que não fez os cálculos. Witzel foi ao STF ontem para um encontro com Dias Toffoli.

— Terá efeito cascata, certamente. Vamos fazer o cálculo lá. Na verdade, o governador Pezão. Eu ainda não sou governador.

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Apoiadores de Bolsonaro votaram pelo aumento

Catarina Alencastro

Daniel Gullino

09/11/2018

 

 

Dez senadores alinhados ao presidente ignoraram apelos; outros três foram contrários a reajuste

O aumento dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), aprovado anteontem no Senado apesar de apelos do presidente eleito, Jair Bolsonaro, recebeu votos de dez senadores alinhados ao novo chefe do Executivo.

Três apoiadores do presidente eleito foram contrários ao reajuste, enquanto quatro deles não participaram da votação. Um senador que defende Bolsonaro se absteve. O aumento passou por 41 votos a 16, com uma abstenção e 22 ausências.

Os senadores Ataídes Oliveira (PSDB-GO), Eduardo Amorim (PSDB-SE), Eduardo Lopes (PRB-RJ), Ivo Cassol (PP-RO), José Medeiros (Pode-MT), Raimundo Lira (PSD-PB), Sérgio Petecão (PSD-AC), Valdir Raupp (MDB-RO), Cidinho Santos (PR-MT) e Vicentinho Alves (PR-TO) declararam algum tipo de apoio antes ou logo após a eleição de Bolsonaro. E, na hora de avalizar o ajuste ao Judiciário, contrariaram os interesses manifestados pelo próximo presidente. Para ele, não era o “momento” de aumentar esse gasto.

Por outro lado, Ronaldo Caiado (DEM-GO), Wilder Morais (DEM-GO) e Airton Sandoval (MDB-SP) votaram de acordo com a posição de Bolsonaro e foram contrários ao aumento.

Seis apoiadores de Bolsonaro não compareceram à votação, entre eles Magno Malta (PR-ES), um dos aliados mais próximos, que rejeitou convite para ser seu vice e agora é cotado para um ministério. Também não estavam presentes Ana Amélia (PP-RS), Alvaro Dias (PodePR), Lasier Martins (PSDRS), Waldemir Moka (MDBMS) e Guaracy Silveira (DCTO). José Maranhão (MDBPB) se absteve.

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Para Heleno, decisão do Senado gera ‘preocupação’

Eduardo Bresciani

09/11/2018

 

 

General, que vai assumir GSI, disse, porém, que não considera aumento do STF ‘uma derrota’

O general da reserva Augusto Heleno, que vai assumir o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), não considerou como derrota do presidente eleito, Jair Bolsonaro, a aprovação pelo Senado do reajuste salarial para o Supremo Tribunal Federal ( STF ) na última quarta-feira. Ele admitiu, porém, que a medida abre um ponto de atenção para o governo.

— Não é derrota, é preocupação. Tenho certeza que ele (Bolsonaro) não considera derrota. É uma preocupação, até pelos gastos anunciados, mas isso tem que ser muito bem estudado. Odoutor Paulo Guedes tem que avaliar qual o impacto — afirmou Heleno, em referência ao custo de R$ 4 bilhões que o aumento deve ter para a União e os estados, já que os rendimentos dos ministros servem como teto para o serviço público.

Sobre os trabalhos da transição, o general concordou com a ideia de que há a necessidade de um equilíbrio entre as Forças Armadas para a definição do nome que comandará o Ministério da Defesa, do qual ele seria titular antes de ser anunciado para o GSI. O vice-presidente eleito, Hamilton Mourão, afirmou, na última quarta-feira, que o nome deve vir da Marinha, mas Heleno disse que não está decidido de qual Força virá o indicado. Ele não descartou a possibilidade de ser outro general do Exército a ocupar a pasta:

—A gente procura ter esse equilíbrio, não porque haja ciumeira entre as Forças, mas porque é necessário que haja uma diversidade de visões e de opiniões para as decisões que devem de ser tomadas pelo ministério. É desejável que haja um equilíbrio. Mas não tem obrigação (de ser de outra Força).